Capítulo 23

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É ruim quando você não faz a mínima ideia do que fazer e tem que decidir naquele exato momento... Eu quero beijar a Anne?
Ela se aproximou a ponto de quase encostar nossos lábios, enquanto eu olhava para sua boca...
- Galera! Vocês viram o Chris por aí? Não vejo ele desde a última... Uh!- Arthur parou surpreso quando nos afastamos envergonhados, nos assustamos quando ele surgiu do além- Vocês estavam se pegando? Atrapalhei alguma coisa? Poxa mal aí, podem continuar!
- Não!- Eu falei nervoso.- Não estávamos...
- Só... Estávamos conversando!- Disse Anne timidamente.
- Certeza? Porque me pareceu que vocês estavam quase...
- Certeza absoluta! Eu acho que tenho que ir...- Falei me levantando.
- É... A próxima aula já vai começar!- Disse Anne- Nos vemos depois, Ryan.
Ela sorriu um pouco sem jeito, mas olhando intensamente para mim e seguiu, olhei ela ir pensativo e sentindo meu rosto corar de leve.
Arthur olhou para mim com um sorrisinho malicioso e eu segui sem dizer nada.
Na noite daquela sexta Ryck voltou para casa, disse que estava fazendo shows aquela semana, mas eu achava que ele estava era tentando se manter longe de alguma coisa.
Estávamos só nós dois, eu estava sentado à mesa lendo um livro para terminar um trabalho, já ele se sentou oposto a mim mexendo no notebook. Ao centro da mesa deixei meu celular.
Começou a tocar.
Era a Anne me ligando...
Nós dois corremos ao mesmo tempo, esticando a mão para pegá-lo. Mas fui mais rápido e o peguei primeiro.
- Anne?
- Me dá!- Sussurrava Ryck- É para mim!
- Sim, estou bem e você?
- Ryan!
- Ah, sim... Sair hoje a noite?
- Fala que sim! Fala que quero ver ela!
Tapei o celular e sussurrei:
- Fica quieto, retardado! Ela vai te ouvir!... Ah, então... Hoje não posso.
- Não! Eu vou te bater, Ryan. O que está fazendo?
Ele tentava tirar o celular de mim e eu desviava. Eu precisava fazer aquilo.
- Também acho... Mas eu ando precisando falar muito sério com você, Anne.
Ryck olhou para mim sem entender e se pindurando para alcançar o celular.
- Precisamos conversar... Sobre nós dois... Talvez devamos nos afastar um pouco por enquanto...
Ryck me encarou espantado e sem entender nada. Me empurrou e falou sem sussurrar.
- O que pensa que está fazendo, seu idiota?
- Anne eu preciso desligar, mas te procuro para conversarmos melhor depois, ok? Nos vemos na segunda...
Desliguei antes que ela escutasse Ryck do outro lado da linha, o encarei, ele estava me olhando cheio de raiva.
- Anda! O que está fazendo? Quem mandou dizer isso para a Anne? Quer estragar tudo?
- Não estou estragando tudo! Estou consertando as suas idiotices!
- Do que está falando?
- Eu não vou deixar você tocar na Anne!
Rychard parou me olhando e falou irritado:
- O que eu faço ou deixo de fazer não cabe a você!
- Se trata da Anne, então cabe a mim! Ela não merece que um idiota feito você a faça sofrer.
Já estávamos discutindo.
Chris e Julie entraram no apartamento e nos viram lá na sala.
- Que eu saiba ela não precisa de nenhum herói para defendê-la de mim!
- Mas eu vou, nem que eu precise interferir toda vez que você se aproximar dela! Só porque você não tem sentimento algum, não quer dizer que as outras pessoas não tenham! Ela está se apaixonando, Ryck. E está se apaixonando por uma mentira!
Ele parou por um momento mas se fez de durão, talvez para esconder o que estava deixando ele com medo e para me irritar.
- E daí? Era esse o meu plano mesmo!
O encarei com raiva.
- Quando você vai crescer e parar de brincar com coisas sérias? Você precisa se afastar dela o mais rápido possível, ela está quase cedendo...
