Medo.

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Com amor, Mar.

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POV Vitória

A voz embargada de Ana tinha me desnorteado, e quase não fui capaz de elaborar uma resposta, até ser acordada pelas suas mãos tremulas e olhar marejado. Ela precisava de mim. Logo após seu pedido para ir embora, seguimos rapidamente para fora do aeroporto. Ana olhava para todos os lados desesperadamente, com um receio óbvio de acabar esbarrando com a sua mãe novamente.

Durante esse tempo de convivência, aprendi e reaprendi quem é Ana Clara. Ela é fechada, quase não fala sobre seu passado e eu nunca irei a pressionar para isso. Entretanto, ela deixava escapar suspiros frustrados seguidos de relatos sobre a terrível noite em que foi jogada no mundo sem aviso prévio, ou do momento que se viu sozinha sem ao menos um ombro amigo para chorar, me deixando com mais e mais vontade de cuidar pra sempre dela.

Ela era uma mulher tão pequenininha, mas com tanta força em si, me fazendo a admirar cada vez mais a cada dia que se passava, e meu coração apaixonado se partia em mil e um pedaços ao vê-la ali, no banco de trás, junto a Lis, encarando tristonha, pela janela, a natureza que passava rápido pela velocidade do carro. Feli seguia tagarelando ao meu lado sobre alguma coisa relacionada a mudanças, no rádio, tocava baixo "Amores Imperfeitos" do Skank, e Ana cantava baixinho algumas frases da música, quietinha, encolhidinha.

Eu tinha uma ideia do que se passava dentro dela, mas na verdade, não podia tirar conclusão alguma. Eu sei o que sua mãe significa, o medo que ela sentia daquela mulher e o quanto ela havia a traumatizado.

-Ei. —Falo chamando a atenção dela que me encara com os olhos vermelhinhos. Estendo a mão pra trás, e ela a segura. —Te amo. —Faço apenas a menção com a boca, sem emitir voz alguma. Toque de voz. Ninha sorri rapidamente de lado.

-Vocês são melosas. —Feli resmunga ao meu lado, me fazendo rir.

-Ainda solteiro, Felipe? —Brinco com sua amargura.

-Enrolado. —Ele menciona me fazendo o olhar com os olhos arregalados.

-E como é que tu não me conta uma coisa dessas antes? —Dou um soquinho fraco em seu braço.

-Te conto tudo em casa, se aquieta que tua filha tá olhando tudo. —Olho pra trás também me deparando com os olhinhos caidinhos de Ana Lis nos encarando curiosa. Solto um beijo em sua direção e ela finge pegar e guardar, coisa que aprendeu me vendo fazer com Ninha todas as manhãs. Sorrio para minha pequena e ela rapidamente volta a se aconchegar no colo de Ninha.

Já era noite quando chegamos em Araguaína. Ana seguia ainda silênciosa, mas as vezes respondia algumas perguntas que Feli fazia e até engatava pequenos diálogos. Quando Feli estacionou em frente a minha casa, agradeço aos céus. Havia sido um longo dia. Saio do carro e ando até o porta malas, mas meu primo pediu para que eu deixasse que ele levaria.

Lis salta do carro animada, com um sorriso grande no rosto, nem parecia que havia pego um voo e tinha ficado longas horas num carro. Sua empolgação estava inabalada. Já Ninha, sai se espreguiçando do carro quase como eu, me aproximo dela e a abraço de lado, sentindo seu suspiro cansado no meu pescoço.

-Vamos mamães, vamos! —A vozinha regada de alegria da nossa filha soa, enquanto ela estendia as mãoszinhas para nós. Ana sorri, me fazendo sorrir também. Lis era a nossa força.

Seguro na mão esquerda da minha pequena, e Ana segura na direita. Assim, entramos em casa lentamente, nos deparando com uma grande quantidade de gente no sofá extenso da sala.

-Meu líriozinho. —A voz de mamãe surge alta, enquanto ela andava as pressas até Ana Lis.

-Vovó! —Minha pequena se joga no colo da avó, me deixando com um sorriso bestinha nos lábios. Naquele abraço puro, continha simplicidade, confiança. Lis falava com a minha família e com os irmãos de Ana todos os dias, seja por Skype ou por celular, mas nunca esquecia de nos lembrar para ligarmos. Elas pareciam viverem juntinhas todos os dias, e na verdade viviam, de longe, mas de coração pertinho.

Segundo solOnde histórias criam vida. Descubra agora