A Velha Arte de Ruminar

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In the days of my youth, I was told what it means to be a man,

Now I've reached that age, I've tried to do all those things the best I can.

No matter how I try, I find my way into the same old jam.

(...)

I know what it means to be alone, I sure do wish I was at home.

I don't care what the neighbors say, I'm gonna love you each and every day.

(Good Times Bad Times – Led Zeppelin)

Jeb

As provas estavam todas diante de mim e a conclusão era inevitável: eu tinha mesmo virado um velho bundão.

Você nunca analisa esse tipo de coisa, nunca leva muito a sério, a menos que esteja acontecendo com você, mas agora eu estava sendo obrigado a encarar a verdade. E apesar de eu precisar disso tanto quanto de uma dor de dente, a coisa toda de ter sentimentos estava finalmente me atingindo.

Já ouvi dizer que envelhecer traz consequências estranhas para personalidades irrequietas, que ou você se torna uma versão amplificada do mesmo tipo de cabeça dura de sempre, ou você começa a mudar de maneiras que não esperava. Acho que peguei um pouco das duas hipóteses, mas, no fim, o que me assusta é o quanto acabei me apegando às pessoas daqui como se fossem uma família pela qual sou responsável. Eu, o velho e orgulhoso lobo solitário que sempre achou que a vida era mais simples sem alcateias.

Então, com o passar dos anos — especialmente dos últimos —, a solidão passou de fardo inteligente para um estorvo insustentável. Era certo que o "fim do mundo" tinha contribuído para isso; quer dizer, não dá para ficar preso ao último quinhão de humanos que povoam o planeta e não se apegar a eles; mas aí tinha a outra parte. O outro lado que não era mais outro lado, e que, no entanto, agora estava exatamente lá, fora do meu alcance.

Não ter que cruzar com Logan todos os dias tinha até seu lado bom. Pelo menos me dava tempo de colocar a cabeça no lugar e analisar tudo mais friamente antes de dizer qualquer coisa precipitada. Todo o episódio envolvendo o "susto" tinha sido muito estressante para nós dois, e a verdade que eu não confessaria tão cedo era que o cérebro dele não era o único que tinha ficado cheio de caraminholas com as quais eu precisava lidar. O meu também tinha se enchido de memórias esquecidas e fantasmas do passado, mas, na verdade, se eu tivesse que ser honesto comigo mesmo, precisaria admitir que foi um pouco antes de sermos "vizinhos de cachola" que a coisa aconteceu.

Tudo começou com aquela música.

A tal musiquinha que Logan e Estrela usavam para ninar Lindsay não era, na verdade, uma canção de ninar. Era uma canção antiga e pouco conhecida que meu pai gostava de cantar para nós e que eu costumava cantarolar para Norah quando estávamos juntos, porque achava que combinava com ela.

Claro que isso não queria dizer nada. Meu pai não tinha composto a música, afinal, e não era impossível que o Logan humano a tivesse simplesmente aprendido em algum disco velho ou com algum maluco preciosista que tivesse cruzado seu caminho na infância. O fato de que o Logan de hoje não guardasse lembrança alguma a respeito não significava que a explicação não podia ser simples.

Além disso, naquela noite eu não estava em meu melhor, obviamente, e os momentos anteriores ao meu desmaio eram meio nublados em minha memória. De maneira que a impressão que tive de que a voz dele era parecida demais com a de meu pai talvez não passasse de um devaneio. Assim como existiam diversas explicações para os olhos de Logan serem iguais aos de minha mãe e seu sorriso me lembrar o de Norah às vezes.

Coração Deserto 2 - O Futuro O EsperaOnde histórias criam vida. Descubra agora