Capítulo 17 - Dores

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Por mais que a gente cresça

Há sempre alguma coisa que a gente não consegue entender

Terra de Gigantes - Engenheiros do Hawaíi


Laura Antunes nunca achou que iria doer tanto.

Quando ela tinha cinco anos, caiu de um balanço no parquinho que ficava no bairro que morava e quebrou o braço. O osso ficou exposto e ela nunca achou que sentiria tanta dor.

Aos oito anos, seu pai lhe deu um beijo de boa noite, disse que lhe amava, leu para ela a história a A Branca de Neve pela primeira vez. Laura dormiu na metade da história e seu pai deixou o livro virado para baixo no criado-mudo ao lado da cama, marcando o lugar que eles pararam. Mas seu pai nunca mais acordou. E ela nunca teve a coragem de ler a história da Branca De Neve inteira, porque nada até então lhe havia doido tanto.

Aos quinze, ela teve sua primeira desilusão amorosa. Nada demais, como quase sempre não é. O garoto só tinha hormônios demais para ficar apenas com uma garota. Estava tudo bem para ela, agora, aos 39 anos, é claro. Mas naquela idade, quando Machado de Assis mesmo havia dito que tudo é eterno, Laura achou que nada na vida poderia superar aquela dor.

Aos 21, Laura viveu aquilo que a maioria das pessoas chamariam de seu grande amor. Ela nunca escondeu isso, embora, também, nunca ficou presa a essa lembrança ou não quis mais nenhum outro namorado. Era uma mulher, mesmo nova, com muita clareza das coisas. E ao se envolver com um cara, do outro lado do mundo, durante um pequeno curso de férias, ela sabia que não importava o tamanho do seu sentimento, não seria o bastante para mudar a vida de nenhum dos dois. É claro que a consciência disso doeu. E a hora de ir embora, de deixar para trás aquela história, doeu até a alma da jovem Laura de um jeito que, ela sabia, nunca mais nenhum fim de amor ou despedida lhe doeria.

Até aquele momento, aquela era a pior dor da vida de Laura. Compreender que amar uma pessoa não é o bastante para fazê-la ficar, mesmo que essa pessoa possa te amar também, poderia ter mudado os rumos da vida da mulher. Não fosse, é claro, o fruto desse amor. E talvez por isso é que agora aquela dor lhe doía tanto. Porque era o fruto desse amor, sua filha, tanto a prova de que o amor por si só não é o suficiente como a prova de que o amor existe, quem havia sofrido.

E nada no mundo poderia ser mais doloroso para uma mãe do que ver seu filho sofrer.

Era por isso que, mesmo sofrendo pela distância de Jéssica, Laura estava feliz. A garota estava do outro lado do oceano, onde ninguém fazia ideia da marca que sua história ganhou, a salvo de qualquer comentário maldoso, brincadeira sem graça ou desrespeito por causa disso. As pessoas de seu intercâmbio não faziam ideia que Jéssica teve um vídeo íntimo publicado na internet. E não estava sendo julgada por isso.

O que era bem diferente do que Laura estava vivendo.

Não que ela fosse contar isso para a garota, de todo modo. É claro que não. Fora justamente por isso que Brad, ela e a menina decidiram que Jéssica iria embora, até que a poeira passasse, aparecesse um outro escândalo ou as pessoas se cansassem, e ela pudesse voltar para seu mundo normal, onde tudo – a língua, as pessoas, até as novidades – eram conhecidas.

Mas estava doendo muito.

Porque Laura estava sozinha recebendo todo o impacto daquela reviravolta. Sua vida virara de cabeça para baixo por causa de 40 segundos de um vídeo gravado e vazado sem permissão de quem estava sendo filmado. Jéssica estava protegida, a quilômetros dali. Brad continuava em sua vida normal e controlada do outro lado do mundo. E era Laura, a mãe solteira, a jovem professora, que ficara para viver aquelas consequências.

Cores De Um RecomeçoOnde histórias criam vida. Descubra agora