A culpa não é minha

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​Alice, com um enorme sacrifício, terminou de fechar seu vestido e se olhou no espelho. Sorriu ao ver que estava bem melhor que no dia anterior, e que talvez fosse capaz de se acostumar àquilo. Estar apenas com Robert não era algo tão ruim, afinal.

​Ela foi até o vampiro, adormecido na cama, e lhe deu um beijo no rosto. O garoto piscou, e cobriu os olhos com a mão ao ver a claridade que entrava pela janela.

​– Bom dia, minha linda – ele sorriu, sonolento. – Que horas são?

​– Já são duas da tarde, dorminhoco. Mas eu te acordei para avisar que vou sair para caçar, estou com sede. Pode ficar, se preferir.

​– Se importa se eu gastar mais alguns minutos na cama? – riu o garoto, e ela o acompanhou.

​– Tudo bem, já estou de volta logo. Não pretendo ir muito longe aqui na cidade.

​Deixando-o no quarto, Alice desceu e passou pela sala comum, ignorando os olhares que recebeu, principalmente da senhora dona da pensão. Do lado de fora, caminhou até a rua e foi pela calçada, procurando por algum beco mais escuro em que fosse seguro atrair alguma vítima. Enquanto observava, distraída, acabou dando de frente com alguém.

​– Oh, me desculpe, eu... – ela se interrompeu assim que ergueu a cabeça e viu Pedro. Revirou os olhos. – Mas eu mereço mesmo.

​– Oras, a senhorita deveria terminar seu pedido de desculpas, estava muito distraída para quem sabe que nunca tem paz – a vampira deu um gemido de desgosto. Pedro era de longe a pessoa mais irritante que ela conhecera. – Algum problema? Não prefere que eu te faça gemer por outro motivo?

​Furiosa, a vampira acertou um tapa com força no rosto dele. Se aquele moleque não sabia respeitar uma dama, iria ter de aprender. O vampiro virou o rosto, mas se voltou novamente, sorrindo, e passou a mão pelo lábio que sangrava, pego de surpresa.

​– Uau... Você está mesmo estressada. Foi só um comentário inocente, meu anjo – Alice teve de se conter para não atacá-lo ali mesmo ao ouvi-lo imitar o tom de Robert. Ah, aquilo já estava passando de qualquer limite...

​– Posso saber é o seu problema? Por que veio atrás de mim agora? O que Charlotte quer? – ela praticamente rosnou.

​– Por que haveria ela de querer algo? Dessa vez, eu quero conversar com você – Pedro sorriu, falsamente gentil. Ele passou um braço pelas costas dela, conduzindo-a para a travessa maltrapilha que ela estivera observando. A garota teria resistido, mas no momento, ter mais privacidade também era um interesse dela. Já que seu próximo golpe provavelmente não seria apenas um tapa, preferia não ter público.

​– Sei que é Charlotte porque você é o cão de guarda dela.

​– E por acaso acredita que ela sabe do que aconteceu aquele dia no bar? Veja, eu acho meio ingênuo de sua parte.

​– Ela sabe sim, Pedro. Vocês dois queriam que meus irmão acreditassem que sou louca – a garota revirou os olhos diante da careta dele. – Não pense que sou tão idiota assim. A cada passo que vocês dois conseguem dar, eu já estou dois a frente, e acho melhor se acostumarem.

​– Ah, é claro... Mas está separada de seus irmãos agora, por que? – ele provocou. Ela sentiu como uma facada em seu coração, mas não deixou transparecer.

​– Isso não foi por conta de vocês. Foi Eleanor quem fez isso, então nem tente levar os créditos – revidou prontamente. Pedro a jogou de costas na parede, sem se importar em esconder sua fúria, e a encarou de frente.

​– Acha mesmo que está em posição para me provocar? Posso te fazer em pedacinhos se quiser, antes que você tenha tempo de sequer pensar em reagir – ele sussurrou, respirando pesadamente, com seu tom ameaçador.

