Capítulo 54: O último adeus.

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Nunca achei que Patos de Minas fosse tão longe de Belo Horizonte como hoje, mesmo tendo demorado apenas as 6h de sempre. A viagem foi tranquila e praticamente silenciosa, exceto pela Júlia, que estava eufórica de viajar sem estar de férias.

Assim que chegamos na minha cidade natal, fomos direto para o hospital onde minha mãe está internada. Até pensamos em passar em casa antes mas com certeza meu pai não estaria lá e sim aqui no hospital.

- Pai. - Encontramos ele sentado, escorando sua cabeça em seus punhos, todo fletido. Mas assim que nos viu, se levantou e veio correndo para perto do nós, abraçando Madu e eu. E então começou a chorar. - Ei, paizinho, estamos aqui com você. Vai ficar tudo bem. - Lhe dei um beijo na testa. E bem, sei que não irá ficar tudo bem. Infelizmente.

- Oh minhas meninas que bom ter vocês aqui comigo, estou me sentindo tão só, tão impotente em não poder ajudar a mãe de vocês.

- E como ela está? - Madu perguntou.

- Sonolenta, devido aos remédios pra dor. Ela está sofrendo muito, e meninas, preciso ser franco com vocês. Ela não tem muito tempo de vida mais. Ela está em como eles dizem, com ênfase em conforto.

Se tem uma coisa que a faculdade me ensinou é que ênfase em conforto, é o último passo antes da morte, dali em diante não há mais nada que se possa fazer, eles apenas prezam para que a pessoa morra sem muito sofrimento.

- Isso não pode estar acontecendo. Não pode. - Madu disse me abraçando.  - Diz que isso é mentira Manu, que é só mais um drama da mamãe pra que a gente fique perto dela.

- Eu também queria que fosse assim, Maria.

- Mamãe, porque vocês estão chorando? Porque estamos em um hospital. - Júlia.

- Ah como ela está linda minha filha, e falante. - Disse meu pai com os olhos cheios de água, porém iluminados ao ver a netinha. - E quem é esse?

- Esse é o meu papai Lucas, vovô.

- Longa história pai, mas isso não é conversa pra agora.

- Você e Pedro terminaram?

- Deixa essa conversa pra depois pai, o enfoque agora é a mamãe. Podemos ir vê-la?

- Podem, podem ir as duas. Os médicos já estão liberando visita aos parentes mais próximos sem estipular hora/dia.

- Lucas, fica com Júlia pra mim. Não quero e nem acho prudente levar ela até ao leito da minha mãe.

- Claro. - Ele me abraçou. - Vai ficar tudo bem, só seja forte. - Me deu um beijo na testa. - Ei, Jujuba vamos comer alguma coisa.

A esfomeada da minha filha logo concordou e saiu com o pai, enquanto Maria e eu, subimos até o andar onde nossa mãe estava internada.

E assim que a encontramos naquele leito, ligada em alguns aparelhos, a ficha terminou de cair:

Estou perdendo a minha mãe.

- Mãezinha. - Aparentemente Madu saiu do transe antes de mim, e já estava ali, alisando o rosto da nossa mãe. - Porque não nos disse nada?

- Minhas meninas. - Disse meio sonolenta. - Vieram se despedir de mim.

- Não fala assim, mãe. Pensa que viemos apenas para uma visita cordial. - Disse com os olhos marejados. - Você não podia ter escondido isso da gente, sabe que faríamos de um tudo para vim cuidar de você.

- E foi por isso que não disse nada. Não queria que interrompessem a vida de vocês por minha causa. E além do mais você Manu tem sua filha pequena, um marido - ex - que viaja muito e você Maria, está no meio da faculdade, não poderia te atrasar a concluir seu sonho. A final, sempre soube que ia morrer.

- Não fala assim mãe. - Madu. Ver a minha caçula em prantos me deixava ainda mais desestabilizada.

- Minhas meninas, quero conversar sozinha, com cada uma de vocês. - Tossiu.

- Mãe, a senhora não pode se esforçar tanto.

- Não mande em mim até no final da minha vida, Manuela. Deixa eu conversar primeiro com a Maria. - Tentei convencê-lá a descansar mas foi inútil. E por tanto, saí deixando Madu conversando ou despedindo, entendam como achar melhor de nossa mãe.