- Não vou me afastar, já disse!- Ele pensou um pouco- Como sabe que ela está quase cedendo?
- Porque hoje ela se abriu comigo, Rychard! Falou seus medos e mágoas... E tentou me beijar.
Ryck agora me encarou espantado e com algo a mais no olhar... Me pareceu ciúmes.
- Anne estava prestes a ceder e se fosse você no meu lugar já teria magoado ela! Se aproveitado da situação! Eu não vou deixar, Rychard. Tudo tem um limite! E perto da Anne você não chega mais!
- Quem é você para tentar me impedir?- Esbravejou- Nem sei o que pensa que está fazendo se metendo! Você que deveria ficar bem longe dela, Anne só quis te beijar porque achou que era eu!
- Como pode ter tanta certeza? Você não passa de um ignorante!- Falei.
- Tendo! Por que está se importando tanto? Está apaixonado por ela agora?
E de novo... Eu ficava quieto nos momentos em que eu deveria dar uma resposta.
Apenas olhei para ele, meu silêncio fez Ryck se revoltar mais ainda.
- É isso? Você está apaixonado!- Ele parou me encarando- Pois fique sabendo que eu não vou ficar longe dela! Não vai ser você que vai me impedir de ficar com a Anne e de fazer o que eu quiser!
- Vamos ver se vai conseguir então!
- Ah, você quer ver?- Ele falou e nós dois já íamos partir para a agressão, mas Chris entrou no meio:
- Opa! Podem parar com isso agora! Sem brigas por aqui!
Afastou Ryck de mim, ele se soltou de Chris em um movimento brusco e me olhou ainda com muita raiva. Pegou sua chave e saiu do apartamento batendo a porta com tudo.
Ficou um silêncio tenso e constrangedor enquanto olhavamos para a porta. Chris se virou para mim preocupado e disse:
- Cara... Você não sabe o tamanho do problema em que acabou de se meter.
Depois disso não consegui falar nem com o meu melhor amigo, sabia o que ele iria me perguntar. Apenas me tranquei no quarto e não saí de lá até o dia seguinte.
Assim que amanheceu, eu e a Julie nos arrumamos e seguimos para nos encontrar e passar o dia com nossos pais. De noite íamos ter um jantar na casa da família de Eliza.
- Você não vai mesmo falar nada comigo sobre a briga de ontem, Ryan?- Perguntou Juh baixinho nos bancos de trás do carro dos nossos pais quando estávamos a caminho do jantar.
- Aqui não é um bom lugar para falarmos disso, Julie.
Chegamos e fomos recepcionados alegremente pela Eliza e também por Enzo e Luiza, pais dela.
Nos sentamos à mesa para o jantar, meus pais estavam empolgados e contando sobre a falsa viagem que Rychard estava fazendo, aparentemente ele e Eliza continuavam hackeando para parecer que ele estava indo super bem no curso e sempre que Ryck conversava com eles por telefone contava um monte de mentiras. O fato do assunto ter focado nele naquela noite não estava me ajudando.
- Eliza também continua tirando notas incríveis na faculdade.- Comentou Enzo sorrindo para sua filha.
- Ah, Lizi é super inteligente desde a infância, tenho certeza que vai se tornar uma ótima psicóloga!- Disse minha mãe sorrindo meiga para Eliza.
- Espero que sim, tia!- Disse Lizi sorrindo.
- Ah, já tem muitos clientes! Acho que vou ir desabafar no consultório dela, é muita loucura conviver com essa família!- Comentou meu pai e nós rimos.
- Agora diminuiu com Ryan e Ryck correndo atrás das suas formações, né?- Disse a mãe de Eliza.
- Sim, agora estão ocupados demais com as faculdades para ter tempo de aprontar. Falando em faculdade... está se relacionando com alguém da sua, Lizi?
Minha mãe sempre indo direto ao ponto.
- Não!- Eliza falou rindo um pouco sem graça- Não achei ninguém ainda.
- E você, Ryan?- Perguntou Enzo sorrindo para mim.
Engoli em seco me sentindo um pouco tímido.
