Capítulo Quatro - Parte 01

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Onde foi que ela se meteu? Já estava quase escuro lá fora, a chuva batia no vidro da janela e Alfonso não entendia por que Anahí ainda não tinha apa­recido. Não parecia tão cansada assim e devia ter acordado com o barulho dos trovões e da chuva.

Alfonso consultou o relógio mais uma vez. Já eram 8h30 da noite; será que ela ainda estava dormindo? Talvez estivesse esperando no quarto, lendo ou algo assim, achando que ele ia chamá-la. O que ele dissera? Não conseguia lembrar exata­mente. Será que não fora claro? Alfonso foi até a porta do quarto dela e bateu.

— Anahí?

Como não houve resposta, ele abriu a porta e sentiu um vento bater no rosto. Estranhou que uma das portas batesse quando ele entrou, e a outra estivesse escancarada, deixando a chuva entrar. Alfonso a chamou de novo, falou mais alto, mesmo assim não obteve resposta. Havia uma almofada no chão, do lado de fora, toda molhada da chuva. Ele saiu para o terraço, pegou a almofada e olhou para o lado. Ali, bem do lado, estava o terraço onde ele e Alice estiveram conversando, falando sobre Anahí.

Uma sensação de pavor tomou conta dele. Será que ela ouvira a conversa?

Talvez não. Ele voltou para dentro e fechou a porta de correr, chamou por ela mais uma vez, depois entrou no quar­to e parou. O quarto estava totalmente vazio, exceto pela caixa de areia e pelas tigelas de comida da gata. As bolsas dela não estavam mais lá, a gata se fora, Anahí se fora, e ele sabia mui­to bem o motivo. Alfonso se encostou na parede e olhou para o teto, Anahí ouvi­ra a conversa. Provavelmente estava do lado de fora, sentada na almofada e escutara tudo o que Alice dissera.

Devia ter entendido que ele era um dos construtores e pensado que a queria longe do hotel por causa da reforma. Ela não entendeu os verdadeiros motivos dele e, em vez de confrontá-lo, decidiu fugir. Que droga! Ela foi se esconder naquele anexo fedorento, como uma criminosa. E dificilmente sairia de lá agora. Mas ele tinha de tentar. Não poderia deixá-la ficar sem uma explicação, nem que precisasse pagar um hotel para que Anahí se hospedasse.

— Vou matá-la, Alice — ele falou baixinho.

Alfonso trancou a porta dos aposentos dela e correu pela casa, pegou a chave do carro, acionou o alarme e saiu. O carro dele estava do lado de fora, então ele manobrou rapidamente até o portão onde teve de esperar, com toda paciência, até que abrisse. Como será que ela passara pelo portão? Ele nem teve tem­po de mostrar a Anahí onde ficava o painel de controle, e ela também não sabia a senha. Será que ela ainda estava ali, no jardim, esperando que alguém abrisse os portões, ou será que saiu junto com Alice? Isso já tinha horas, quase cinco horas, e desde então não parou mais de chover.

Não, ela já tinha ido embora. Mesmo assim ele resolveu procurar por ela no jardim, só para ter certeza. Nem sombra dela. Ele deixou os portões abertos, para o caso de ela voltar, e dirigiu lentamente até o hotel, vasculhando as calçadas pelo caminho. Ela devia ter saído logo depois de Alice e àquela hora já estaria naquele buraco.

Ele praguejou baixinho, olhando para todos os lados atrás dela, e logo que virou a esquina ele freou bruscamente o carro. A porta estava bloqueada com tábuas de madeira! Daniel devia ter interditado o lugar assim que soube que ela não estava mais lá. Ele disse que estava preocupado com a imagem deles. Devia ter chamado um operário da obra para fechar aquele lugar. Agora não sabia mais onde procurar por ela.

Ele olhou em volta e sentiu medo por Anahí. Devia estar morrendo de frio, pois ainda era junho. Congelada, zangada, sentindo-se traída e sozinha. Sozinha, não. Tinha a gatinha. A velha gatinha que ela se negou a abandonar. Droga! Ele bateu no volante do carro e praguejou.

E agora? Danado da vida, ele teclou o número de Alice no celular.

— Anahí desapareceu. Ela deve ter ouvido a nossa conversa. Saia para procurar por ela, e eu não quero desculpas. Isso foi por culpa sua. Você apareceu na minha casa gritando, fazendo acu­sações infundadas contra uma pessoa que nem conhecia, e se alguma coisa acontecer com ela, você será a única responsável!

— Ah, Poncho! O tempo está péssimo! Onde você está agora?

— Estou em frente ao hotel. A porta do anexo foi bloque­ada. Ela não tem para onde ir, portanto, talvez tenha voltado para minha casa. Vá até lá e procure por ela no jardim. Eu olhei muito rapidamente. Deixei o portão aberto, mas a casa está trancada, então ela pode estar abrigada em algum lugar no jardim, na parte de trás, nos arbustos ou algo assim.

— Não, ela não vai estar ao relento, Poncho, não nesta tem­pestade! O tempo está péssimo!

— Sei disso, e com certeza ela também sabe, depois de quase cinco horas. Só estou com esperanças de que ela tenha voltado para a minha casa.

— É mesmo? Acha isso provável?

— Talvez não, depois de tudo o que ela ouviu, mas ela não tem muitas opções, eu acho. Faça isto, por favor, Ali, ou mande Augusto ir lá. E se não a encontrar, peguem o carro para procurá-la, e eu vou fazer o mesmo. E ligue para mim!

— Espere, não desligue! Eu nem sei como essa moça é!

Linda. Ele pigarreou antes de falar:

— Sabe sim. Uma mulher grávida carregando uma mo­chila e um gato. Duvido que encontre muitas por aí. Se algu­ma coisa de ruim acontecer a ela, eu mato você!

Ele desligou e ligou para Daniel:

— Pegue o carro e saia para procurar por Anahí. Ela desa­pareceu — ele disse, depois deu a mesma descrição que dera para Alice.

— Entendi — o amigo disse e desligou.

Anahí estava morrendo de frio. Toda molhada, ela batia os dentes, e a gatinha tremia no seu colo. A gata podia ser surda, mas ela sentia o trovão; a coitadinha estava apavorada.

As duas estavam encolhidas na porta de uma loja, a mes­ma em que Alfonso a escondeu; teria sido na véspera? Foi do outro lado do hotel onde ela estava vivendo, abrigado da chuva, mas em uma rua mais movimentada onde as pessoas que passavam olhavam para ela. Ninguém parava, preocupados em chegar em casa para se proteger da borrasca, pelo que Anahí dava graças a Deus, porque ela não queria ter de sair dali, nem ter de se explicar. Ao menos ela e a gata estavam abrigadas ali, e sentada na mo­chila ela estava quase confortável.

Sua preocupação agora era saber para onde ir, e com a gata suas opções eram ainda mais limitadas. O que ela estava pensando? Suas opções eram poucas de qualquer forma, sem dinheiro, sem amigos e com alguns ini­migos de peso.

Sem falar de Alice, que por algum motivo parecia odiá-la, mesmo sem conhecê-la. Seria por causa do marido, Augusto e por alguém chamada Cecília. Ela não pegou tudo. E quem seria Catherine? Não que isso importasse. Nada importava, a não ser encontrar um lugar seco onde pudesse se deitar.

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