Capítulo 24 - Bizarrices

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 Someone comes into your world
Suddenly, your world has changed forever

Heart By Heart - Demi Lovato  


 Compor música era um 'trem" muito complicado. Essa foi a única palavra que dominou a mente de Jéssica, quando Colin e ela sentaram no chão do novo quarto do garoto – que estava abarrotado de caixas em cima da cama – com papel, caneta e violão a mão. Emily estava no banho, cantarolando uma música de heavy metal que Jéssica não conhecia e também não queria conhecer e Chloe... bem, Chloe estava apagada no sofá da sala depois de três garrafas de cerveja.

Jéssica acabou soltando essa expressão bem mineira em voz alta, em inglês, o que não ficou nem um pouco fácil de ser entendido pelo garoto. E agora a menina tinha que tentar explicar o mundo que a palavra "trem" podia ter como significado.

As diferenças culturais e de sotaque, quase sempre, são uma barreira intransponível, ela estava pensando com seus cachos.

— Trem? Como assim "trem"? – o garoto a olhou, os olhos levemente arregalados, com o violão nas pernas.

— Trem ué. É um trem. É assim que a gente denomina quase tudo de onde vim.

— O Brasil inteiro fala assim?

— Não! – Jéssica mexeu as mãos – Só em Minas Gerais mesmo.

— Ah! – ele assentiu – Mas ainda não entendi, como assim vocês falam "trem" pra tudo? Lá no Brasil tem trem?

— Ram, não. – ela coçou a garganta – Na verdade, acho que tem uma Maria Fumaça numa cidadezinha de Minas, que é patrimônio histórico e tudo mais. Mas trem mesmo, acho que só os de carga. E olhe lá.

O garoto cerrou os olhos.

— É só uma gíria, entende? Vocês devem ter um monte por aqui porque nem sempre entendo tudo o que falam. A gente usa "trem" pra qualquer coisa, boa ou ruim.

— Mas o que é que isso significa?

A menina piscou algumas vezes, parando para pensar.

Não é que ela nunca em todos seus anos havia pensado nisso?

Falar "trem" era uma coisa tão natural para ela que nunca achou que teria que explicar isso para qualquer pessoa. Trem era trem, uai – ela bem que queria dizer. Mas isso só ia complicar ainda mais as coisas, então apenas mordeu o lábio e deu de ombros.

— É como uma palavra única que resume todas as coisas a sua volta.

— Achei que isso fosse o amor, para os românticos – ele deu um sorriso.

— O amor também é um trem.

O garoto fez uma careta, cerrando os olhos e arqueando a sobrancelha. Jéssica teve que conter o riso porque ele bem que ficava um trem bem gracinha daquele jeito.

— Deixa pra lá – ela mexeu a mão no ar, tentando cortar o assunto.

— É melhor mesmo – ele assentiu – Antes que você e seu trem destruam meus neurônios. – balançou a cabeça – Cada louco que me aparece nesse país. O mundo lá fora é um lugar bem bizarro, né não?

A menina sorriu.

— Como é mesmo o nome da sua cidade? – ele perguntou

— Ponte Belo. Fica pertinho da capital de Minas, umas três horas.

— Desde quando três horas é pertinho, Jéssica?

— Desde quando você mora em Minas Gerais, uai.

Cores De Um RecomeçoOnde histórias criam vida. Descubra agora