Capítulo 54 - Um rapaz inglês regular (por Alexander)

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Que Katerine estava de ressaca era óbvio. O que não era óbvio – e, na verdade, também não fazia sentido nenhum – era como alguém conseguia ficar de ressaca mesmo bebendo uma quantidade inofensiva de cerveja inglesa.

— Fecha isso, pelo amor de God – ela choramingou, se escondendo embaixo das cobertas, quando eu tentei abrir a cortina do quarto.

Fechei, dando uma gargalhada. Revirei minha pequena mala atrás de algum remédio para ressaca, mas fazia muito tempo que eu não bebia a ponto de precisar de um desses. Modéstia à parte, meu povo era muito resistente à álcool. Ainda que na noite anterior eu também estivesse um pouco fora do meu controle total, não foi fora o suficiente para que eu precisasse de atendimento médico no dia seguinte. Vesti-me, deixei Katerine sozinha e saí em busca de algo que a fizesse se sentir melhor, quando estivesse pronta para levantar da cama.

Não estava mais chovendo. Na verdade, estava até um pouco de sol. Na verdade, já estava de tarde. Dormimos muito. Eu sorri, mas me enfiei no meu gorro mesmo assim. Não era pelo frio, mas sim pelo possível reconhecimento. Os raios de sol, ainda que humildes, esquentavam minha pele no caminho para a farmácia mais próxima. Era um belo dia, de uma bela vida. Eu era um homem feliz.

Lembranças da noite anterior constantemente vinham à tona e eu fiquei grato pelo sol novamente. Poderia culpa-lo pelas minhas bochechas rosadas, quando, na verdade, elas eram claramente fruto dessas lembranças.

Estagnei no meio da rua, ao lembrar de uma.

— Excuse me, sir! – Alguém atrás de mim reclamou, desviando para me ultrapassar.

Se estivéssemos em Londres, a reclamação seria muito pior. Lá todo mundo está correndo quase o tempo todo, ainda que eu desconfie que ninguém saiba muito bem para onde. Ou para quê.

A cena de Katerine deitada na cama, me observando voltar para ela como quem vê o que há de mais precioso no mundo veio em minha mente. Ela ainda estava falando um monte de besteiras – metade delas, eu nem entendia. Não pelo português (okay, maybe a little), mas sim pela forma enrolada que as palavras eram proferidas. Katerine bêbada era faladeira e eu achava uma graça. Katerine bêbada também era sexy, o que era um perigo para minha sanidade mental.

Do que eu estava falando? Não existia mais sanidade mental quando ela estava por perto.

No meio daquela chuva de palavras sem sentido, quatro chamaram atenção. Quatro ressoaram no quarto como se tivessem sido ditas em um megafone. Na verdade, não passaram de um suspiro quase que inaudível.

— Eu te amo, Alexander.

Ela dormiu no segundo seguinte e eu demorei diversos minutos para pregar o olho. A sensação que me acometeu no momento que ela terminou de falar as palavras era exatamente a mesma que me acometia agora, parado no meio da calçada. Primeiro, uma onda de agitação e excitação. Depois, um choque de realidade, agonia e uma pitada de tristeza.

Passei todo o tempo acordado na noite anterior olhando para minha assinatura no gesso. Será que ela já tinha visto? Será que isso havia influenciado o que ela disse? Será que ela estava com medo de me confrontar sobre o que eu tinha escrito lá? Ou será que ela estava com mais medo ainda era de confrontar a forma que se sentia?

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