XXXXII: Sobre Amor e Ódio (parte 4)

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As ruas nunca pareceram tão extensas, Greenville, aquela cidade pequena, escondida por bosques, trancada em si mesma por árvores, a Greenville onde Damien e Henry tinham criado uma história de amor, o lugar onde nunca nada acontecia e onde, agora, o caos se estabelecia aos olhos de um rapaz preocupado, temeroso pelo sofrimento do amor da sua vida.

Poderia parecer um termo muito forte para um jovem, marcar a si mesmo com aquela máxima dos poetas exagerados, seria no mínimo questionável diante as pessoas que viviam trancadas em suas rotinas, mas Damien, ele tinha um poeta ao seu lado, tinha todo o exagero de Henry o cercando e naquele momento, ao que parecia, se deixava levar por isso e adotava em si mesmo todas aquelas coisas. Tomava-as emprestadas em seus pensamentos para que pudesse a partir daquele dia, gritar para quem quisesse ouvir que ele e Henry Lockwood estavam juntos e que ninguém poderia mudar isso, que nenhum pensamento retrógado os feriria, não enquanto andassem de mãos dadas, não enquanto sorrissem vitoriosos pelo simples fato de amarem.

Mas para tudo isso, precisava encontra-lo, precisava passar por todas aquelas ruas suburbanas, correndo durante alguns trechos, já em outros, andando em passos rápidos, com a respiração ofegante, com as primeiras gotas de suor aparecendo em seu rosto.

Ninguém machucaria Henry, ele não merecia, por mais defeitos que tivesse, simplesmente, não merecia!

Damien nunca deveria ter deixado ele ir, deveria ter segurado ele naquele abraço.

Ele parara de correr por alguns momentos, diminuíra o passo, seus pulmões queimavam. Sua garganta seca e as pernas doloridas imploravam para que ele diminuísse os passos.

Pegou o celular e mandou uma nova mensagem para o número de Henry, esperando que ele respondesse, que ele desse algum sinal de como estavam as coisas, mas não havia nada, texto após texto tudo se acumulava ali, sem ser lido, sem ser respondido.

Era desesperador.

Damien guardou o telefone no bolso e voltou a correr. Sem se importar com todos os incômodos do esforço raro, embora eles pesassem, embora as pessoas que passavam por ele virassem seus rostos tentando compreender aquela cena estranha de alguém correndo, com ares desesperados.

A rua de Henry, muito florida e cheia de vida, parecia quase um cenário dos filmes de terror, não em sua essência, tudo estava lá, as mesmas cores, os mesmos perfumes, a mesma natureza, mas por mais que o sol penetrasse entre as flores das árvores, parecia soturno em um nível menos palpável do termo. A casa dos Lockwood, erguida no fim da rua, como se estivesse sentada na cabeceira de uma mesa, parecia assombrada, parecia repelir Damien que tinha de enfrentar a fachada e enfrentar John e Jennifer, queria Henry em segurança novamente, não queria ser um simples alheio em meio a toda aquela confusão, afinal, se considerava parte de tudo.

Correu os metros que o separavam de seu destino e pulou, sem muitas dificuldades, aquele muro decorativo de tijolos, depois disso, parou diante a porta da frente, tentando munir-se de coragem para tocar a campainha.

Estava tudo muito silencioso lá dentro, não havia nenhum grito, apenas o resquício quieto da tensão que parecia envolver o lugar, como se fosse uma entidade com vida e consciência própria.

Era difícil romper o silêncio com o som artificial dos sinos, no entanto, era o que Damien podia fazer, insistentemente, até que a figura da mulher conhecida, agora com lagrimas em seus olhos, o atendesse para encarar o rapaz com um desprezo feroz, como se Damien fosse o culpado por uma grande crise, como se a relação entre ele e Henry fosse algo que corrompera o filho de Jennifer e o levara para longe do que ela planejara e esperara por anos.

