Les Trois Frères

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Nicole bateu mais uma vez na porta do quarto de Thierry. Ele reprimiu um suspiro. Já estava cansado de ter sua irmã batendo na porta de hora em hora apenas para ver se ele estava respirando direito. O senhor Laforet já havia saído para a cidade sem acordar o filho. Queria que este descansasse mais um pouco antes de voltar à ativa.


- Meu coração esta batendo, meus olhos estão piscando e estou respirando regularmente. Não me esqueci de repetir o processo nem por um segundo desde a última vez que você saiu. - resmungou ele, o seu corpo completamente escondido sob o lençol.


- Sabe, meu irmão, às vezes tenho a impressão de que é propositalmente desagradável. - comentou Nicole enquanto encostava as costas de sua mão à testa de Thierry para verificar sua temperatura.


- Apenas às vezes?


- Sei que a amabilidade nunca foi uma de suas qualidades, mas o que lhe custava fingir um pouco de simpatia pela pessoa que está cuidando de você?


- Ser simpático é maçante. Prefiro ser eu mesmo. Assim não preciso perder tempo gastando energia com trivialidades estapafúrdias como a simpatia.


- Sua franqueza é admirável, mas não compensa o modo como trata as pessoas.


- Ainda bem que este nunca tenha sido o objetivo dela.


Nicole abafou um sorriso. Thierry não entendeu o que o havia causado. Ele não estava tentando ser engraçado. Ele nunca tentava ser engraçado para outras pessoas.


- Lembra quando você me contava histórias de terror antes de dormirmos? - Nicole mudou bruscamente de assunto.


- Quando eu fazia você chorar e a Violeta saía correndo atrás de mim pela casa? É meio difícil esquecer.


- Eu nunca conseguia dormir depois daquilo, mas sempre caía na gargalhada quando via você e Violeta correndo pelos corredores e gritando.


- Era por isso que sempre me deixava terminá-las mesmo tremendo de medo?


- Por isso e também porque eu adorava os nomes horrorosos que você escolhia para os personagens. Cabeçudo, Nariz de Porco, Banguelo, Melequento...


- Nunca fui uma criança muito criativa. - assumiu Thierry dando de ombros. - Mas convenhamos que os nomes são meros auxiliares para identificação dos personagens. Não possuem qualquer relevância para o desenrolar da história. Elaborá-los era uma enorme perda de tempo.


- Pois saiba que eles possuíam grande relevância para mim. - assumiu Nicole. - Eu adorava quando parava para contar-me histórias, pois era o único momento em que eu recebia sua atenção.


Thierry fitou-a com surpresa. O que Nicole diria se soubesse que o único motivo para que ele lhe contasse histórias fosse o de fazê-la chorar encolhida em sua cama?


- Depois que perdi a mamãe, eu tive a Violeta para cuidar de mim, mas eu queria ter um pouco de você também. Aqueles momentos eram tudo o que eu tinha do meu irmão e, quando eles acabaram, fiquei sem nada. - ela aproximou-se de Thierry, afastando afavelmente a mecha de cabelo dourado que estava presa contra o rosto dele. Thierry aproveitou para olhar para o rosto da irmã.


O senhor Laforet costumava dizer que Nicole era a versão feminina de Thierry. Eles tinham o mesmo tom de dourado no cabelo, o mesmo nariz, os mesmos lábios finos e rosados, o mesmo sinal marrom e minúsculo embaixo do olho direito e o mesmo formato das sobrancelhas e dos olhos. Violeta disse uma vez que poderia provar que eles tinham o mesmo sorriso se Thierry ousasse rir com mais frequência. Ou melhor, com alguma frequência.


A principal diferença deles, tirando as que haviam sido geradas pela diferença de gênero, estava na cor dos olhos. Enquanto os de Thierry eram negros, os de Nicole tinham o mesmo tom azulado dos de Violeta.


O mesmo sentimento que havia atormentado Thierry após o casamento da irmã, voltou sem aviso e ele sentiu um vazio no ambiente.


- Onde está Violeta? - ele perguntou, esforçando-se para não demonstrar todo o interesse que sentia pelo paradeiro da irmã. - Receberam alguma notícia dela?


- Nada desde o casamento. - respondeu Nicole, parecendo um tanto aborrecida por a conversa ter saído do foco que almejava. - Papai está preocupado, mas tenta não entrar em desespero. O próprio Émile falou que seria difícil entrar em contato com outras pessoas enquanto estivessem viajando. - ela suspirou. - Bom, o que importa é que Violeta esteja feliz.


Thierry concordou com um aceno de cabeça forçado.


- O senhor Marlon está lá fora esperando por você. - ela avisou sem esconder o sorriso de satisfação.


- E quando pretendia avisar-me? - Thierry deu um salto na cama, mas, logo depois, começou a andar mais devagar para disfarçar a euforia. Ele achou melhor fingir que não havia visto os olhos da irmã brilhando ao pronunciar o nome de Marlon. - É falta de educação deixar a visita esperando.


- Mas você acabou de dizer que não se importava. Pensei que não seria diferente com Marlon.


- O senhor Marlon salvou minha vida, Nicole. - disse Thierry enquanto a empurrava com o máximo de delicadeza para fora do seu quarto. Jamais assumiria, mas estava levemente comovido com a conversa que haviam tido. - Por que não o distrai com um de seus chás terríveis enquanto troco minha roupa?


- Agora tenho certeza de que você é propositalmente desagradável, Thierry. - reclamou ela. Thierry, contudo, não a ouviu, pois havia acabado de fechar a porta de seu quarto com um poderoso estrondo.


O Mundo Que As Sombras EscondemOnde histórias criam vida. Descubra agora