XXII

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Foram os três melhores dias que já lembro de ter passado ao lado de alguém. Descobri que Henry é um péssimo jogador de hóquei de mesa, mas um ótimo jogador de boliche. Descobri que ele adora comida mexicana e sorvetes de sabores exóticos, como de bacon.

Descobri coisas sobre Henry que não foram tiradas de uma revista ou sites adolescentes, e coisas que talvez nunca aparecerão em tais lugares. Tive a sensação, todos os dias em que passamos andando de um lado para o outro da cidade, perdendo horas em estações de jogos do shopping dirigindo um simulador de corrida e chocando os carros nas laterais da pista só para vê-lo rodopiar na tela e rir como duas crianças, de que estava conhecendo o Henry Smythe de verdade. Não o que parece trocar de namorada a cada mês, ou aquele que atua em filmes cotados para o Oscar, ou o que recebe músicas em sua "homenagem". Senti que aquela versão do Henry que estava comigo todos esses dias era a versão beta, o Henry que não se tornou famoso e só estava aproveitando alguns dias com uma pessoa qualquer, uma pessoa comum.

Foram dias só meus, onde eu vi um Henry que parece ser só meu. E vou guarda-los só para mim.

E agora, que Henry joga a mochila azul nas costas e respira fundo, virando-se para mim, eu sinto que não deveria ter aceitado que ele viesse aqui para o apartamento naquele primeiro dia. Se eu tivesse recusado e seguido em frente, não teria mil pedacinhos do coração batendo freneticamente aqui dentro. Eu seguiria sem saber direito quem é esse tal de Henry Smythe, e não haveria por que me importar com isso.

Mas, não...

Eu aceitei.

Eu o conheci.

E eu, estupidamente, me apaixonei.

Só para vê-lo ir embora agora.

O quão estúpido foi tudo isso?

Droga, droga, droga. Uma lágrima escorre pela minha bochecha e eu a seco tão ligeiro que nem sei se Henry nota. Meu nariz vermelho já é suficiente. Meu consolo é que o nariz de Henry parece tão agitado quanto o meu.

— Sabrina... — Ele me chama com esse seu sotaque forte, já comum aos meus ouvidos. Ninguém pronuncia meu nome como ele.

— Henry... — replico, no meu sotaque mais forte de Minnesota.

Henry vem até mim em dois passos largos. Ele apoia ambas as mãos em meus ombros e suspira.

— Obrigado — diz, apenas. Parecia que tinha algo a mais, mas ficou no meio do caminho.

Eu não respondo, só assinto. O que eu poderia dizer?

"De nada, Henry. Pode ficar aqui sempre que vier a Minnesota. Ou se quiser, pode ficar aqui para sempre!"

— Você vai saber viver sem mim? — Henry repuxa um canto do lábio. — Vai conseguir se virar sozinha aqui? Sem minha ilustre presença?

Fungo, esfrego o nariz e deixo escapar uma risada.

— Os primeiros dias serão duros — digo, ainda sorrindo, mas não mentindo. — Mas eu vou conseguir. Vou dormir chorando hoje, e amanhã, e depois de amanhã talvez, mas minha vida pós-Henry continuará — exagero no drama e Henry assente forte.

— Eu sei, eu sei. — Ele revira os olhos e dá mais um pequeno passo a minha direção. — Vai ser complicado para mim também, sabe, viver sabendo de sua investigação digna de Sherlock Holmes sobre minha vida. A cada passo que eu der agora, pensarei: Sabrina estará lendo sobre isso amanhã?

— Ei, pelo menos você se manterá na linha daqui em diante! — Soco o punho fechado em seu ombro.

Henry leva a mão aberta à testa, como um soldado obedecendo ao coronel.

Henry Smythe I & IIOnde histórias criam vida. Descubra agora