— O que você está fazendo aqui? — ela perguntou entre dentes, Damien se sentia alvo de uma fera, prestes a ataca-lo e dilacera-lo — Você não é mais bem-vindo aqui e nunca mais vai se aproximar de Henry.

— Eu... — ele se encolheu um pouco, no peito, o coração pesava toneladas, sua voz parecia se recusar a sair por sua garganta e as palavras fugiam.

— Vá-embora — Jennifer disse pausadamente.

— Não sem falar com o Henry —Damien rebateu, de forma que poderia parecer grosseira, quando na verdade era apenas uma tentativa de se impor.

Jennifer entreabriu os lábios, mas não disse nada, ao invés disso, ficou ali, alimentando a raiva. A seus olhos, Damien estava dividindo sua família e nada o diferenciava da amante de John, por isso, de forma completamente irracional e até mesmo em desespero, acertou o rosto de Damien com um tapa que certamente o pegou de surpresa.

O rapaz não dissera nada, não fez nada, em parte graças ao choque, não esperava receber aquele tipo de tratamento, ainda mais vindo da senhora Lockwood. Sempre nutrira respeito por ela, tinha esperanças que ela agisse de uma forma mais racional que John, no entanto, estava ali, sentindo-se tão ameaçada a ponto de agredir alguém. 

Damien levou a mão até o maxilar, como se avaliasse o próprio tato da região atingida pelo tapa, ainda assim, não seria aquilo que o faria desistir.

— Eu não vou embora, senhora Lockwood, eu quero falar com o seu filho!

 As palavras, ditas de forma certeira e teimosa fizeram com que algumas lágrimas deixassem os olhos escuros de Jennifer e escorressem por seu rosto cansado.

— Você já causou problemas demais, você não vai falar com Henry — ela disse, como se estivesse tentando proteger o filho de uma ameaça eminente, pois em sua mente era isso que Damien representava: Uma grande ameaça a tudo o que havia construído e planejado para o futuro de Henry.

— Ele tem o direito de saber que eu estou aqui — Damien respondeu — Não pode privar Henry de me ver!

— Ele nem está aqui — ela respondeu — ele fugiu para sabe-se lá aonde e você está invadindo a minha propriedade.

Damien estreitou a sobrancelha, sua preocupação, aquela que ele acreditava estar em um nível máximo, dobrara de intensidade em questão de segundos... Henry não estava em casa? Seria aquilo uma mentira para fazer com que ele fosse embora? Um truque? Ele não sabia! Tudo parecia girar e uma centena de cenários catastróficos e pessimistas visitavam seus pensamento, deixando-o em desespero.

— Como assim, fugiu? Ninguém foi atrás dele? — agora Damien carregava na voz um tom de indignação. Como era possível? Sabia-se lá se Henry estava seguro ou onde ele estava.

— Não interessa a você, Collins, saia da minha casa! — ela continuou.

— Para que lado ele foi? — Damien perguntou.

Jennifer não respondeu diretamente, no entanto, cometeu um deslize, de forma instintiva e acabou olhando para trás, em direção ao bosque ao qual se tinha uma visão ampla nos fundos da casa. Bastou isso e alguns segundos para que Damien compreendesse que Henry tinha adentrado aquelas árvores e embora não tivesse certeza se estava certo em deduzir aquilo, valia a pena tentar, afinal, conhecia Henry, sabia que ele procuraria um lugar onde houvesse um pouco de paz e a natureza, parecia o ideal.

Damien não pensou duas vezes, sem hesitar, saiu da frente da porta, sem dar nenhuma satisfação aquela mulher e sem incomodar-se com a ameaça velada presente na forma como ela caracterizava a entrada de Damien ali com uma invasão.

Passou pela lateral da casa, correndo em direção ao conhecido jardim dos Lockwood, Jennifer tentou segui-lo, mas desistira, assim que ele desaparecera em meio as árvores, tal como Henry havia feito há minutos.


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