Resolvi então ir até a lanchonete onde o Lucas estava com a Júlia e meu pai.

- E ai, como foi?

- Ela quer conversar particularmente com cada uma de nós, e escolheu a Madu para ser a primeira. - Me desabei na mesa.

- Ei seja forte, estamos do seu lado. - Disse acariciando os cabelos da Júlia que dormia em seu colo. O que a mocinha não dormiu no carro está compensando agora.

- Obrigada de novo, Lucas. Não sei como iríamos fazer sem sua ajuda.

- Não precisa agradecer. Eu tenho uma alma boa e gosto de ajudar. - Revirei os olhos. - Brincadeira. - Deu de ombros. - E está preparada para conversar com ela?

- Não. - Uma lágrima desceu. - Não, isso está me soando como despedida e não quero me despedir da minha mãe, Lucas. - Nisso Maria Eduarda chegou com os olhos marejados.

- Ela quer conversar com você.

- Estou indo. - Me levantei e fui saindo, mas antes o Lucas me puxou pela mão. - Lembre-se: seja forte.

Tudo o que eu mais queria era ser forte. Mas não é tão simples assim.

Assim que cheguei no quarto, ela estava ainda sonolenta, ora olhando pro teto, ora com os olhos fechados como se tivesse dormindo.

- Ei filha, venha aqui. - Me aproximei do leito e peguei sua mão, que continha vários roxos, devido a introdução de acessos para os medicamentos. - Me desculpa, Manuela. Me perdoa por ter te abandonado quando você mais precisou de uma mãe. - Ela começou a chorar e eu, bom, eu já estou parecendo uma fonte de tanta água que está saindo dos meus olhos.

- Não pensa nisso mãe, pelo amor de Deus.

- Não, minha filha. Não tem como esquecer o quão rude fui com você quando soube da sua filha, e o pior é que precisei chegar ao final da minha vida para me dar conta disso. Me perdoa Manu, me perdoa filha por não ter sido nem uma boa mãe, menos ainda uma boa avó.

- Claro que te perdoo mãe, na verdade nunca guardei raiva de você. E entendia que você tinha criado Maria e eu dentro de alguns princípios, que eu infelizmente nunca fui capaz de seguir. Então eu que te peço perdão mãe, me perdoa por não ter sido uma boa filha. - Segurei suas mãos. - E, ei, você tem uma netinha linda, esperta e muito amorosa.

- Como eu queria ter conhecido ela, mas meu orgulho nunca permitiu.

- Ela está aqui. Quer que eu à traga para que possa conhece-lá?

- Quero, quero ver o rostinho da bonequinha antes de partir.

- Mãe, só-só para de dizer que vai partir, você vai viver muito ainda.

- Nós sabemos que não, Manuela. Sabemos que não, mas pelo menos agora minha alma vai-se embora em paz, sabendo que me perdoo e por saber que criei duas excelentes e lindas mulheres e uma ótima mãe. - Queria realmente ser uma boa mãe pra Júlia, mas já comecei mal minha missão, deixando que outro homem tomasse o lugar do seu pai. Pude então ver uma lágrima descendo no seu rosto, enquanto dizia que nos amava.

- Ah mãe. - A abracei, e durante aquele abraço, pude sentir o seu último suspiro. - NAÃAAAAAO!

Ali, no meio do meu abraço minha mãe partiu, e-e eu não pude fazer nada pra impedir.

Imediatamente uma equipe médica entrou no quarto, de onde me tiraram, e quando voltaram atestaram o óbito da mesma. No mesmo instante todos vieram próximo ao quarto, e eu não conseguia falar que ela havia acabado de partir em meus braços, mas eles logo perceberam e caíram em prantos, Madu abraçou meu pai desolada e eu fiquei ali encolhida, até alguns braços conhecidos me acolherem, Lucas e Júlia.

- Estamos com você, não se esqueça. - Me deu um beijo na testa.

- Não chora mamãe, não chora. - Ela me deu um beijo no rosto, e eu abracei bem forte. - Eu vou cuidar de você mamãe. Não chora.

(...)

Pecado Predileto - Livro I [Em Revisão]Onde histórias criam vida. Descubra agora