11 - Parte I

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 D A N I E L

A ficção acompanha-me, como a minha sombra. E o que quero é dormir.

Fernando Pessoa (O Livro do Desassossego)

Começa com uma súbita falta de ar. Não, não súbita, porque você sabe quando ela está vindo. Ao menos eu sei. Algumas pessoas podem dizer que suas respirações ficam aceleradas e descontroladas, mas comigo é diferente. Eu sinto como se o oxigênio nos meus pulmões estivesse sendo comprimido até se esvair, e então, lentamente, minha respiração se torna mais pesada. É como um peso sobre meu peito e eu preciso controlar o modo como respiro, tornando o movimento lento e profundo. De alguma forma, com o que parece ser uma tentativa de autocontrole, na verdade eu perco o controle de tudo.

Eu inspiro pelo nariz e solto o ar pela boca. Repito esses movimentos, tentando adiar o momento que sinto cada vez mais próximo. Eu posso sentir a angústia, uma sensação sufocante que vem de baixo, pelo meu estômago, e sobe para o meu peito, se instalando na minha garganta e tornando ainda mais difícil a passagem do ar a medida em que sufoca a minha voz. Nesse momento, eu sinto que algo em mim está se transformando, sei que qualquer som que eu emita irá me causar uma reação ainda mais perturbadora, como chorar, por exemplo.

Lágrimas, eu sinto que elas estão beirando a liberdade, quase escapando dos meus olhos que lutam para se manterem abertos, fixos na lousa a minha frente, porque meu primeiro instinto é fechá-los e apertá-los com força.

Eu cedo, porque sou fraco, e fecho meus olhos como se pudesse me afastar deste lugar, deste momento. Quando torno a abri-los, sinto-os marejados, então pisco e passo a mão rapidamente sobre eles.

Olho ao redor e todos estão sentados em seus lugares, ninguém parece perceber o que há de errado comigo. Uma parte de mim fica feliz e satisfeita com isso, mas não posso enganar a mim mesmo: estou decepcionado. De alguma forma, por alguma razão que eu ainda não compreendo, eu gostaria de ser visto. Repreendo a mim mesmo por esse pensamento autopiedoso e volto a focar no que estou sentindo, procurando uma maneira de fazer passar mais rápido.

Ergo minhas mãos na frente do meu rosto, alto o suficiente para que eu possa vê-las e baixo o suficiente para que seja o único a poder fazer isso. Elas estão tremendo um pouco e isso apenas me deixa mais nervoso. Eu cruzo meus braços, escondendo minhas mãos por baixo deles e apertando firme, como se estivesse com frio. Fecho os olhos, tento contar até dez. É para ser uma contagem lenta, mas chega ao fim antes que eu tenha tempo de dar o próximo suspiro.

Eu me inclino para frente na mesa, ainda de olhos fechados e concentrado na minha agonia silenciosa. Mas que porra. Quando essa aula vai acabar?

Penso no caderno onde costumo escrever os sentimentos e acontecimentos que me levam a pensar na insignificância da minha existência. Eu quero pegá-lo e escrever o que estou sentindo agora mesmo, mas minhas mãos ainda estão tremendo e eu não sei se conseguiria fazer isso.

Tento recapitular os acontecimentos do dia em busca de alguma coisa – qualquer coisa –, que possa ter sido o gatilho, mas não consigo pensar em nada.

Quase nunca descubro o porquê de eu me sentir assim. Quando acho um motivo, na maior parte do tempo sou apenas eu tentando enganar a mim mesmo de que uma bobagem mínima possa ter sido a causa principal. Não sei se é meu orgulho que classifica como bobagem ou se é meu desespero em encontrar uma resposta que torna a tal bobagem um motivo.

Involuntariamente dou um suspiro mais alto e sinto meus olhos marejarem de novo. Pisco. Meu coração está mais acelerado do que nunca. Ele palpita incessantemente e parece querer saltar. A pressão em minha garganta só aumenta e eu quero me encolher numa bolha e desaparecer da face da terra até isso acabar. Quero desaparecer para sempre.

SubmersosOnde histórias criam vida. Descubra agora