Brad tinha 40 anos e jamais compreenderia as mulheres. Era nisso que ele estava pensando naquela manhã chuvosa de Dublin. Ele estava há três dias na cidade e há três dias chovia sem parar. No dia anterior ele, Laura, sua filha e o garoto estranho desengonçado que beijara sua filha na sua frente, haviam enfrentado uma tempestade para conseguir jantar num lugar que deixasse Laura mais calma.
Infelizmente, a tempestade que eles enfrentavam também era no sentido metafórico. Brad preferia mil vezes enfrentar os ventos absurdos da sua querida Sidney à sutileza da tempestade que atravessava sua vida.
Mas ele não compreenderia as mulheres. Não compreendeu aos 22, quando Laura lhe deixou plantado no aeroporto para ir para o Brasil, não compreenderia agora que Jéssica – a cópia desnorteadora da única mulher que amou na vida – preferia ir morar na Irlanda do que na Austrália.
Dublin era uma cidade bonita – cinza demais para alguém acostumado ao clima da Austrália que, ainda que tivesse algumas chuvas, não tinha só essa coloração por muitos dias. Brad já sentia falta do calor de Sidney, embora estivesse ali há tão pouco tempo e embora o frio de sua cidade não fosse assim tão diferente do dublinense. Mas ele não entendeu porque Jéssica escolheu ir para Irlanda, meses atrás, e compreendia menos ainda agora, quando visitava pela primeira vez o lugar.
Ele soltou um suspiro, coçando o pescoço.
Era difícil entender aquelas duas Antunes, de sua vida. Brad tinha a incrível sensação de que, quando estava finalmente se aproximando da essência delas, algo lhe escapava e ele nunca conseguia alcançar. Não era uma sensação boa para quem, desde muito novo, teve facilidade de compreender quase tudo a sua volta.
De todo modo, foi por isso que ele pegou o avião até Dublin, para tentar compreender. De Laura, ele já tinha desistido, é verdade. Mas ele não podia desistir de Jéssica. Porque Jess era sua filha – e sempre seria, não importasse o que a vida colocasse no caminho para separar os dois.
Ele colocou o cachecol vinho em volta do pescoço e pegou sua chave, conferindo seu celular. Tão absorto em seus próprios pensamentos, dúvidas e questões, que quase passou, literalmente, por cima de Laura, que estava parada no corredor, quando ele abriu a porta.
— Sou a mulher invisível – ela deu um sorriso, empinando o queixo.
Laura não era muito menor do que ele. Era mais baixa que sua filha, mas não tão mais baixa a ponto de Brad ter que inclinar muito o pescoço para olhar dentro de seus olhos cor de avelã.
— Sorry.
— Não se preocupe. Eu sempre quis mesmo ter um super-poder.
Brad não conseguiu conter o sorriso, mesmo que se esforçasse. Laura deu um sorriso de volta.
— Ouvi dizer que você vai passar o dia com minha filha.
— Você quer ir com a gente?
Laura negou com a cabeça, os cabelos cacheados balançando por todo o ar enquanto fazia isso. Brad sentiu muita vontade de segura-los entre os dedos. Ao invés disso, ele guardou o celular no bolso e manteve sua mão ali, enquanto a outra apertava suas chaves como se sua vida dependesse disso.
— Você vai almoçar sozinha? – ele arqueou a sobrancelha.
— Claro que não. Andei pesquisando na internet – e Brad sentiu vontade de soltar um "não me diga", mas é claro que Laura já havia emendado uma frase na outra, mal conseguindo respirar entre as orações – e descobri que tem um colégio que é perfeito para qualquer fã de Star Wars. E você sabe, eu amo Star Wars.
Laura era mesmo uma mulher maravilhosa, ele pensou, num lapso de segundo, então apenas balançou a cabeça para espantar os pensamentos antes que cometesse uma bobagem. Coisa que ele estava sempre quase pronto para fazer quando ficava tempo de mais olhando para aqueles olhos castanhos.
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Cores De Um Recomeço
Teen FictionA vida de Jéssica poderia ser resumida assim: duas músicas para acordar, cinco para tomar café, três para chegar a sua escola, montada em sua bicicleta laranja, quatro para ir para a casa da sua única melhor amiga. E ela estava muito bem assim, obri...