16 - Tentação

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Depois do ensaio, ela tomou um banho rápido e se deitou para descansar alguns minutos. Foi a primeira vez que isso aconteceu. Alma sempre ficava uma pilha de nervos antes de subir ao palco.

Olhei a praia gloriosa do Rio pela janela do hotel. Continuava linda, mesmo escondida sob as cores da noite.

Carissimi. — ela continuava enfiada em baixo das cobertas. — Hora de acordar.

— Só mais cinco minutos. — falou sonolenta.

Eu ri. Já era a terceira vez que ela dizia isso. Abandonei a vista e me aproximei da cama.

— Você vai se atrasar assim. — falei alisando seu rosto. A pele estava fervendo. Estremeci.  — Alma? — eu a sacudi de leve. — Olha para mim. Abra os olhos.

Não obtive resposta. Ela continuava dormindo calmamente. Descobri o corpo dela e um vapor quente me atingiu com força. Ela se encolheu. A pele estava vermelha e em chamas. Ardia com uma febre abrasadora. Tentei sentá-la na cama, mas ela estava mole. Mas que droga era essa que estava acontecendo?!

— Alma? Está me ouvindo? — o desespero me estapeou.

Com o peso do corpo apoiado contra o meu braço, mal sentada sobre o colchão, a cabeça dela pendia frouxa para o lado de olhos fechados. Eu comecei a suar só de estar perto da temperatura alta dela. Levantei-a no colo e fui até o chuveiro. Abri a água numa temperatura morna. Alma não estava inconsciente como uma pessoa desmaiada, balbuciava palavras inaudíveis e ininteligíveis que eu não sabia se era resultado de falta de força ou delírio de febre.

Ela não conseguiria sustentar o peso do próprio corpo, então a coloquei em baixo dos jatos de água que caiam. A moça arfou com a temperatura batendo contra sua pele febril. O corpo todo tremia de frio no meu colo e ela apoiou o testa no meu ombro.

— Está-tá m-muito f-f-fria. — sussurrou.

— Não, não está. Está morna. E vai te fazer bem. — falei.

Pelo menos ela estava recobrando a consciência e assumindo algum controle do corpo. A água morna encharcava a nós dois da cabeça aos pés.

— Fala comigo. Olha pra mim, Alma. — a escuridão daqueles olhos começavam a apresentar sinais de lucidez. — O que está acontecendo com você? — meu coração martelava no peito.

— Talvez tenha pegado um resfriado. — a voz não passava de um sussurro.

— Resfriados, hemorragias, dores de cabeça, palidez, enjoos. Você não é uma pessoa de saúde frágil e nos últimos meses tem me feito passar por testes de cardíacos. Quase desmaiou semana passada na aula e voltou a sangrar o nariz. Alma? — olhei fundo nos olhos dela. — Está escondendo alguma coisa de mim?

Ela negou tentando descer. Não olhou para mim. Deixei as pernas dela tocarem o chão e elas ficaram firmes. Isso é bom. Segurei o maxilar dela, obrigando-a a olhar para mim. Os olhos dela escrutinaram os meus.

— Está escondendo alguma coisa de mim? — repeti.

— Não. — a resposta dessa vez veio com firmeza.

Senti um alívio instantâneo por dentro. A pele do pescoço dela ainda estava mais quente que o normal.

— Você nunca teve isso, por que agora?

— Sei lá. Stress? — ela deu de ombros, a voz tinha voltado ao normal.

— Como está se sentindo?

— Bem. A água não está mais tão fria, mas podia esquentar um pouquinho.

— Não, não, não. — falei tirando a mão dela da regulagem.

Tempo Quebrado | 2Onde histórias criam vida. Descubra agora