6 - Ataque

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Sem acender as luzes, me joguei no sofá. Como é que você conseguiu ficar com uma garota dessas, Gael? Com o corpo largado de qualquer jeito sobre o móvel, me senti cansado. Cansado de sempre fazer a coisa errada. Alma tinha acabado de passar por poucas e boas por minha causa, em outro mundo. Não era difícil para mim, fazer o que ela queria, principalmente porque ela me pedia muito pouco. Era demais o que ela estava me pedindo? Namorar em segredo? Não, não era. Mas eu dei ouvidos a ela? Não, não dei. É obvio que não! Sempre dando uma fora, não é mesmo, Gael Ávila?!

Coloquei a vida dela em risco, arrastei aquela garota para dentro do meu mundo e a envolvi numa rede de perigos, sem analisar quais seriam as consequências. E por que foi que eu fiz isso? Porque eu queria. Queria mais do que qualquer coisa na vida, ficar perto dela. Um desejo com a força vigorosa de uma necessidade. Ainda não me perdoo por tê-la levado comigo para aquela floresta. Por sorte, muita, muita sorte, as coisas acabaram bem, mas isso não significa que eu não seja irresponsável e inconsequente.

E olha só pra mim agora. Sentado aqui no meu sofá enquanto ela enfrenta a família por minha causa. Como se ela já não tivesse enfrentado muito mais do que precisava — muito mais do que deveria! —, por minha causa. Eu deveria ter deixado Alma resolver as coisas do jeito dela. E mais uma vez, por que foi que eu não fiz isso? Porque sou egoísta. Mais uma vez, fiz aquilo que eu queria. Eu teria muita sorte se ela nunca acordasse lúcida de manhã e percebesse o traste com quem namorava. E se isso acontecesse e Alma te desse um belo de um pé na bunda, seria bem merecido, Gael, seu idiota.

Uma batida vigorosa na porta me tirou de meu mundo particular. Eu não precisava ter esperanças, não seria a bela dama de pele macia e cabelos viçosos que eu encontraria do outro lado. Levantei-me, acendi a luz e abri a porta. O homem entrou sem esperar convite e vasculhou o ambiente em volta com o olhar. Talvez procurando algum sinal de que a filha tivesse estado ali. Uma peça de roupa seria o suficiente para ele me matar. Não vai encontrar.

— Gostaria de se sentar, senhor? — fechei a porta e indiquei o sofá.

— Serei breve. — disse com uma última sondada.

Não sei dizer se ele ficou feliz ou não com o que encontrou ou deixou de encontrar por lá. Henrique olhou diretamente para mim antes de continuar.

— Quero que deixe a minha filha em paz. Pare de encher a cabeça dela com baboseiras que não pode cumprir.

Espere um pouco aí. Posso não ser muito bom em cumprir promessas, admito, mas... pretendo cumprir todas as que fizer a ela, então... não sei do que ele está falando.

— Desculpe, mas não sei do que o senhor está falando. Nunca fiz uma promessa à sua filha que não tivesse a intenção de cumprir.

— Estou falando de rapazinhos cheios de graça, como você, que não sabem nada da vida e ficam iludindo garotas decentes com promessas vazias de amor e depois se mandam, deixando para trás um coração em estilhaços.

Então era esse o problema.

— Percebo que esse seja o ponto de vista de um pai que se preocupa com o bem estar de uma filha e isso é muito louvável. Fica óbvio para mim, que a moça foi agraciada com um pai que a ama imensamente. Nem todos podem desfrutar desse privilégio — perguntei-me como seria ter um pai. —, mas posso assegurar-lhe que o sentimento dela pelo senhor é recíproco e...

— Bajulação?! — ele quase riu na minha cara. — É o melhor que pode fazer?

— Eu só queria mencionar que as reações do senhor, bem como suas opiniões, são muito importantes para ela, em virtude, exatamente de sua filha amá-lo tanto, o que significa que com facilidade pode machucar o coração dela. — já que estamos falando sobre deixar corações em estilhaços! — Como hoje, por exemplo. Choca-me, que não tenha percebido a dor na voz dela. — o tom de acusação da última frase saiu mais evidente do que eu gostaria.

Tempo Quebrado | 2Onde histórias criam vida. Descubra agora