38 - Caleb

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As noites de sua vida

Ele não queria contar nada a sua família.

Pelo resto dos dias que passou no porão, Caleb não comia nem bebia direito, emagreceu mais ainda. A sua parte da refeição ele dava a Joseph e, como num ato de despedida, ele passava o tempo todo com seu irmãozinho.

– Um dia, você será grande como eu e vai ter muito estudo, vai poder andar livre nas ruas e ter muitas namoradas. – Ele disse certa vez a Joseph em uma de suas conversas.

A sua insônia persistia. Todas as noites em claro, ele ia dar um beijo no rosto de sua mãe ou mexer em seus cabelos. Às vezes ela acordava, outras não.

Mantinha-se distante do pai. Chegou a dar razão a ele. Mas, outrora pensava que Lisie não os havia entregado. Sua mente estava confusa.

Sentia um vazio. Nada o distraia. Nem a perfeita música de Lisie na flauta, nem o gato Schuzy, nem suas escritas no caderno marrom...

Ele persistiu no porão por mais dois sacrificados meses. A mãe percebia sua mudança de comportamento, o pai sempre dizendo o que pensava e Joseph sempre mergulhado em sua inocência.

No dia 13 de abril de 1944 ele estava prostrado, sentado na cama de Lisie, a madrugada estendia-se e a primavera dava sinais de sua aparição. O gato Schuzy, por uma extraordinária exceção, não se encontrava no quarto e Lisie estava temerosa.

O momento de tensão dos dois fez com que o silêncio fizesse parte do cenário de medo. Mas, isso não impediu nada.

Caleb, com seu espírito otimista, levantou-se da cama e foi em direção a Lisie que estava na porta. Tocou seu braço, seu ombro e chegou a sua nuca. Beijou-a. As mãos de Caleb foram percorrendo o corpo da menina como um pirata que vasculha a área em que seu tesouro está enterrado. As respirações dos dois começaram a ficar cada vez mais rápidas e ofegantes. Caleb tocou, por baixo da roupa, os seios volumosos de Lisie e a garota tocava-lhe a barriga magra por debaixo de sua blusa.

Lisie virou-se para Caleb e os dois começaram a se beijar. O rapaz sentia um calor incondicional em si o que o fez tirar a blusa depressa. Num momento "normal" ele sentiria vergonha disso, mas naquela ocasião ele não se importou em revelar seu corpo para a menina. A mão grande e ossuda do judeu chegou a uma região jamais tocada por nenhum homem em Lisie. As sensações subiram-lhe a cabeça mais ainda. Ele conduziu, ainda beijando a menina na boca, para a cama, deitou-a e foi subindo seu vestido. Ela resistiu por duas ou três vezes. Depois cedeu. O calor era quase insuportável. Numa fração de segundo, totalmente nu, ele sentiu a melhor sensação de toda sua vida.

– Aí! – Lisie grunhiu.

Ele insistiu mais um pouco e outra vez ela manifestou dor. Parou.

– Estou machucando você?

Ela nada disse.

Ele tentou de novo. Adorou o prazer que sentia.

– Aí! – Lisie disse.

Ele não resistiu, continuou. Apenas avisou:

– Se doer muito, eu paro.

Não precisou parar. Continuou a sentir seu prazer e parece que Lisie também o sentia. Foi a melhor noite da sua vida. Aquilo persistiu. Havia, além de tudo, amor. Era o sentido daquela loucura toda. Valeu a pena.

A noite seguinte, essa sim foi uma das piores da sua vida, ele voltou a ver aquela figura horrenda por trás do manto negro. Tinha mais uns dez assim, vestidos de preto. Eles entraram pela entrada de fora, possuíam armas. Fizeram um alvoroço no porão e começaram a pegar cada um deles ali. Quando pegaram Joseph, por impulso, Caleb atacou um soldado o que o fez ser espancado por vários outros. Benjamin tentou proteger sua querida e amada esposa, foi espancado também.

Caleb jorrava sangue pelo nariz. Dois soldados o agarraram pelos braços e ele reconheceu a sua frente Wichard Schmidt, pai de Lisie.

– É você seu cretino! – ele esbravejou com sua voz horripilante. – seus dias estão contados.

A família Lipschutz foi arrancada do porão por meio de agressões e humilhações. Muito debilitado, Caleb começou a enxergar turvo. Foram postos dentro de um furgão junto com mais algumas pessoas.

Caleb começou a ver nitidamente quando estavam numa estação de trem de uso exclusivo dos nazistas. Um comboio estava sendo preparado. Inúmeros vagões de gado compunham o trem. Alguns seres humanos eram espancados ou alvejados. Os soldados recolhiam todos os pertences das pessoas. Joseph, por milagre, portava sua bola consigo. Deram ordens para a família Lipschutz entrar num dos vagões que já estava superlotado.

Lá dentro o espaço era mínimo e não havia janelas, portas ou qualquer abertura que permitisse a circulação do ar. Apenas uma micro janela na porta que foi abruptamente trancada, aquilo não ia permitir uma respiração adequada. Joseph estava agarrado a Sarah e Caleb estava espremido entre os demais.

– Viu o que você fez conosco, seu traidor! – Benjamin tinha ódio do filho naquele momento.

O cheiro era horrível e um cobertor do outro lado do vagão servia como um banheiro. Viajariam por longas horas até o campo de concentração e extermínio Hoffnung na Polônia sem comida e sem água.

Durante o trajeto, muitos morreram. Caleb chegou vivo e as marcas de sangue em sua blusa mostravam o início do terror que estava por vir.

Ele havia chegado a Hoffnung.

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora