A lua era a única iluminação impedindo o local de mergulhar na profunda escuridão da noite, mas isso não fazia a menor diferença para Marlon. Sua visão noturna seria impecável até no mais profundo breu, porém, nem mesmo ela estava sendo capaz de identificar qualquer sinal da presença de Henry aquela noite.
- Vamos logo com isso, vampiro. Sei que está aí. - sussurrou Marlon para nenhum lugar em específico. Ele sabia que Henry estava lá mesmo não sentindo mais o cheiro de sangue fresco.
- Pensei que esperaria todos dormirem. - respondeu Henry, surgindo num piscar de olhos ao seu lado. - Ainda há a chama de uma vela iluminando a frente da casa.
Antes de respondê-lo, Marlon abriu a porta dos fundos, onde estava com o obro apoiado, para conferir se não havia ninguém por trás dela escutando a conversa. Ao certificar-se de que estava tudo vazio ali, tornou a fechá-la.
- Ele sofre de insônia crônica. - Marlon não se preocupou explicar-se. Tinha certeza de que Henry já sabia de quem falava. - Os Jacques estão cuidando dele. - acrescentou, a fim de deixar claro para o vampiro que Thierry não estava sozinho. Henry não pensaria duas vezes antes de aproveitar-se de tal vulnerabilidade.
- Os dois sabem sobre nós? - perguntou ele, surpreendendo Marlon.
- Tudo que sabem sobre você é que se aproveitou da confiança de meu pai para beber meu sangue. Jaques o mataria se soubesse que está aqui comigo.
Henry gargalhou mais alto do que era prudente para a ocasião. Jacques nunca foi do tipo capaz de meter-lhe medo.
- É incrível como as pessoas tiram conclusões precipitadas baseadas em mentiras.
- Não é uma mentira. - ralhou o lobisomem.
- Mas não é toda a verdade e sabe bem disso. Pensei que lobisomens não guardassem segredos um dos outros. - Henry sorriu de modo cruel. - Mas eu não deveria estar surpreso, deveria? Você, por exemplo, passou a vida toda escondendo de todos que gostava de ho...
- Cale-se, vampiro! - o tom de Marlon era ameaçador mesmo sendo muito baixo. - Por que não pega seu pagamento de uma vez e vai logo embora? - disse, estendendo o pulso.
Para estranhamento de Marlon, Henry hesitou. Não parecia minimamente interessado nas veias grossas que traçavam o antebraço do lobisomem como as linhas de um mapa. Pelo contrário. Ele as olhava com uma completa indiferença pouco habitual.
Quando Marlon fez menção de recolher o braço, Henry o segurou com força e o aproximou da boca, mas não o mordeu. Ficou apenas roçando suavemente os lábios e a ponta do nariz pela pele exposta do pulso.
- Terei que deixar para outro dia, infelizmente. Já me alimentei hoje. - falou sem afastar-se do aroma delicioso que o invadia.
- Senti o cheiro, mas ainda pensei que não recusaria. Você nunca recusa.
- Não estou recusando. - retificou. - Estou adiando. Voltarei para cobrar.
- Faça como quiser, contanto que seja discreto. - disse Marlon, puxando o braço de volta e ajeitando a manga da camisa sobre ele. - Não quero que meu pai saiba que voltei a encontrá-lo.
- Serei extremamente discreto. - Henry virou-se para ir embora, mas, como se houvesse acabado de ocorrer-lhe algo, girou nos calcanhares e voltou-se novamente para Marlon. - Não está interessado em saber quem foi?
- Sei que foi o Gama. - suspirou. - Não posso dizer que passarei a noite em claro com o luto.
- Eu não disse que o matei.
- Não precisava dizer. Nem todos os lobisomens estão dispostos a oferecer seu sangue por livre e espontânea vontade para você como eu. Muito menos um como aquele.
- Você ficaria surpreso, Marlon. De qualquer modo, não recusaria umas gotinhas de sangue humano como sobremesa.
- Não ouse aproximar-se dele, ouviu? - rosnou Marlon ao perceber a ameaça. - Saia daqui, vampiro! Se não quer meu sangue agora, não temos mais o que discutir.
Henry assentiu e saiu caminhando lentamente em direção às árvores até sumir completamente por trás de seus troncos sem deixar qualquer vestígio de que estivera ali.
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O Mundo Que As Sombras Escondem
FantasiO mundo está longe de ser como você imagina. Não significa que porque você nunca viu algo que ele necessariamente não exista. Sou a prova viva disso. Mas vamos ao que realmente interessa, pois esta história não se trata apenas de um mundo do q...