Primeiro olhar

Capítulo 63 - Rubens

Meus pais sempre foram muito pobre mas deram o melhor que puderam pra mim. Fui muito grato a eles, eu queria um dia poder recompensar todo esforço e amor que me deram.
Eu era um jovem sonhador, com objetivos mas tudo mudou quando conheci a ambiciosa Vanessa. Eu me apaixonei completamente por ela, senti sua decepção ao saber que eu era pobre, desde então soube que se quisesse mesmo ficar com ela, a missão seria bem complicada.
Eu só precisava que ela esperasse por algum tempo, até eu ser alguém nessa vida e dar a ela a vida que ela sempre dizia merecer.
Mas ela não soube esperar, foi embora. Me deixou aqui sem nenhuma explicação.

Eu tinha que continuar minha vida, consegui trabalhar em uma multinacional, eles eram muitos exigentes mas consegui viajar junto com a empresa para Londres.
Encontrei ela lá, as duas semanas que passei em Londres, foi ao seu lado. Aproveitei cada momento ao seu lado, levei anos para chegar até aqui, para ser alguém e dar um vida melhor como ela sempre sonho.

Fiquei furioso quando me contou que estava comprometida com outro homem, eu me matando de trabalhar, pensando nelas todo esse tempo e ela seguiu sua vida sem pensar em mim. Eu voltei para o Brasil sem me despedir. Tenho certeza que isso não fez diferença nenhuma pra ela.

Mais alguns meses se passaram e eu não consegui atingir o limite que a empresa exigia, a crise estava alta então acabei sendo dispensado.
Ela me procurou, me contou sobre a gravidez mas eu sempre soube que não podia ser pai pois durante minha infância contrai caxumba e sem o tratamento adequado fiquei estéril, isso é uma coisa que eu nunca contei a ninguém. Mas enquanto ela acreditasse que fosse eu, ela ficaria ao meu lado.
Fiquei envergonhado de ter que voltar para casa dos meus pais, então aceitei a proposta de Vanessa.
Apesar dela estar com o marido, alguém quem eu nunca tive a curiosidade de conhecer,e u não conseguia deixar de amar ela, por mais safada e pilantra que ela fosse o meu coração era seu. Ela acabou conseguindo o que sempre quis, casar com um homem rico e ter uma vida fácil.

Ela continuava muito mais linda, muito elegante, mais jovem, mais cheia de vida mas por dentro ela não muda, o sentimento não passou. É tipo doença que não tem cura, desde aquele dia eu esperei por ela.
Essa proposta de ser seu amante, de me levar em lugares legais, de bancar a minha vida não era interessante mas as coisas ficaram de um jeito sem rumo que eu não tive outra alternativa a não ser aceitar.
E por anos vivemos assim, festas, viagens, tudo do bom e do melhor, eu também estava me acostumando com essa vida boa e pra ser sincero eu não queria perder.
Meu amor por ela não acabava, juntos nos tornávamos um furacão, era bom nossas aventuras, nossas loucuras, não vivíamos em função de rotina.
Mas um dia ela pediu uma prova, eu não podia dar um joia a ela, a não ser que eu roubasse e foi exatamente isso que eu fiz.
Fui pego em flagrante, fui preso e fiquei preso por oito meses. Lugar onde conheci uma vida muito pior que eu tinha.

Conheci a maldade, o jogo sujo, a ser ruim, eu aprendi tudo que a vida podia me ensinar.
O inferno não é embaixo da terra, o inferno é o presídio, ali é a existência de um inferno pois não existe um sistema carcerário no Brasil, mas sim um inferno, um caos, fragmentos de uma bagunça generalizada, não tem privacidade, não tem lugar para todo mundo dormir, fica todo mundo no chão. No banheiro, tinha que revezar, cada um dormia um pouco. O grande problema do sistema prisional é a superlotação que impede que o preso de ter uma vida digna, assim os detentos acabam tendo que brigar por necessidades básicas, como por um lugar onde dormir. Muitos ficaram doentes, porque aquele lugar é imundo, tem barata para tudo quanto é lado.
Quem faz parte da facção tem livre acesso aos telefones. Eu não tinha telefone nenhum mas me comprometi com algumas pessoas lá e que tinham muita influência.

O que mais tem é droga, de todo tipo. Tem mais lá dentro, do que aqui fora. A própria droga é um calmante para os detentos, até eu me arrisquei a usar mas o pior de tudo é o que eles fazem com a gente durante as revistas.