- Não estou com ninguém.
- Engraçado, sempre achamos que vocês dois iam acabar namorando quando alcançassem a maior idade.- Falou Luiza.
- Realmente, formariam um bonito casal!- Comentou meu pai sorrindo.
- Com certeza, Ryan é um rapaz muito direito e de caráter. É o que espero para o futuro de Eliza!- Disse Enzo.
- Ai, eu sempre fico... Como é aquela palavra que você fica dizendo direto, filha?- Perguntou minha mãe.
- Shippando?- Falou Juh.
- Exatamente! Eu super shippo esses dois!
Olhei para Eliza, que também estava me olhando, nós dois estavamos corados e meio envergonhados.
- Vocês alguma vez já tentaram alguma coisa?- Perguntou minha mãe.
- Não, mãe!- Falei tipo repreendendo um pouco, estava morrendo de envergonha.
- Somos melhores amigos!- Disse Eliza sorrindo e tentando aliviar a situação.
- Aff, e amizade colorida existe para que, minha gente?- Minha mãe brincou.
- Mas... Vocês nunca pensaram a respeito?- Perguntou Enzo me encarando pensativo.
Respirei fundo também me sentindo pensativo como nunca.
Aparentemente todos estavam esperando minha resposta.
- Sim... Já pensei muito a respeito.- Muito mesmo.
- E a que chegou?- Perguntou Luiza.
- Gosta da Eliza?- Perguntou minha mãe sorrindo curiosa e esperançosa.
Olhei para a Lizi, seus olhos estavam fixos nos meus. Ela parecia ser a que estava anseando mais pela resposta.
Respirei fundo novamente, me sentindo tenso.
- Gosto demais...
Olhei para Eliza esperançoso de que pudesse capitar meu pedido de desculpas que estava lançando junto de meu olhar.
- Mas... Infelizmente só vejo ela como uma boa amiga.
Falei por fim e abaixei meu olhar me sentindo mal pela situação, continuando a comer e disfarçando, havia finalizando aquele assunto.
Eu acabei deixando um silêncio constrangedor na mesa durante quase dois minutos, mas que pareceram uma eternidade. Eliza também abaixou seus olhos e disfarçou tomando sua taça de vinho, mas vi em seu olhar que ficou bem triste com minha resposta... Eliza não sabia como ver ela assim estava sendo doloroso para mim.
- Hã... Amizade sempre é bom, né? Não se pegam, nem se beijam, mas é bom!- Falou minha mãe rindo, sem graça pela situação.
- Rubie...- Falou meu pai encarando nossa mãe.
- Nossa, eu e o John estamos planejando fazer uma mega viagem! Vocês já foram para a parte do...
Minha mãe começou a falar sem parar e mudando de assunto para não ficar um clima ruim e o jantar continuar bom. Mas o que estava se passando dentro de mim que estava roubando meus pensamentos... Eu finalmente parei de me escoder 100%, tinha dado o primeiro passo para a minha conclusão que estava demorando tanto para chegar... Porque eu sabia que iria doer falar a verdade.
O jantar finalmente acabou e eu fui para a casa dos meus pais, dormi por lá mesmo, mas acordei cedo e voltei para a área da faculdade. Arthur tinha marcado de reunir o pessoal lá na casa dele e fazer um churrasco no terraço, aproveitando que seus pais não estavam por lá.
Levei a Juh e a Eliza também, que estava conversando normal, mas eu sabia que Lizi estava fazendo aquilo só para aparentar estar tudo bem. No fundo, ela estava bem chateada comigo.
Thomas, Hillary e Chris já estavam lá quando chegamos. Ficamos curtindo, comendo, falando besteira e colocando música para melhorar ainda mais o ambiente.
Thomas e Japa estavam discutindo porque um queria sertanejo e o outro eletrônica, as garotas e o Arthur estavam conversando na mesa e eu estava mais afastado, me inclinei, me apoiando sobre um tipo de sacada de vidro que tinha ali e fiquei olhando para o longe.
Chris veio se chegando e parou ao meu lado, também olhando para o longe, avistando os prédios e construções da cidade.
