XVI - Um Segredo

2.1K 366 51
                                    

Damien entrou em seu quarto e antes de deixar seu celular no criado mudo, conferiu as horas: Passavam das dez e meia da noite e já tinha concluído todos os afazeres da casa.

Lucy havia subido para seu quarto já fazia pelo menos uma hora, ela estava cansada depois da tarde correndo na chuva e mal conseguira esperar o jantar sem acabar cochilando no sofá da sala. Depois que a irmã fora dormir, Damien ficara sozinho, arrumando o que precisava ser ajeitado, colocando as roupas para lavar e dando um jeito na louça do jantar... O de sempre, nada havia saído da rotina, até que chegara em seu quarto.

Ele estava cansado, tinha sono, e mais do que nunca os lençóis de sua cama lhe pareciam convidativos, mas antes de mergulhar no sono, decidiu que merecia um banho quente para relaxar os músculos, para que pudesse sentir de forma mais intensa a leveza e a tranquilidade que haviam sido deixadas como um eco daquela tarde, por isso, ignorou o conforto prometido pela cama e seguiu para a porta localizada ao lado de sua estante e que dava para seu banheiro particular.

Damien fechou a porta atrás de si e olhou para o reflexo de seu rosto no espelho á cima da pia. A raiz escura em seu cabelo crescia nas mechas tingidas de loiro e ressecadas pela química, as olheiras se destacavam em sua fisionomia muito pálida, mas ainda assim, a melancolia, que geralmente se agravava com o cansaço, naquela noite, não estava ali, havia sido substituída por uma esperança rara.

Saiu da frente do espelho e tirou as roupas, jogando-as em um canto. Ao contrário dos outros cômodos da casa, o quarto de Damien era uma verdadeira bagunça, ele não se dava ao trabalho de arruma-lo com muita frequência, não quando tinha uma lista de afaseres que julgava mais importantes.

Caminhou até o box e ligou o chuveiro, regulando a temperatura da água até que estivesse perfeita, e então, entrou, se isolando do mundo por alguns momentos e caindo em uma torrente de pensamento que não eram necessariamente tristes, mas que o traziam uma confusão inevitável:

Simplesmente não conseguia afastar a figura de Henry de sua mente... E os motivos lhe causavam um medo que não podia ser explicado de uma forma racional.

Trouxe ao consciente a lembrança das mãos dos dois entrelaçadas enquanto ouviam música, e a forma como aquele contato ao mesmo tempo era confortável e desesperador... Como temera ser visto naquela pose junto ao rapaz, como considerara a opinião dos que o cercavam e as aparências que pesavam... Não ser aceito causava um medo instintivo, mas ainda assim, isso não apagava o fato de ter gostado de ficar de mão dadas com Henry, assim como gostara de tê-lo por perto quando os três se deitaram na grama... Henry era incrível e esse era o único adjetivo que conseguia pensar e que se aproximava de descrever o que sentia quando o via... A imagem do rapaz concentrado em um livro, distante do mundo, independente de tudo o que o cercava... Henry cansado, pegando no sono na cama improvisada que haviam preparado, na noite do aniversário de Lucy. Henry com a voz embriagada, contando seus segredos com uma naturalidade espantosa... Henry sentado em uma mesa do Green coffee tentando escrever... Henry, Henry, Henry, Henry... Ele insistia em impregnar a mente de Damien com toda aquela confusão e com os sentimentos bons que o mais velho não fazia questão de entender.

Um suspiro pesado saiu de seus pulmões. Damien passou as mãos pelos cabelos molhados e fechou os olhos, deixando que a água contribuísse naquela tarefa de relaxar os ombros tensos.

Ele conhecia Greenville desde que era criança, sabia como a cidade era, sabia qual era o pensamento das pessoas que viviam ali e não queria desafiar nada, não tinha coragem para isso... Uma coisa era gostar de rapazes em uma cidade como Nova York, onde ninguém se importava muito com a vida do vizinho, mas em Greenville tudo era notícia, tudo que fugisse da ideia conservadora era um escândalo... Não queria aquilo para ele, não queria se envolver daquela forma com o novo amigo e mesmo se estivessem em um local onde a situação não seria tão notada, duvidava muito que fosse atrair Henry fisicamente e muito menos intelectualmente... Damien não conhecia quase nada de literatura, não entendia de grandes assuntos filosóficos e não sabia argumentar sobre coisas muito complexas.

Era um desastre, certamente era um desastre.

Mas não conseguia evitar, assim como não queria admitir que não era apenas amizade aquilo que começava a nutrir pelo rapaz recém chegado.

Mordeu o lábio inferior com força e escorou-se na parede... Se era só amizade, por que queria tanto que Henry mantivesse contato físico com ele? Por que não parava de notar os lábios pequenos e bem desenhados? Por que queria abraça-lo com todas as suas forças, sentir o cheiro de sua pele, lhe arrancar suspiros...?

- Ah Henry... - Damien suspirou e encostou a testa na parede, se sentindo completamente derrotado e ao mesmo tempo abalado por toda aquela confusão agridoce.

Se viu culpado por pensar aquelas coisas de alguém que tinha lhe apresentado novamente a liberdade da juventude, mas os pensamentos pareciam mais fortes do que a culpa, ele continuava a fantasiar com a imagem de Henry, continuava querendo tê-lo em seus braços... Imaginava o rapaz segurando seu cabelo com força e o trazendo para um beijo, quase podia sentir a textura daqueles lábios contra os seus.

As mãos de Henry eram macias... Damien lembrava disso... Lembrava do toque do outro entre seus dedos... Que droga, desejava que ele estivesse ali naquele momento, desejava causar nele os mesmos tipos de sensações que tencionavam novamente seu corpo, mesmo que a água quente tentasse relaxa-lo.

Estava se torturando imaginando aquelas coisas, sem dúvida alguma... Desejar Henry era tortura, ainda mais quando tinha certeza de que aquilo não era recíproco.

Desceu uma das mãos até a parte mais sensível de seu corpo, um tanto receoso, mesmo que soubesse que o melhor jeito de acabar com aquele tipo de pensamento era se deixando levar por eles... Era a única forma de tornar a culpa mais forte que a excitação, pois enquanto estivesse sobre o domínio das coisas que imaginava, elas não cessariam tão facilmente.

Se convenceu, de que já que não havia ninguém ali, ninguém o julgaria, ninguém nunca saberia, e o prazer carregado pela culpa, seria um segredo, algo que mais tarde, Damien simplesmente fingiria não ter acontecido.

Coração de Porcelana.Onde histórias criam vida. Descubra agora