Eles batem em todo mundo com pedaços de pau, soltam bomba de gás, soltam cachorro, jogam nossas roupas no chão, isso quando não abusam e nos humilham. Do fundo do meu coração, se fosse para cumprir muitos anos em alguma prisão, eu preferia morrer.
Pouco tempo depois que tive a liberdade, Vanessa começou a reclamar do marido e disse que não poderia mais me bancar, não tive outra saída a não ser voltar para casa dos meus pais.
Claro que a vida deles não ia mudar, estavam velhos e o pior é que tinham mais uma boca para alimentar.
No começo percebi a adoração dos meus pais por ela, eles não podiam dar preferência a uma estranha pois eu sou o filho de sangue deles, eu coloquei Maryah para correr, assustei o suficiente para saber que ela não iria voltar.
Por mais que eu tenha ficado preso não estava acostumado com tanta pobreza e mesmo por tanto tempo fora de casa, meus pais me tratavam como rei.

Um dia me peguei pensando em como tinha me tornado uma pessoa fria e sem coração, como Vanessa. Eu deveria fazer isso pelos meus pais, por um momento me senti envergonhado mas a essas alturas eu não tenho mais nada que perder, fui até o inferno e sobrevivi, então que tudo se exploda.
Não demorou muito para que Vanessa viesse atrás de mim, me levou até a casa onde ela morou com o doutor, sem dúvida ela viveu muito bem, a casa é enorme, com empregados, na garagem tem carro, moto.
Tive a oportunidade de conhece Luíza, uma menina linda e adorável, não entendo como Vanessa pode ser ruim até mesmo com a filha. Se fosse minha, eu seria o pai mais orgulhoso desse mundo.
Quando Vanessa disse que ficaríamos morando ali, gostei da ideia, não seria ruim mas isso não aconteceu.

Em pouco tempo o doutor voltou, ao lado de Maryah. E quantas novidades, ela estava sobre os cuidados do médico, a nova protegida dele.

Quanta coincidência, o mesmo cara que eu atirei está aqui na minha frente. Ele nos expulso da casa mas Vanessa prometeu vingança.
A verdade que isso ficou para mim, ela não quis sujar suas mãos nem se expor, ela não parava de falar, de infernizar, eu sei que ninguém é influenciável mas Vanessa me deixou de uma jeito que eu era capaz de fazer qualquer coisa só para ver satisfeita.
Quando coloquei Maryah para correr da casa dos meus pais, eu nem imaginei que cruzaria novamente o meu caminho e todas as coisas ruins que fiz depois desse dias foi por influência de Vanessa, eu diretamente não tinha mais nenhum problema com ela.
Então passei a ver Maryah de outro jeito, ou com outros olhos, eu até poderia fazer o que Vanessa queria mas eu também ia me divertir.
Sei que minhas intenções de seduzir e ter Maryah, custou caro. No dia em que a feri, eu não tive a intenção de a machucar mas ela não parava e sem querer aconteceu, eu fugi para que não desconfiassem de mim, por isso tive a cara de pau de ir até o hospital ver papai. Mamãe comentou o que tinha acontecido com Maryah mas ela foi acordar bem no momento em que eu estava ali, para dar com a língua nos dentes... Maldita!
Fui preso e já pedi seguro, eu não queria me misturar com aqueles infelizes mais uma vez. No mesmo dia fiquei sabendo que papai morreu, dias depois foi mamãe.
Nesse meio tempo Vanessa foi me visitar e depois de me ver na merda mais uma vez, tirou seu corpo fora, me abandonou completamente.
Só assim eu pude sair para a cremação, dei o meu jeitinho e consegui fugir.
É claro que meu objetivo principal era me vingar do casal e de Vanessa mas não achei nenhum deles.
Fui obrigado a ficar na espreita porém não tive sucesso, fui pego próximo a casa do casal.
Dessa vez o seguro não ia me cobrir, cai no meio dos piores presos, em meio a uma briga eu levei a pior.
Estava no hospital, não conseguia sentir meu corpo, minha respiração estava fraca, minha vista embaçada, tive poucos minutos para refletir em tudo que tinha feito na minha vida.
Eu era um jovem sonhador, com um futuro brilhante pela frente mas pra satisfazer a ambição daquela diaba, eu me tornei esse ser desprezível. Levei meus pais a morte com tanto desgosto, fui um atrapalho na vida de pessoas que nunca fizeram mau a mim, eu não fiz nada de bom, nada de que eu possa me orgulhar. Fui apenas um tolo, deveria ter percebido as intenções de Vanessa, tudo que eu fiz e vivi por ela foi passageiro, não valeu a pena.
Infelizmente o perdão dos meus pais eu não posso obter, estou a espera da morte, dependendo apenas do perdão de Maryah, foi satisfatório, prazeroso saber que apesar de todas as coisas que eu fiz ela me perdoa e por gratidão queria explicar o porque, dizer que o motivo sempre foi Vanessa mas meu tempo acabou...