11 - Parte II

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D A N I E L

A ficção acompanha-me, como a minha sombra. E o que quero é dormir.

Fernando Pessoa (O Livro do Desassossego)

Assim que Bianca e eu nos afastamos, eu falo para ela:

– A gente conversa depois, eu tenho que ir agora.

– Ei, Dan! – Alguém chama.

Olho para a mesa, procurando a dona da voz. É Anna.

– A gente se vê depois da aula?

Faço-me de desentendido:

– O que tem depois da aula?

– Me poupe, Daniel. Eu não acredito que você seja tão irresponsável.

Eu finjo pensar por um curto tempo, então dou de ombros:

– Acho que esqueci. Meu cérebro costuma descartar informações sem importância.

– Vamos nos reunir para decidir como vai ficar o lance do nosso grupo na turma de tutoria. Talvez você tenha razão e a gente deva pôr um fim nisso.

Nesse momento, Alissa se vira para olhar para nós e eu me distraio do diálogo com Anna. Quero que ela leia o pedido de desculpas implícito no meu olhar, quero que ela entenda que eu sou um babaca, mas não por escolha, que, se eu soubesse como, eu faria tudo do jeito certo. Ela me encara de volta, dividida entre a mágoa e a curiosidade.

Desvio o olhar primeiro, um pouco perturbado, e procuro Anna entre os outros alunos que rodeiam a mesa e estão alheios ao que está acontecendo. Até Bianca já se distraiu com Milena. Anna ainda mantém seu sorriso arrogante e seguro de si, o que me irrita, mas eu sufoco o mau humor e respondo calmamente:

– Não vamos desmanchar o grupo, e eu não vou me reunir com ninguém hoje. Não estou me sentindo bem e ficar olhando pra sua cara não ajuda.

Quando me afasto, não tenho certeza de para onde devo ir em seguida. Me sinto confuso, mas, crendo que estou bem o suficiente para não me abalar com o mundo, penso em procurar Thomas, mas mudo rapidamente de ideia quando o vejo sentado na mesa do clubinho geek da escola.

Nada contra, mas eles falam sem parar, o que em tese, é até bom, mas na realidade não é, porque eu estou estressado e eu sei o que pode vir a qualquer momento a partir disso, então aceno para eles de longe, que retribuem o cumprimento quando passo reto pela mesa e sigo até a saída do refeitório.

Não é a primeira vez que eu faço isso de me isolar de todas as pessoas, mas devo admitir que está se tornando cada vez mais constante. A verdade é que eu ficaria mais contente se as pessoas não sentissem necessidade de conversar comigo o tempo todo. Ou até mesmo entre si. 

Conversas paralelas e sobre assuntos bestas e sem sentido me incomodam, principalmente quando já estou de mau humor e tudo o que quero é ficar sozinho ou em qualquer lugar silencioso, mas, por motivos óbvios de ter que ir a escola ou apenas viver, tenho que me entranhar nesses ambientes recheados de pessoas que conversam e riem sobre si mesmas ou outras pessoas.

Se eu estivesse indo ao psicólogo, eu diria isso a ele. Talvez ele me perguntasse o porquê de eu ouvir tanta música e falar tão pouco, evitando o contato social, então eu responderia:

– Porque as pessoas me irritam, na maior parte do tempo.

E ele diria:

– E por que as pessoas te irritam?

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