- Você não vai perguntar?- Perguntei sem tirar os olhos dos prédios, já sabendo o que ele estava prestes a fazer.
- Depende. Você quer responder?- Perguntou Chris.
Olhei para ele, Christian estava perguntando se eu queria me abrir com ele. Seu melhor amigo sempre sabe quando você está mal.
Eu queria. Então concordei com a cabeça de leve.
- Você está apaixonado pela Anne?- Ele me perguntou.
Abaixei um pouco a cabeça, pensativo. Esperei alguns momentos e respondi, enfim:
- Não.
Ele olhou para mim também bem confuso.
- Então porque não disse isso para o Rychard?
- Acho que não tive coragem, porque lá no fundo... Eu queria muito estar apaixonado por ela... ou pela Eliza.
Nós dois olhamos para a Eliza que conversava distraída com a Juh.
- Como assim?
- Eu nunca me apaixono, Chris! Queria poder sentir, sabe? Poxa, Eliza é a garota perfeita, sei que ela gosta de mim e juro que tentei muitas vezes me aproximar... Você não faz ideia de como doeu ver que eu machuquei ela ao dizer a verdade, cheguei até a pensar em tentar mesmo sem sentir nada, mas não seria ainda mais errado com ela? Eu não faria Eliza sofrer ainda mais? Só não consigo sentir nada por ela ou por qualquer outra pessoa. O mesmo aconteceu com a Anne. Quem não se apaixonaria por ela?
- Isso é verdade... Seu irmão se apaixonou.
Olhei para ele surpreso.
- O que?
- Sim, por incrível que pareça ele está apaixonado. Talvez Ryck não seja tão insensível quanto se mostra ser...
Parei pensativo no que Chris estava dizendo.
- Mas por que você aparenta estar tão chateado nesses últimos tempos, Ryan?- Chris perguntou.
- Eu... Me sinto contra a parede! É como se eu estivesse em um labirinto, onde as pessoas ficam me pressionando a seguir por um caminho, mas quanto mais faço isso, mais me sinto perdido... Deslocado, Chris. Sinto que sou diferente de tudo e de todos e fico com medo dessa diferença! Será que eu nunca vou ser como as outras pessoas?
Chris pensou olhando em meus olhos durante alguns segundos. Apenas sorriu para mim e aquele gesto foi o suficiente para amenizar uma boa porcentagem da minha preocupação.
- Ryan, já parou para pensar que é você mesmo que também se coloca contra a parede, desesperado para ser como as outras pessoas?
Parei surpreso.
- Você não é como seu irmão, que tem um jeito único de lidar com tudo. Também não é como eu, que estou me especializando em ser o melhor conselheiro do mundo!- Ele deu risada, me fazendo sorrir também- Do mesmo jeito que nós não temos um coração tão grande quanto o seu, nem a ingenuidade e sinceridade que andam em falta no mundo nesses últimos tempos.
Ele colocou a mão no meu ombro, ainda mantendo um sorriso sereno.
- Cada um tem suas diferenças e isso é viver, aprender não só com as diferenças dos outros, mas também com as suas próprias! Não se cobre tanto. Se até o Ryck é capaz de se apaixonar, por que você não seria? Não são os outros que vão escolher quem é a pessoa perfeita para você, é seu coração que tem que fazer isso. Ele sabe melhor do que as pessoas o que faz, só esqueça o resto e espere pela pessoa especial... Escute mais seu coração e deixe ele escolher por quem você deve se apaixonar, Ryan.
Aquilo me tocou de verdade, me fez refletir como não fazia a muito tempo, agora sem preocupações e sem me colocar contra a parede.
Sorri de volta para o Chris, que ainda estava mantendo seu sorriso confiante, vi meu reflexo em seus olhos castanhos que estavam ainda mais claros por causa do Sol antes dele se virar para continuar admirando a paisagem ao longe. Fiquei observando Chris e fiz o que me aconselhou, tentei ouvir meu coração. E o estranho... Era que ele estava mais acelerado que o normal naquele momento.

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