Cheguei correndo ao hospital. A esperança pulsando cheia de vida dentro do coração. Eu precisava contar para ela. Omitiria a parte perigosa, é claro. Alma só precisava confiar que tudo daria certo e tudo ficaria bem. Tinha um jeito de salvá-la. O único jeito. Eu não falharia. Não quando é a vida dela em jogo.
Natan se levantou quando me viu e ficou parado no meio da sala de espera com os braços cruzados e uma cara feia enquanto a recepcionista liberava a minha subida. Eu conversaria com ele depois, agora precisava ouvir a voz dela.
— Você não pode subir. — o caçador barrou o meu caminho.
— Agora não, Natan. — não consegui dar a volta por ele. — Eu disse ago...
— Ela está em coma. — ele disparou.
Coma?
Não. Não, não, não, não.
— Do que você está falando? — balbuciei.
— Os médicos estão lá no quarto com os pais dela agora, você não vai poder entrar. Eu acabei de descer.
— Mas é claro que eu vou poder entrar! — as pessoas olharam a fonte do barulho. Provavelmente devo ter gritado.
— Você precisa saber. — os olhos eram pesarosos. Ainda não tinha vindo a pior parte. — Ela começou a apresentar falhas cerebrais. Os médicos acabaram de anunciar que parte do cérebro foi comprometido. Eu sinto muito, Gael.
Não. Isso não está acontecendo. Não está. O que ele quer dizer com isso? Que ela já está morta? O cérebro dela morreu e só o corpo continua funcionando com os aparelhos? Isso não pode ser. Alma não está morta. Eu sei disso porque ainda estou respirando. Alma não está morta. Isso... isso não está acontecendo. Os meus joelhos fraquejaram. Não conseguia mais me manter de pé. Não te ar aqui. Para onde foi o ar? Isso não está acontecendo. Não está. Eu posso salvá-la. Alma tem que viver. Ela precisa sobreviver.
Senti o meu peso sendo arrastado. Isso não está acontecendo. As pessoas estavam falando à minha volta. Isso não está acontecendo. Eu não entendia o que elas diziam. Isso não está acontecendo. Isso não está acontecendo. Isso não está acontecendo. Isso não está acontecendo. Isso não está acontecendo! ISSO NÃO ESTÁ ACONTECENDO!
— Está tudo bem. Ele vai ficar bem. Está com os olhos abertos, não desmaiou, só está em choque. Ele vai ficar bem. — Elisa enxotava algumas enfermeiras que tentavam me socorrer. — Podem se dedicar a pacientes verdadeiros. Eu sei lidar com ele. Isso. Podem ir. Tenho, tenho certeza sim. Tchau.
Ela se abaixou à minha frente. Eu estava sentado em uma cadeira. Como fui para lá? Natan estava de pé ao lado dela.
— Gael? Está me ouvindo? — Elisa perguntou.
Estou.
— Gael? Gael!
O que?
— Tem certeza que ele está respirando? — Natan perguntou.
— Tenho. — ela colocou os dedos próximos ao meu nariz. — Gael? Está me ouvindo? — repetiu.
Estou.
— Ele nem pisca. — Elisa balançou a mão diante do meu rosto.
— Devemos jogar água na cara dele? — o rapaz perguntou. — Funciona nos filmes.
— Ah, não. Não precisamos dessas frescuras. — ela dispensou na hora.
Ouvi o som antes de sentir o ardor na pele do rosto. Elisa me deu um tapa bem dado e com vontade.
— Merda! — esfreguei a mão no rosto. — Elisa!
— Viu. — ela falou com Natan, se levantando. — Às vezes ele emperra, mas volta a funcionar com um bom tranco.
Levantei-me num rompante. A urgência me sufocando. O meu raciocínio voltou à realidade. Eu tinha me perdido no meio do caminho entre a morte e a insanidade absoluta.
— Ela não está morta! Não está! Ouviu? Está me ouvindo agora? — Elisa falava para mim.
— Não... não está? — perguntei. Precisava ouvir de novo para ter certeza que a minha audição não estava me pregando uma peça. A loucura e a demência estavam jogando comigo um jogo infantil de esconde-esconde.
— Não, não está, mas está em coma. Em coma, não morta. Está ligada a aparelhos. Ouça com atenção. Não surte, preciso de você lúcido. — a moça me olhava com firmeza. — Ela foi induzida ao coma, os médicos acham que talvez possa ajudar, eles estão tentando impedir uma morte cerebral. Mas ela ainda está viva, o coração dela está batendo e ela está respirando. Isso é tudo o que importa. Desde que os aparelhos continuem fazendo o trabalho deles, o plano segue sem alterações. Entendeu o que eu disse?
— Entendi. — respondi com um vestígio de esperança. Ainda dava para salvá-la.
— Ótimo. Agora entre, suba lá e faça os pais dela prometerem que haja o inferno que houver, ninguém vai desligar aqueles malditos aparelhos até a gente voltar.
Elisa não precisaria mandar outra vez.
Já ao lado da Alma, observei-a. As pessoas mal podiam tocar nela. Minha Alma. As marcas arroxeadas no braço sugeriam que havia sido espancada com violência, mas na verdade, a menor pressão sobre sua pele lhe deixava hematomas horrorosos que me impediam de respirar. Era muito difícil não sufocar por completo. Eu tinha a sensação de que seria mais fácil respirar em baixo d'água. O ar tinha se solidificado dentro dos meus pulmões. Blocos de concreto. A ponta do meu nariz quase não tocava as costas de sua mão. A pele dela não emanava mais o cheiro doce de flor. Pétalas macias e sedosas lavadas no frescor da chuva. A magia morreu. Eu estava morrendo. A minha alma morreria junto com a dela.
O amor machucava e podia ser extremamente duro e doloroso algumas vezes, mas foi a maior lição que aprendi com ela. Amar. Eu precisava ter fé. Precisava acreditar que as coisas iriam dar certo. Ela iria melhorar. Nós já tínhamos realizado o impossível antes. Não podia me render ao desespero. Era a última chance dela. A minha última chance. A última esperança de remendar a minha alma.
Não sabia se voltaria a vê-la de novo. A minha menina linda. Se alguma coisa desse errado e os meus olhos não pudessem beijá-la novamente, tudo teria valido a pena. Eu jamais me arrependeria de ter estado com ela. Ela era a melhor coisa na minha vida. O meu tudo.
— Você é o meu sonho tatuado em um retrato.
Deslizei a fotografia, retirada do álbum que Alma tinha preparado para mim, cuidadosamente para baixo dos seus dedos. Os meus lábios sussurraram uma prece de encontro à sua pele frágil:
— Espere por mim até nossos olhos se encontrarem outra vez. Espere por mim, Alma. Espere por mim até eu voltar para casa.
Olá amados!Fiquei devendo um encontro pra vcs estão vamos lá!
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Tempo Quebrado | 2
RomanceA maçã tem o gosto do pecado... e a cor do sangue. Gael Ávila e Alma Ferraz conquistaram o direito à liberdade e ao amor que nasceu como um fruto proibido. Mas um romance assim, sempre cobra o seu preço! Uma decisão foi tomada, um sacrifício foi fei...