Beau à L'extérieur, Laid à L'intérieur

12 3 0
                                    

- O que há de errado com você ? – perguntou Marlon assim que o alcançou. – Insiste em vir aqui apenas para atormentar-me com mais preocupações?
Thierry continuou a caminhar. Marlon começou a perder toda a paciência que lhe restava com a teimosia dele.
- Thierry, olhe para mim! – nada em resposta. – THIERRY!
Acelerando um pouco mais ele alcançou o braço de Thierry e forçou-o a olhá-lo nos olhos. Thierry ainda permanecia com o mesmo olhar endurecido de sempre, mas algo em suas feições deixava claro o quanto estava transbordando de raiva.
O estresse em Marlon apaziguou-se. Não resolveria qualquer coisa se os dois estivessem fora de si.
Ele respirou profundamente antes de retomar a fala.
- Seu pai estava certo quando pediu que o cocheiro ficasse de olho em você. Deve voltar para a estalagem e ficar em repouso, entendeu?
Thierry não teve a mesma preocupação em demonstrar calma.
- Meu pai nunca pediria que qualquer pessoa ficasse de olho em mim. O cocheiro está apenas arrumando uma desculpa para não ter que ficar sozinho com seus “amigos”.
- E por qual motivo ele faria isso?
- Talvez ele não queira ter pesadelos à noite. – Thierry tentou soltar-se, mas o aperto de Marlon em seu braço ficou ainda mais forte e a expressão dele, mais dura.
- Pois fique sabendo, senhor Laforet, que eles são, sem sombra de dúvida, as melhores e mais generosas pessoas que conheci. – sibilou ele, indignado com as grosserias de Thierry.
- Eles são belos por dentro, não são? – riu debochadamente Thierry. Um turbilhão de emoções que ele nunca pensou possuir borbulhava em seu corpo como sempre acontecia quando Marlon estava por perto. – E é isso que importa para você, estou certo?
- Está mais do que certo.
O sorriso de Thierry transformou-se em algo similar a uma careta de dor. Ele espremeu os olhos. Ele queria chorar, mas não sabia como. Não se lembrava da última vez em que chorara.
- Você é idêntico à minha mãe. Os dois sempre querendo enxergar o melhor que se esconde no interior das pessoas. Iludem-se tanto acreditando que sempre existe algo de bom em todos que acabam demorando a perceber que não há nada de bom em mim. Até que é tarde demais.
- Do que está falando?
Thierry soltou-se de Marlon e enfio-se na floresta. Marlon o seguiu até encontrá-lo sentando embaixo de uma árvore, os olhos fixos no nada.
Marlon sentou-se ao seu lado e eles ficaram em silêncio por muito tempo. Ele desejou que Jacques não se preocupasse por Thierry ainda não ter retornado. Enquanto tivesse um lobisomem ao seu lado, seu Beliz estaria em segurança.
- Ela suicidou-se. – murmurou Thierry. – Eu vi o frasco de veneno ao lado da cama dela.
- Sua mãe?
Thierry concordou. Marlon demorou um pouco para absorver a informação inesperada.
- Poderia ser outra coisa.
- Não era. Deixei que um rato experimentasse o pouco que sobrou dentro do frasco e o encontrei morto poucos minutos depois.
Marlon estendeu sua mão e segurou a de Thierry que estava bastante fria.
- Sinto muito.
- Eu não. Nem sequer chorei em seu enterro. Não consegui.
Thierry apoiou a cabeça no ombro de Marlon. Nunca contara a história do suicídio para ninguém. Nem mesmo ele era capaz de cometer aquele tipo de crueldade contra suas irmãs ou seu pai.
Mas sua mãe fora.
- Não a culpo. Até a compreendo um pouco. Sei que foi por minha causa.
- Não deve ser verdade.
- Sei que é. Ela me amava. Tenho certeza disso. Ela também foi a única pessoa que amei em toda minha vida. Eu já amei alguém! Consegue acreditar nisso? Nem sempre fui assim. Pelo menos não o tempo todo.
Marlon apertou ainda mais a mão de Thierry que estava entrelaçada a sua.
- Acho que ela descobriu o que eu era. De tanto olhar para dentro de mim procurando o bom, ela apenas se deparou com o mal. Ela soube o que eu era. Seu próprio filho estragou sua visão perfeccionista do mundo.
