35 - Armadilha

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Não foi um trajeto longo desse ponto em diante, mas foi eterno! Nunca mais saíamos daquele buraco! Ver a luz do dia entrando pela fresta do final foi o melhor consolo que poderiam me dar naquela hora. Eu já estava prometendo mentalmente fazer um regime quando chegasse em casa.

Arrastei-me com esforço para fora daquele buraco minúsculo, — não, aquilo não pode ser chamado de buraco. Fresta, fissura, ranhura, linha quase invisível na parede! —, e a luz quente do sol banhou o meu espírito. Nos encontrávamos numa ampla sala com o teto aberto e — mais um! — longo corredor adiante. A liberdade sorriu pra mim do céu. Abrir as asas e levantar voo em direção ao teto foi uma sensação maravilhosa de libertação. Nada, absolutamente nada me tocando além da luz e do ar. Indescritível.

— Talvez possamos seguir pelo lado de fora. — falei para o grupo lá em baixo e dei com tudo no manto azul acima de mim.

— O que aconteceu? — ouvi a voz de Selva.

— É uma boa pergunta. Não consigo sair. — falei tocando o teto invisível que se espalmou contra as minhas mãos.

Elisa e Natan se juntaram a mim analisando o céu azul claro e limpo.

— Mas não faz sentido. — Elisa disse franzindo a testa. — Não é como um vidro na janela. Dá pra sentir o vento e a luz entrando.

— É, mas eles estão entrando e nós estamos saindo. — Natan declarou. — Parece que os espíritos não estavam de brincadeira. Não podemos mesmo sair desse buraco.

— Então vamos seguir em frente. — disse reprimindo o pavor a me encerrar para sempre dentro de uma gaiola.

O novo corredor voltava a se encontrar totalmente fechado. O lindo céu azul sobre nossas cabeças não quis seguir viagem conosco. Saímos no topo de uma longa e larga escadaria.

— Vamos descer de novo? — Ramon resmungou. — Para onde estamos indo afinal? Para o núcleo do planeta?

— Para de chorar e anda logo. — Elisa o empurrou.

O grupo seguia à minha frente. Não fazíamos ideia de para onde estávamos indo, só sabíamos que precisávamos atravessar o templo para chegar até o povo de Shambala. Seguindo cuidadosamente e depois de termos descido dois terços dos degraus alguém pisou em falso e quase caiu.

— Esse degrau estava solto. — Selva falou se apoiando em Elisa para recuperar o equilíbrio.

Ohou! Não gostei disso. Ouvi o clique ao mesmo tempo em que empurrava todo mundo escada abaixo.

— Cuidado! — gritei.

Dois martelos imensos cravejados de longas pontas afiadas se soltaram da parede num movimento de pêndulo e se chocaram um contra o outro, quase nos entalando vivos. As minhas asas me impediram de perder o equilíbrio, mas os meus colegas não tiveram tanta sorte. Embolando-se uns nos outros eles rolaram pelos degraus até parar lá em baixo, amontoados uns sobre os outros.

— Estão todos bem? — Natan perguntou se levantando. A atenção dividida entre a equipe e o entorno que nos cercava.

Infelizmente, as respostas teriam que esperar para mais tarde, agora era hora de levantar e correr!

O chão começou a se mover, enchendo-se de rachaduras por onde lufadas de rajadas de fogo emergiam. Do teto penderam lâminas em meia lua que decepariam qualquer coisa que ousasse ficar no caminho delas. Arrastando Elisa comigo, que mal tinha se levantado, nós passamos a toda a velocidade percorrendo a câmara como um raio de luz.

Uma cortina de fogo subiu bem na minha frente e eu freei antes de dar bem de cara nela. O silvo rasante do metal afiado acima da minha cabeça vindo pelo lado direito me fez decidir antes mesmo de olhar que alguns pelos queimados eram melhores que um corpo desmembrado. Pulei dentro da chama com o braço protegendo o rosto. Foi o melhor que deu pra fazer. O ardor do calor ensandecido lambeu o meu corpo inteiro. Para minha sorte não era uma parede larga e eu a cruzei sem grandes prejuízos, ainda arrastando Elisa atrás de mim, para meu alívio, inteira!

Tempo Quebrado | 2Onde histórias criam vida. Descubra agora