​– Você não é melhor que eu, Pedro. Ainda que seja forte, e que lute bem... Aposto que empataríamos – a vampira provocou, se recostando contra a parede e erguendo as costas, sem deixar transparecer seu medo.

​– Eu tenho uma ideia... O que acha de checarmos isso daqui a pouco? – Pedro abriu um sorriso psicótico, mas que evidentemente era para parecer sedutor.

​– Mais tarde... Por quê? O que está planejando para agora? – ele aproximou mais o rosto do dela, sorrindo malicioso.

​– Bem, se eu pudesse mesmo decidir, teria uma ideia muito interessante... Mas estou aqui por um motivo quase tão divertido quanto este – o garoto riu, malicioso. Alice estava prestes a respondê-lo, mas ele segurou seu rosto com força, obrigando-a a encará-lo firmemente. – Você vai me beijar agora, e vai gostar disso tanto quanto eu.

​Com o controle mental, a garota não teve escolha, e selou os lábios deles num beijo. Pedro passou as mãos por suas costas e apoiou a outra na parede, prendendo-a ali, enquanto acariciava a língua dela com a sua. Sem saber porque, ela se viu passar as mão pelo rosto dele e enroscar os dedos em seus cabelos negros. O beijo deles era quente, e quando Pedro desceu a mão até seus quadris, foi que Alice finalmente entendeu sua intenção.

​Infelizmente, tarde demais.

​A garota sentiu quando o vampiro foi arrancado de perto dela, e então atirado na parede oposta. Abriu os olhos, já certa do que iria encontrar.
​Robert estava parado à sua frente, prendendo Pedro na parede oposta pelo pescoço, mantendo-o fora do chão, obviamente furioso. O mais novo levou as mãos até a dele, em busca de ar, para tentar se livrar, e o arranhou com força. O loiro, em sua raiva, o afastou da parede apenas para fazê-lo bater a cabeça com força ali. Tonto, o garoto piscou, e foi atirado ao chão.

​Observando a cena, Alice ficou com os olhos cheios d'água. Quando Robert parou, de costas para ela, e relaxou os ombros, ela viu o quanto o havia ferido. Ele fechou os olhos, obviamente tentando fingir que aquilo não era real, sem querer aceitar que a vira fazendo aquilo. A garota estendeu a mão e tocou o ombro dele, tremendo, insegura.

​– Robert... – ela chamou, fracamente, com a voz falhando.

​– Tire a mão de cima de mim – foi a resposta do garoto, num rosnado furioso, provavelmente mais alto do que pretendia.

​No mesmo instante, Alice se afastou e se encolheu contra a parede, assustada. As lágrimas que haviam se acumulado em seus olhos escorreram por seu rosto, e ela sentiu o aperto no peito. Jamais quisera machucar Robert daquela maneira, mas caíra feito um rato na armadilha de Pedro.

​– Me perdoa, por favor, me perdoa. Eu nunca quis fazer isso – a garota sussurrou, rezando para que ele pudesse ouvi-la.

​– Cala a boca, Alice, eu não quero ouvir sua voz agora. Nem nunca mais – ela sentiu as palavras dele como adagas afiadas, mas não se importou. Merecia ouvir aquilo. Ouviu Pedro rir baixinho.

​– Perdeu para mim já duas vezes, Robert... Isso está começando a ficar pessoal, não acha não? – provocou o garoto, convencido. Ainda estava no chão, mas claramente já se recuperara.

​– Cale a boca! – gritaram, juntos, Robert e Alice. Este se virou para a garota, e se aproximando dela, praticamente rosnou.

​– Não se atreva a vir atrás de mim, Alice – ela apenas assentiu, sentindo um soluço escapar de sua garganta.

​Robert saiu, mais rápido que uma bala, deixando os dois sozinhos.

Forever II - Vivendo a EternidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora