Capítulo 53 - A verdade é que disse

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A Inglaterra era mesmo cheia de surpresas. Cambridge parecia saída de um romance histórico, de séculos distantes. Em nada parecia com a agitação londrina. Poucas pessoas andavam na rua, ela era ainda mais fria e seu principal destaque turístico eram as universidades.

O que deixava Alexander ligeiramente preocupado. Ainda que fosse um dia de recesso escolar, muitos alunos não retornaram para suas casas e sim continuaram na cidade. O que significa uma grande quantidade de adolescentes por m² que poderiam reconhecê-lo e arrasar todo nosso passeio.

― Não tem ninguém na rua - eu comecei. – São todos esses fantasmas que vão te reconhecer?

Alexander riu. Era tão bom ouvi-lo rindo. O barulho da sua risada ecoou pelo pequeno corredor que íamos nos metendo, espremidos entre duas enormes casas de pedra. Saímos do outro lado, de frente para um enorme rio.

Estava chovendo um pouquinho, aquela chuva que só serve para deixar frio e pouco molha, mas mesmo assim algumas pessoas estavam em cima de pequenos barquinhos, passeando rio a fora (e usando capa de chuva). Existia sempre uma de pé, empurrando o barco com um bastão gigantesco. Será que tínhamos errado (e muito) o caminho e estávamos em Veneza?

― Essas são as gôndolas de Cambridge – Alexander estendeu a mão, mostrando a situação em nossa frente. – Aqui chamamos isso de fazer punting – ele refletiu. – Acho que não tem uma palavra para isso em português.

― Tem sim, se chama congelar – eu apontei para água. – Imagina se um pingo dessa água gélida cai nessas pessoas? Deus que me livre.

Alexander riu.

― Devo entender, então, que a senhorita não deseja fazer um passeio do gênero? – Ele perguntou, puxando-me para perto pelos ombros, lateralmente.

― Não – eu neguei na hora, certa do que estava dizendo. Já estava sentindo um frio surreal, que chegava até meus ossos. Imagina se água estivesse envolvida na equação. – Espero que isso não frustre totalmente seus planos.

― Ah, não – Alexander riu de novo. – Cambridge é pequena, mas tem bastante coisa para fazer por aqui, por incrível que pareça. Se você não quer fingir que está em Veneza comigo, não tem problema. Outro dia vamos até a Veneza de verdade.

Eu sorri, mas era um sorriso um pouco falso. Claro que eu queria ir até Veneza com Alexander, mas nós não tínhamos esse futuro. Primeiro porque ele não podia continuar pagando as coisas para mim dessa forma e segundo porque eu retornaria para o Brasil e isso, seja lá o que isso fosse, terminaria.

Terminaria, não importa o que ele dissesse. Eu não poderia ficar em Londres com ele. Precisava voltar, estudar e continuar a existir. O que nós vivíamos era um sonho, mas eu sabia que a hora de acordar estava mais perto que nunca. As ligações do hospital no meu celular eram constantes e eu sabia que no momento que eu atendesse uma, seria o início do fim. Seria alguém me dizendo que já está na hora de voltar no hospital e verificar se posso retirar meu gesso.

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