Le Coeur et La Guillotine

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- THIERRY! - gritou Marlon ao vê-lo desfalecido no chão. Ele voltou seu olhar para Juliet, que ainda mantinha sua mão cerrada erguida na direção de Thierry. - O que você fez?


- Ele estava indo embora. Tentei impedi-lo. - ela respondeu.


- Como pôde fazer isso? - rosnou Marlon, dando passadas fortes em direção à garota. - Não acha que ele já sofreu o bastante?


Juliet deu passos assustados para trás sem tirar os olhos de Marlon.


- Eu só achei que deveria...


- Matá-lo antes que alcançasse a porta.


- Eu não o matei! - ela defendeu-se. - Ele está apenas desmaiado.


- Mas poderia tê-lo matado. Um passo em falso, e seu truque de mágica poderia causar uma parada cardíaca.


- Eu sei controlar meus poderes. - os olhos de Juliet estavam marejados e ela tremia de medo. Marlon seria capaz de fornecer-lhe pesadelos pelo resto da vida se fosse de sua vontade. - Jamais o machucaria.


Juliet esbarrou em uma escrivaninha e Marlon se aproximou ainda mais dela.


- Chega! - disse Folha, colocando-se entre os dois. - Juliet é experiente o bastante e fez o que foi preciso para impedi-lo de voltar correndo para as garras da sereia. - ela apontou seu dedo comprido para o peito de Marlon. - O único aqui que parece não ter qualquer controle sobre suas capacidades é você. Não pode deixar que esse rapaz o afete deste modo. Parece uma criança inconsequente desde que o conheceu.


Marlon estancou onde estava. Folha estava certa. Ele estava sendo muito irresponsável. A prova e consequência disso estava desmaiada a poucos passos dele.


Marlon olhou para Juliet. Ela estava encolhida atrás de Folha como se a altura da mulher fosse capaz de protegê-la dele. Os ombros dela tremiam enquanto ela chorava desesperadamente. Sentiu vergonha de si mesmo. Vergonha de ter se tornado fraco. Vergonha por não ter protegido Thierry. Vergonha por ter perdido o controle e gritado com Juliet. Ela não merecia sua fúria.


- Juli, eu sinto muito. Eu...


Ele, porém, não pôde terminar a frase. Juliet saiu correndo, aos prantos, até a porta dos fundos.


Marlon mordeu os lábios com força. A contração de seu rosto causou-lhe uma dor no queixo e ele se lembrou do soco que havia recebido de Thierry. Ele não estava preocupado com o machucado. Curaria rapidamente. Thierry era tudo o que importava agora. Marlon não conseguiria lidar consigo mesmo se algo pior acontecesse a ele. Não depois de tudo o que havia ocorrido naquele mesmo dia.


Ele foi até o corpo inerte de Thierry e o carregou para o quarto. O seu quarto. Não havia permitido que Thierry dormisse em um quarto de hóspedes e não permitiria agora. O seu quarto era o mais confortável depois do de Raul e seria lá onde Thierry descançaria.


Marlon fechou a porta atrás de si com movimentos silenciosos. Folha o esperava do lado de fora.


- É ele? - ela perguntou com um ar de preocupação. Marlon franziu o cenho. - Posso não conhecer tudo sobre a sua espécie, Marlon, mas sei o suficiente. Sei que, uma hora ou outra, acabam encontrando um Beliz, um predileto. Alguém que deseja proteger.


- O quê? Pensa que sou uma espécie de Faiblesse?


- Não, Marlon. Vocês são muito mais que Faiblesses. O Faiblesse não tem outra função na vida que não proteger o bruxo ao qual foi designado. Homens como você protegem todos nós de nós mesmos e dos Normais. Mas entendo que são criaturas transbordantes de amor que buscam alguém em quem despejá-lo.


Marlon abriu uma fresta da porta e olhou para a figura adormecida de Thierry que estava estendida sobre sua cama.


- Você sabe demais para uma elfa. - ele murmurou.


- Moro aqui há anos e ainda pensa que não aprendi nada sobre você e seu pai?


- O que mais você sabe? - Marlon insistia na conversa por estar louco por algo que o distraísse.


- Que o Beliz é uma espécie de privilegiado. Terá sua lealdade e proteção pelo resto da vida. - ela suspirou. - Isso significa que, se ele for mesmo o seu, terá que aprender a controlar seus impulsos protetores, Marlon. Sei que quer o melhor para Thierry, mas não pode sair por aí ameaçando qualquer pessoa com quem ele se relacione. - Folha olhou significativamente para Marlon. Ele entendeu que ela estava se referindo a Juliet. - Temos um segredo a zelar e, por mais que seja difícil para você compreender, ele é muito maior do que há entre vocês dois. Fadas, elfos, sereias, lobisomens, bruxos, vampiros... Todos nós vivemos sob este mesmo teto e todos temos a obrigação de guardar este segredo.


- Acha que sou tão estúpido a ponto de contar tudo para ele?


- Acredite: ninguém melhor que um elfo para interpretar os sentimentos. Arrisco até a dizer que não hesitaria em contar, caso não tivesse medo da reação dele sobre o que você é.


Marlon a olhou de relance, tirando seu foco momentaneamente de Thierry. Ela não estava enganada, afinal.


- Eu o amo. O amo muito. - Marlon não sabia se havia feito o certo ao contar sobre aquilo a Folha. Ela o havia criado desde pequeno e era a pessoa mais confiável que conhecia, mas ele sentiu medo que ela o repudiasse.


- Eu sei. - ele a encarou, agradecido.


- E o que faço agora?


- Prepare-se.


- Preparar-me para o quê?


- Para perdê-lo. O seu amor não é garantia de que vão ficar juntos para sempre. Ele não sente do mesmo modo que você e pode querer afastar-se em algum momento.


Marlon não podia acreditar no que ouvia.


- Por que diz isso? Por que sempre deseja que o pior aconteça?


- Não desejo que o pior aconteça. Desejo apenas que esteja preparado caso ele venha a ocorrer.


- Está dizendo que ele não me ama?


- Estou dizendo que, quando estou perto dele, sinto um emaranhado de emoções confusas. A maioria ruim. Não sei ao certo quais delas ele endereça a você.


Marlon não tirou os olhos de seu Beliz. Nunca desejou com tanta força ser amado por alguém.


- Tenha cuidado, Marlon. O amor fortalece as pessoas, mas também pode enfraquecê-las se não tomarem cuidado. Amar é colocar o coração na guilhotina e entregar a corda que solta a lâmina para outra pessoa. É um risco alto que não depende apenas de você. - Folha tocou o ombro de Marlon e o apertou afetuosamente. - Só quero que tenha certeza de que está entregado a corda para alguém de mãos firmes.

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