Capítulo Seis - Parte 02

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— Queria algo simples, não havia muito aqui quando comprei o terreno, nem arbustos, nem árvores, exceto por umas plantas antigas ladeando o caminho e milhares de amoreiras; e o muro de arrimo nos fundos do terreno estava caindo no precipício, então a primeira coisa que fizemos foi limpar o terreno e em seguida cercá-lo todo. O muro de arrimo foi todo remodelado, então ele ficou nivelado com o gramado. Eu pretendia plantar uma cerca viva lá embaixo, no outono, para ter mais privacidade, mas Alice não achou necessário, ela acha melhor outra planta. Há um caminho para a praia, você já viu?

— Eu tentei passar, mas estava trancado.

— Precisa ficar trancado, pois a praia é pública. Não que­ro ninguém cortando caminho por aqui.

— Não, nem pensar.

— Estou sempre pensando na minha segurança. Valorizo demais a minha privacidade; acha que estou errado?

— Não, claro que não. Só não estou acostumada com coi­sas do tipo segurança e privacidade, nunca tive um lugar só meu, então me soa estranho.

— E quando estava na universidade?

— Dividia um quarto, portanto não existia privacidade. Depois fiquei com Edgar, em albergues ou dormindo na praia. Não se tem privacidade nesses lugares.

— Imagino que não.

Ele parecia que não imaginava, e ela achou que ele devia ter tido seu próprio quarto em uma mansão a vida toda, e nunca precisou dividir seu espaço tom ninguém.

E agora tinha essa casa enorme só para ele. Por quê?

— Por que construiu esta casa tão grande?

— Não sei. Gostei do terreno. Há tempos eu queria cons­truir uma casa como esta, e a oportunidade surgiu. E tinha de pensar na valorização dela, também, pois não vou ficar aqui a vida inteira.

— E por que não?

— Bem, porque é uma casa para uma família.

— Eu sei. Então por que a construiu? Só para você? Foi mesmo só como investimento, e como showroom? Foi o que você disse, mas não faz sentido.

— E precisa fazer?

— Não. Não precisa fazer sentido. Nada no mundo faz sentido.

Ele sorriu e voltou a falar sobre o jardim:

— Mandei replantar o gramado inteiro depois de colocar a instalação do aquecimento no subsolo, e agora quero algumas plantas nas laterais. Nada que atrapalhe a vista para o mar.

— Concordo com você. Imagino que não queira nada mui­to colorido. Talvez apenas algumas flores brancas, se tanto.

— Alice deu a mesma sugestão. Ela fez uns croquis, quer vê-los?

— Adoraria. — Mesmo que não simpatizasse com a moça.

Os croquis eram bem interessantes, mas era o escritório dele que a fascinava.

Era bem desarrumado e havia caixas para todo lado. Cai­xas de livros, documentos, todo tipo de coisa.

— Desculpe-me pela bagunça — ele disse ao entrar. — Embarquei todas as minhas coisas que estavam em Nova York, e ainda não tive tempo de arrumar.

Ele tirou uma caixa de cima de uma cadeira para que ela pudesse sentar e, quando a colocou no chão, uma foto voou e caiu sobre seu pé. Ela se abaixou e a entregou a ele, e viu como ficou tenso.

— Quem é Catherine?

— Não é ninguém — ele disse.

E o coração de Anahí ficou apertado por ele, sozinho em sua casa grande, sem um futuro à vista, rejeitado por uma moça chamada Catherine, de cabelos louros até a cintura.

Que mulher tola. Será que ela sabia o que teve e perdeu? Ou o que ele perdera por causa dela?

— Então, vamos ver esses croquis — ela disse, fingindo que estava interessada em outra coisa que não fosse aquele olhar triste e o corpo cheiroso.

Na manhã seguinte, a campainha tocou logo depois que Alfonso saiu para o hotel para mais uma reunião com Paulo Cauldwell.

Anahí estava se acostumando aos afazeres da casa, tentan­do descobrir como funcionava o aspirador e desistindo, quando alguém bateu à porta. Que estranho. Ela achou que, se alguém chegasse, avisa­ria pelo interfone do portão, mas ela ouviu a campainha da porta, e a única vez que tinha ouvido antes fora no domingo. E tinha sido Alice.

Por isso ela não se surpreendeu quando abriu a porta e viu uma mulher jovem, de longos cabelos escuros e ondulados, com ar preocupado. Mesmo que só a tivesse visto de costas, Anahí a teria reconhecido imediatamente, e o carro que estava parado ali era o mesmo que vira no domingo. Ela não se sentia pronta para enfrentar isso, mas então percebeu que nunca estaria pronta, então era melhor enfren­tar logo esta situação.

Depois de um instante de silêncio, Anahí resolveu falar:

— Olá, Alice, meu nome é Anahí.

Alice levou alguns segundos para responder:

— Podemos ser civilizadas ou você quer que eu vá em­bora?

— Bem, isso não depende de mim, não é mesmo? — ela disse educadamente. — Esta é a casa de Poncho, e você veio trabalhar no jardim. Tem mais direito de estar aqui do que eu.

— Na verdade, eu vim falar com você.

— Então, é melhor entrar — ela disse, e depois que Alice entrou, fechou a porta. — Aceita um café?

— Não, obrigada. Eu lhe devo minhas desculpas. Não de­via ter dito aquilo sem conhecê-la. Conheço bem meu marido e meu irmão, e eles são bons demais. São incapazes de ver o perigo diante de si e são muito vulneráveis quando o assunto é mulher. Sinto muito se você ouviu aquilo tudo. Não era pessoal.

— Nem poderia ser, pois você não me conhece — Anahí foi bem franca. — Não fiquei perturbada só com o que você disse, mas também pelo fato de Alfonso ter omitido a ligação com o hotel. Por isso, tudo que ele disse parecia ser mentira.

— Posso imaginar. Mas ele não iria mentir para você, Anahí. Ele não é assim. Ele pode lhe dizer tudo, pode até ser irritantemente teimoso, mas não mente nem trapaceia. Sinto muito se a magoei, de verdade, mas eu estava falando sério e vou repetir olhando para você — ela continuou,falando bai­xo, mas firme: — Não o magoe. Não engane, não trapaceie e não se aproveite dele, ou vai se ver comigo. Ele não mere­ce isso.

Bem, ela foi bastante clara, pensou Anahí, e de certa forma ela admirava Alice por ter tido a coragem de dizer isso olhando-a nos olhos.

— É justo. Mas posso lhe assegurar que não tenho nenhu­ma intenção de enganá-lo nem de roubá-lo. Não precisa ter receio de mim.

— Ótimo. Eu adoro o meu irmão, e ele já sofreu demais. Não quero que ele passe por isso de novo.

— Refere-se à Catherine?

Lar da Paixão (ADP)Onde histórias criam vida. Descubra agora