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D A N I E L

Agora estamos despedaçados, não há nada que possamos fazer.

(Little Talks – Of Monsters and Men)


Beijá-la é como esquecer o mundo inteiro e existir pura e somente para ela. É achar que tudo é possível enquanto eu estiver em seus braços. Ela me esvazia do que não preciso e depois me enche de coisas boas. É tão bom que eu não sinto sequer meu próprio peso e poderia voar para onde quer que o vento me levasse – se eu estiver com ela, sei que ficarei bem. Mas também é temer que, enquanto me perco em seu abraço, não me encontre em mais nenhum outro lugar.

Estou com Alissa em meu quarto. Estamos deitados na minha cama, lado a lado. Estou de barriga para cima, mas Alissa está virada para mim, com o queixo quase raspando em meu ombro, os dedos brincando com o contorno do meu rosto. Apenas nós dois e a música envolvendo o momento.

Ela acompanha a canção que, segundo ela, se encaixa conosco, cantando aos sussurros para mim. Ignoro a voz dos cantores originais a medida que a voz doce e suave de Alissa ecoa para mim, tão próxima ao meu ouvido que mesmo de olhos fechados eu consigo visualizar o movimento dos seus lábios pronunciando cada sílaba.

Viro-me para ela e nossas testas se encostam. Sua respiração de encontro a minha, seu perfume, são a melhor coisa que eu poderia pedir por hoje e por todos os dias a se seguir. Quando abro os olhos, encontro Alissa já me olhando. Eu acaricio seu rosto, passo a mão em seu cabelo. Ela sorri para mim. Queria me preencher da luz deste sorriso.

– Está me matando te ver desse jeito – ela murmura, citando uma parte da letra da música que já passou.

O sol do entardecer que entra pela janela seria uma boa desculpa para quando eu torno a fechar meus olhos, mas a verdade é que não gosto de encará-la quando ela me confronta desse jeito, apesar de que também não sei mais como simplesmente fugir.

Sinto quando ela se inclina sobre mim e me dá um beijo suave nos lábios. Queria me permitir transportar desse lugar a cada toque seu, e às vezes eu quase consigo isso de fato, mas sempre existe alguma coisa me prendendo. O meu problema é que eu nunca fui muito bom em deixar as coisas partirem. Não consigo perder, não sei me despedir, odeio deixar qualquer coisa pra trás.

Meu pai abre a porta do quarto abruptamente e Alissa praticamente dá um salto, indo parar do outro lado da cama, na ponta, e quase caindo de bunda no chão.

É engraçado, mas não consigo rir. É como se fosse um esforço grande demais.

– Eu bati – Leo se desculpa. Estou aos poucos me acostumando a chamá-lo pelo nome ao invés de pai. Venho fazendo isso na minha cabeça há um tempo, está se tornando comum. Não sei o que ele pode pensar disso.

– Não ouvimos. Perdão – Alissa responde. Seus olhos estão maiores do que o normal.

– Não tem problema. – Ele dá um meio sorriso e depois inclina a cabeça para trás. – Sarah está aqui.

É quase noite. Sarah, a orientadora da minha turma e minha professora preferida, se eu tiver que ter uma, combinou de vir na minha casa neste horário para discutir o que eu estava perdendo ao faltar tantas aulas. Não vou à escola desde segunda, há três dias. Claro que eu já faltei por muito mais tempo antes. Mas depois do último incidente quando Alissa veio aqui para tentar falar comigo, acho que todos meio que perceberam que algo não estava certo. Não sei o que pensar disso, estou apenas esperando passar. Logo vão esquecer que existo novamente.

SubmersosOnde histórias criam vida. Descubra agora