Crises

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Pela manhã fiz uns ovos mexidos enquanto passava um café fresquinho, Letícia estava tomando banho, ainda não expus minha vontade de que ela deixasse o trabalho, não tivemos tempo de conversar depois do acontecido, eu não quero impedir que ela trabalhe, só não quero que ela continue a trabalhar na biblioteca, é desconcertante saber que Erick pode continuar investindo.

Ela apareceu maquiada e vestida para o trabalho, observei-a e não disse nada, conversaremos em outro momento.

— Bom dia, você vai sair agora?
— Vou te deixar no trabalho. — Respondi.
— Vão vir deixar minhas coisas, você volta logo?
— Sim.

Tomamos café da manhã e eu fui buscar minhas chaves, saímos e parei em frente à biblioteca e a olhei, Erick desceu do carro encarando-a, Letícia devolveu o olhar com certo nervosismo.

— Você não precisa ir se não quiser. — Ela me olhou e sorriu.
— Eu sei, obrigada. — Disse ela me abraçando e desceu do carro.

Uma espécie de angústia me corroía por dentro, será que ela pode ter se envolvido demais com Erick? Ela estava nervosa, seria normal? Tantas dúvidas... minha vontade era entrar e buscá-la, e levá-la de volta para casa.

*

Letícia:

O olhar do Erick me gelou por inteira, eu me sentia culpada em ter alimentado um sentimento que não existia, eu sentia um carinho enorme por ele, uma admiração incrível mas apenas isso, eu me sentia como se estivesse brincando com os sentimentos dele, e isso não era justo com ninguém.

Uma funcionária faltou e eu fui organizar uns livros que chegaram, peguei uma escada de madeira e a posicionei, fui organizando por ordem alfabética e quando terminei percebi que Erick estava me observando de longe, comecei a suar frio e minhas mãos estavam trêmulas.

Me abaixei e peguei as caixas de papelão vazias e levei-as para o depósito, antes mesmo de me virar percebi que ele estava atrás de mim.

— Precisamos conversar. — Sua voz era dura e cheia de mágoa.
— Tudo bem.

Ele caminhou até a sala dele e eu fui logo atrás em passos lentos. Sua sala foi onde transamos tantas vezes, eu me sentia nesse momento deslocada.

Ele se sentou na cadeira e me encarou  por trás da grande mesa preta brilhante, minhas mãos suavam frio, seu semblante era duro e tenso, eu sentia meus ombros pesarem e uma tensão cortante em todo ambiente.

Ele ajeitou o paletó e me olhou nos olhos.

— Então você decidiu no último instante que não queria mais se casar... você teve mais de um mês, Letícia, planejei tudo como você pediu, o que faltou? Me fala, eu preciso entender o que eu fiz de errado, eu devo ser muito filho da puta mesmo pra ter passado por toda aquela humilhação na frente de todas as pessoas importantes para mim. — Eu não sabia o que dizer, ele estava furioso.
— Desculpa Erick.
— Desculpa... claro, é tudo o que tem a dizer, não é mesmo? Eu dei tudo de mim por você Letícia, e o que fez? Aceitou se casar e desistiu na pior hora. Quis me humilhar, não foi?
— Não Erick, não diga bobagem.
— Você não passa de uma fingida Letícia, eu me sinto um grande otario por ter pedido você em casamento, você fingia orgasmo também?
— Erick...

Ele se levantou e se aproximou de mim sentando-se na mesa de frente para mim, nossos joelhos se tocavam.

— Você fingia orgasmo?
— Por Deus, Erick, não.

Ele passou a mão pelos cabelos perfeitamente alinhados e seu olhar era triste, eu me sentia culpada por tudo, me levantei e o abracei, ele tentou me evitar mas correspondeu.

— Me perdoe Erick, olhe para mim. — Ele me encarou enquanto eu segurava suas mãos fortes.

— Eu me casaria com você Erick sem dúvidas e por isso aceitei, eu sei quem você é, e o quanto maravilhoso você seria como meu esposo, mas não é justo entende? Eu não amo você, provavelmente eu não te faria feliz, eu não seria feliz e isso iria refletir em nossa relação. Eu desejo muito que você encontre alguém, e que essa pessoa cuide de você e te faça feliz como eu não sou capaz.
— Letícia...
— Me deixe terminar... eu assumo minha culpa, eu fui irresponsável e egoísta, eu não pensei em você, ter o mínimo de mim não é justo com você, você precisa de uma mulher completamente sua, eu juro que queria te amar Erick, seria muito mais fácil, mas as coisas não são assim, eu entendo que pode me odiar, e pode não querer me ver nunca mais, você pode me demitir inclusive, eu não ficarei chateada, ao contrário, eu te entendo em qualquer decisão que você venha a tomar.
— Não vou demiti-la, não tenho motivos pra isso.
— Tudo bem, admito que gosto muito do que faço.
— Você é tão importante para mim, Letícia. — Disse ele me puxando para si e me abraçando, eu correspondi. — Me desculpe se perdi a cabeça, não queria ser grosso com você.
— Está tudo bem Erick, eu te entendo.
— Eu vou viajar por uns dias, quero que cuide da loja, ok? Confio muito em você.
— Está bem, conte comigo, prometo nunca mais te decepcionar.

Nos abraçamos e saí, me senti muito aliviada em ter esclarecido as coisas com ele, Erick é um cara excepcional.

Estava anexando umas notas quando Erick apareceu na minha frente novamente.

— Já vou indo, não devo voltar mais essa semana, qualquer coisa me ligue.
— Está bem, boa viagem.
— Obrigada. Ah... não esqueça de me passar diariamente o faturamento.
— Sim, pode deixar.

Ele se foi e terminei de fazer as coisas, Suzane viria me buscar para almoçarmos, não demorou muito e ela me ligou e desci.

— O que quer almoçar? — Perguntou ela me olhando.
— Uma massa, o que acha?
— Ok.

Suzane estava séria e pensativa, ela sem dúvidas estava enciumada por eu ainda estar vendo Erick, mas não tem como evitar, ele é meu chefe.

Chegamos no restaurante e pedi um Nhoque e ela pediu um talharim, o vinho chegou e tomei uma taça.

— Tudo bem no trabalho? -Perguntou- ela me analisando.
— Sim. — Respondi, o garçom servia meu prato e o dela e se retirou.
— Letícia, quero que peça demissão. — Eu respirei fundo e tomei um gole de vinho pra ajudar a comida e a frase descer.
— Desculpa Suzane, mas nosso contrato tem uma cláusula que define submissão apenas na cama, eu gosto do meu trabalho e não tenho a intenção de sair. — Ela me olhou visivelmente irritada.
— Então nossa relação é uma porra de um contrato?
— Suzane... aqui não é o local para discutirmos isso.
— Responda.
— Quero dizer que com ou sem contrato eu não vou deixar de trabalhar.
— Não precisa deixar de trabalhar, você pode fazer qualquer coisa, em qualquer outra empresa.
— Eu já disse que não vou pedir demissão.
— Por ele? Quer ficar perto dele? É isso? — Meu sangue começava a esquentar.
— Eu nem devia te responder sobre isso, mas só pra te lembrar, se eu estivesse interessada no Erick eu estaria casada hoje mesmo com ele.

Ela tomou todo o vinho que restava e não voltou a falar mais comigo, quando terminei de comer ela pediu a conta e se levantou, entrei no carro e ela me deixou no trabalho novamente, eu estava magoada e não daria o braço a torcer, ela também não pelo visto.

O mistério de Ágata Onde histórias criam vida. Descubra agora