Primeiro olhar

Capítulo 6

Hoje é segunda feira e eu deveria ir para a escola mas não tenho como ir com todas minhas coisas aqui comigo. Não tenho o que fazer a não ser andar até achar um lugar onde posso me sentir segura. Da última vez que estive perambulando, não foi legal. Por isso andei muito, me via novamente naquela situação como se tivesse voltado aos meus 13 anos. São nove horas da manhã e meu estômago já está roncando de fome, eu apenas jantei na noite anterior. Saí de casa sem trazer comida e não tenho nenhum tostão no bolso e para ajudar, começa a chover. Corro para o lugar mais próximo que posso me proteger por enquanto, fico sentada na frente de uma casa com uma placa que tem o nome bem grande, Consultório médico Lancer. Fico aqui sentada e chorando, me perguntando porque as coisas ruim sempre acontecem comigo? O que fiz para merecer isso? Azar na vida. Azar no amor. E sorte no azar.

Não sei quanto tempo fico aqui sentada mas a chuva continua caindo sem parar. De repente não sinto mais a chuva caindo em mim, mas escuto ela por isso levanto a cabeça para ver o que aconteceu e levo um tremendo susto.

- O que você ta fazendo aqui nessa chuva, menina? Por favor, entra aqui comigo! Fico um pouco desconfiada mas é melhor do que ficar na chuva.

João Miguel, está aqui com um guarda chuva e me convidando para entrar. Ele me ajuda a levantar, pega minha mochila rasgada e me conduz pela casa, me levando até um quarto, entregando uma toalha.

- Atrás dessa porta tem um quarto e um banheiro, toma banho quente para não ficar doente e depois conversamos.

E foi o que fiz, ele como médico sabia muito bem o que estava me falando. Nem sei quanto tempo fiquei no banho, banho bem quente na intenção de aquecer o frio causado pela chuva. Agora eu tenho outro problema, não tenho roupa para vestir pois o que eu tenho está na minha mochila que agora além de rasgada está totalmente molhada.

Quando volto para o quarto percebo que há um roupeiro aqui, abro e procuro por algo que eu possa usar. Acho que ele não vai se importar se eu pegar um par de roupa, com tantas que tem. Pego uma cueca sua, um camisetão e uma calça de corrida. Claro que fica tudo largo pois ele é grande e forte, ao contrario de mim que sou pequena e magrela. Decido sair do quarto e procurar por ele, quando ao abrir a porta ele está do outro lado como se fosse entrar.

- Pensei que poderia estar com fome! Acho que ele era capaz de ouvir meus pensamentos. Ele me olha e ri. Eu sei, devo estar muito engraçada.

Ele traz uma bandeja com suco, bolachas e um sanduíche. Me entrega e se retira. Eu sento nessa cama macia e como tudo, não deixo cair sequer uma migalha. Eu sinto vontade de deitar e dormir, acho que acabei adormecendo pois quando acordei estava coberta. Porque esse homem tá me ajudando? Será que é consciência pesada?

Assim que acordo, vou procurar por ele, entro nos cômodos errados, até encontrar ele numa sala bem organizada com alguns equipamentos médicos. Está tão distraído fazendo algo no notebook que nem me viu entrar e sentar. Fico aqui uns 10 minutos, quando ele abaixa a tela, leva um susto.

- Desculpe, eu não percebi sua presença. Quer me contar o que aconteceu? Ele para tudo e passa a prestar atenção em mim.

- Não precisa se desculpar, não deveria ter entrado assim. Sinceramente, não sei se minha vida te interessa e a verdade é que nem sei por onde começar.

- Pode me interessar por isso comece do começo. O que acha de começar pelo seu nome que eu ainda não sei. Sabia que essa conversa ia ser um pouco longa, por isso me endireito na poltrona.

Começo contando que fui deixado no orfanato ainda bebê, e como foi minha experiência naquele lugar. Também que contei que fugi e entrei uma lar, lar de casal idoso e humilde, por isso me submeti a vender os doces para não faltar alimento na nossa mesa. Se eu cheguei até aqui, é por causa de Rubens, então não tinha como não falar dele.