Le Jacques

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A carruagem tremeu ao passar por uma estrada quase fazendo com que Marlon batesse com a cabeça em seu teto. Thierry estava sentado bem a sua frente, voltado para ele, mas com o olhar perdido na paisagem que se transformava ao seu redor. Aproveitando um momento de menor turbulência, Marlon sentou-se bem ao lado dele.


Thierry fingiu não perceber e permaneceu com os olhos fixos no borrão de cores através da janela. Marlon aproveitou sua distração para deslizar sua mão até a dele, mas Thierry afastou a própria assim que sentiu a de Marlon.


- O que foi? - ele perguntou, aborrecido.


- Não acho que seja um bom momento. - respondeu sem sequer voltar-se para ele.


- Por causa do cocheiro? Ele não pode nos ver aqui dentro.


- Mesmo assim prefiro ser mais cuidadoso. Não podemos correr o risco de que alguém nos veja desse modo.


- Mas eu apenas queria... - tentou novamente tocar a mão de Thierry e este a afastou mais uma vez. - Não faça isso comigo. Passei o dia todo sonhando em tocá-lo novamente.


Thierry levou o indicador aos lábios, pedindo silêncio. Marlon desistiu de qualquer contato e voltou para o seu lugar anterior onde fechou os olhos e preocupou-se apenas em identificar os cheiros que entravam pela janela que Thierry considerava tão mais interessante que ele até finalmente adormecer do melhor modo de que foi capaz com todo aquele chacoalhar.


Aproveitando o momento de quietude plena, Thierry volta toda sua atenção para o rosto adormecido a sua frente do qual não tira os olhos até a carruagem parar em seu destino alguns minutos depois.


- Senhor Marlon? - chamou Thierry.


Marlon abriu os olhos de modo súbito, mas fechou logo ao perceber o sol forte que estava sobre seu rosto.


- Chegamos ao seu destino. Não vai descer?


- Já o disse o quanto detesto quando me chama de senhor? - perguntou Marlon, escondendo os olhos da claridade com a curva do braço.


- Já o disse que isso pouco me importa? Temos aparências a zelar, senhor. - sussurrou Thierry próximo ao ouvido dele antes de se afastar para abrir a porta e descer da carruagem. Marlon saiu logo atrás dele.


Estavam em frente a uma estalagem que oferecia acomodações, bebidas e alimentos para viajantes. Logo atrás dela havia um estreito caminho de terra batida que levava para o interior de um matagal desmatado que se estendia até uma floresta fechada que explodia em cores verdes, marrons e amarelas. Thierry perguntou-se qual era o motivo da grande fixação de Marlon por florestas distantes e cerradas.


Um homem com uma barba tão comprida que lhe chegava à altura do umbigo abriu a porta da estalagem e logo chamou Marlon pelo nome.


- Há quanto tempo, Jacques. - saudou-o Marlon, estendendo a mão para o homem. - Thierry, este é Jacques, um velho amigo de meu pai.


Jacques estendeu sua mão suja de terra para Thierry que a olhou por um longo momento antes de, relutantemente, resolver aceitá-la. Jacques parecia nunca ter sido apresentado a uma banheira e exalava um cheiro forte de suor e cachorro molhado. O seu cabelo, quase tão comprido quanto a barba, emaranhava-se a ela e varias folhas secas estavam presas por toda a parte em seu corpo cheio de pelos.


Thierry aproveitou um momento de distração do homem para esfregar sua mão na lateral da calça enquanto seu cocheiro, o qual Thierry nunca sequer preocupou-se em perguntar o nome, prudentemente, apenas fazia uma breve mesura para Jacques do outro lado da recepção.

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