Thierry afastou-se de Marlon e abriu os braços. A luz do sou recaiu sobre ele, fazendo com que seus fios de cabelos dourados brilhassem e que sua íris completamente negra adquirisse um brilho esbranquiçado.
- Olhe para mim, Marlon! Isto – ele apontou para si próprio – é tudo de belo que tenho. Por dentro estou estragado. Sou uma mistura de sentimentos ruins.
Marlon balançou enfaticamente a cabeça, negando.
- Pense, Marlon: quantas vezes já parou para pensar no quanto sou gentil, ou simpático, ou sensível, ou amável, ou caridoso, ou esforçado, ou qualquer outra coisa de real valor para qualquer pessoa? – Thierry deixou seus braços abertos caírem ao lado de seu corpo como que reconhecendo sua derrota. – Sou feio por dentro e não demorará muito para que perceba e resolva distanciar-se de mim também.
Ele deitou-se no chão fazendo com que várias folhas secas saíssem voando ao seu redor e, depois de um breve momento de hesitação, Marlon acomodou-se, de lado, próximo a ele, apoiando-se com o antebraço na terra para ter uma visão melhor dos olhos fechados de Thierry.
- É uma pena ver o quanto me subestima, senhor Laforet. – ele inclinou-se sobre Thierry e deposito-lhe um beijo na ponta do nariz. Thierry comprimiu as sobrancelhas com a surpresa. – Não sei se o senhor sabe, mas acredito que existam dois tipos de beleza: a óbvia e a relativa. – um beijo na bochecha. – Por exemplo, é tão obvio que Jacques e sua filha são boas pessoas quanto que o senhor é de uma beleza de natureza extremamente... Como posso dizer...? – Thierry abriu os olhos para encará-lo, esperando ansiosamente pela palavra. – Pecaminosa.
O beijo que Marlon deu-lhe na boca demorou-se muito mais do que os anteriores. Thierry não retribuiu. Dedicou-se apenas ao deleite de finalmente sentir algo que não fosse raiva do mundo ao seu redor.
- Entretanto, existe a beleza relativa. – disse ele, afastando seus lábios do de Thierry, porém, permanecendo com seu rosto próximo ao dele. – E ela é visível apenas para olhos completamente apaixonados como os meus.
- E o que ele veem? – Thierry tentou ignorar a palavra “apaixonados”, mas sempre que Marlon a pronunciava algo dentro ele, provavelmente seu coração, pulsava loucamente. 
- Uma pessoa completamente capaz de enxergar seus defeitos e que não tem vergonha em assumi-los para mim mesmo tendo medo de que a abandone. – Thierry abriu a boca para explicar para Marlon que não sentia medo, mas logo a fechou. Ele não tinha tanta certeza quanto a nada, agora. – Vejo alguém que falha miseravelmente em fingir ser o que não é e que não percebe o quanto seu sarcasmo me diverte. – Thierry nunca entenderia a mania de Marlon de rir do que ele dizia mesmo que não fosse uma piada. – Também vejo uma pessoa que, por rir com tão pouca frequência, transformou seu sorriso em uma joia preciosa que, quando surge, é tão bela quanto qualquer evento raro pode ser.
- O meu sorriso é algo externo. – observou ele, já perdendo a fé nos argumentos de Marlon.
- Então vamos reformular do seguinte modo: eu amo quando sei que sou o motivo de você estar sorrindo.
- Ama? – a pergunta saiu baixa e com uma pontada de incredibilidade.
Marlon riu.
- Amo. Eu o amo, Thierry. Estou surpreso que ainda não houvesse percebido isso.
- Eu... – Thierry tentou falar, mas sentiu o dedo de Marlon selar-lhe a boca.
- Por favor, não diga nada. Não quero que me diga isso por sentir-se na obrigação de retribuir. O meu amor não é moeda de troca. O estou dando para você. Só me diga quando e se sentir-se pronto para isso, certo?
Thierry concordou com a cabeça e puxou Marlon para um abraço. Estava surpreso consigo mesmo por conseguir tal ato de afeto com tanta naturalidade.
- Volte para junto de Jacques. – pediu Marlon. – Pode fazer isso por mim?
Thierry mordeu o próprio lábio para ter onde descontar sua frustração.
- Posso.

O Mundo Que As Sombras EscondemOnde histórias criam vida. Descubra agora