Olhos Cinzentos

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Pitt e Patrick conversavam na sala sobre os últimos acontecimentos doentios. Daniel não estava presente, havia deixado o local minutos antes alegando que iria pegar algo que queria que eles vissem, ou melhor, ouvissem.

- Isso está muito estranho, não faz sentido algum - Patrick ficou pensativo.
- O que não faz sentido? Posso saber? - perguntou Pitt, curiosa.
- A essa altura já era para as ruas estarem cheias de policiais, soldados, viaturas e outros automóveis do tipo. Mas não tem nada. O governo não tomou nenhuma atitude até agora.
- E se não existir mais um governo? Não sabemos até onde esse surto chegou.
- Mesmo assim, os governos dos outros estados iriam entrar em ação para que não fossem atingidos por essa doença.
- Eles podem ter tomado, Patrick. Podem muito bem ter colocado essa cidade em quarentena, certo?
- Improvável demais, mas não é impossível. De qualquer forma precisamos rezar para que isso não tenha se espalhado para as outras cidades.

- Escutem isso - Daniel retornou a sala trazendo um pequeno rádio em sua mão direita. Sentou-se no sofá e pressionou um dos botões do aparelho enquanto Pitt e Patrick aguçavam a audição para ouvir seja lá o que fosse. A principio ouviram um chiado irritante, mas logo começaram a escutar a voz de um locutor:

"Boa dia a todos os nossos ouvintes, creio que essa será a nossa última transmissão devido aos ataques bizarros que estão acontecendo pelo mun... Por todas as redes sociais só se falava nisso, antes da internet ca... Pessoas deformadas começaram a atacar outras pessoas, dilacerando suas carnes com os dentes. Tudo indica que é um vírus e que ele é transmitido através do sangue ou da saliva. Cada continente do mundo esta reportando esse tipo de acontecime.... O problema agora é global, peço que se escondam e mantenham distância máxima das pessoas infectadas. Ainda não se sabe quando Iss..."

A voz desapareceu em meio ao chiado.

- Eu gravei isso hoje - disse Daniel.
- Era uma gravação? Quando a fez? - perguntou Patrick, apreensivo.
- Hoje, as seis da manhã.
- O mundo inteiro esta assim, você ouviu Patrick? - perguntou Pitt.
- Impossível não ouvir. Como isso foi possível? Quem causou isso? - uma serie de duvidas percorreu a mente de Patrick.
- Alguém? Eu não acho que tenha um responsável. Se tivesse atingido só aqui no nosso país até poderíamos suspeitar de um ataque terrorista biológico, mas como você mesmo escutou, foi no mundo inteiro - Falou Daniel, colocando o radio no sofá.
- O que acha que pode ter sido? - perguntou Pitt a Daniel.

- Se isso é mesmo um vírus, então pode ter sido descoberto a pouco tempo e se espalhou antes da divulgação. Pode ter sido transmitido por um animal, ou inseto.
- Mas se fosse assim não teria atingido o mundo inteiro, apenas a região da descoberta - explicou Patrick, com sensatez.
- Verdade - concordou Daniel, coçando os cabelos brancos.
- E se foi realmente criado por alguém? Tipo na área 51 - disse Pitt, fazendo Patrick arregalar os olhos.
- Com certeza você é do tipo que passa horas na internet pesquisando sobre teorias da conspiração - disse Patrick, fazendo a adolescente rir.
- Não vem não, faz todo sentido - ela reclamou.
- Oh se faz.

***

Patrick enfim chegou em sua casa, a porta estava aberta e um enorme rastro de sangue seguia para dentro da residência. Ele entrou correndo, temendo que o pior tivesse acontecido. Na sala avistou sua esposa, sentada no sofá. Segurando um bebê recém nascido, enrolado em um lençol branco.
- Alexis - disse, se aproximando aliviado ao ver que a esposa estava bem - é o nosso bebê?

A mulher ergueu a cabeça para encara-lo, seus olhos estavam brancos e expressavam a morte. Ela deu um sorriso e em seguida abocanhou a cabeça do bebê, esmagando seu crânio com os dentes.

***

Patrick acordou assustado, sentou-se no sofá e olhou freneticamente para todas as direções. Ainda estava na casa de Daniel, deu um longo suspiro agradecendo em mente por tudo aquilo ter sido um pesadelo. Um dos mais assustadores que havia tido até o momento.
A pequena sala estava escura e o relógio perto a TV marcava 4:32 da madrugada. Pitt dormia em um quarto de hospedes que ficava no segundo andar da casa. Daniel havia oferecido o seu para Patrick descansar melhor mas ele recusou, achava que estava causando incômodo demais para aquele senhor.
Patrick se levantou e andou até uma das janelas do local, arredou o papelão que a cobria. Daniel cobriu todas as janelas com o material, tinha medo de que a luz do interior da residência pudesse atrair os olhos cinzentos.

A rua estava escura e os infectados ainda perambulavam por ali, gemendo e grunhindo. Alguns estavam mutilados, sem os braços, orelhas, nariz, bochecha. Entre outros que se arrastavam pelo chão, esfolando a carne no asfalto e soltando pedaços por onde passavam.

Patrick pela primeira vez em muito tempo estava com medo, assustado, apavorado diante de toda aquela situação sem explicação. Temia por si e por sua mulher, sua única vontade era sair o mais rápido possível dali e ir encontrar Alexis.

- Eles estão lá fora? - perguntou Pitt, se aproximando.
- Não me mate de susto, ainda tenho um filho para cuidar.
- Desculpe, mulherzinha.
- Não te vi chegando.
- Percebi.
- Insônia?
- Acho que sim, tive uns sonhos estranhos.

- Eu também. O que pretende fazer, Pitt?
- Ir para a casa dos meus pais, ou melhor, para a mansão deles.
- Olha só. Alguem aqui tem os pais milionários.
- Quase isso. Eles devem estar lá, escondidos como ratos sem nem se quer se importarem com a filha suicida.

- Não são afetivos?
- Nunca foram. Acontece nas melhores famílias.
- Quer que eu te leve?
- Claro que não, acha que sou fraca demais para pegar um carro, fazer ligação direta e cruzar a cidade até a minha casa?
- Caramba, já planejou tudo.
- Sim, mas e você?

- Pegar um carro, que de preferência esteja com a chave no contato porque não sei fazer ligação direta. Seguir para a minha casa, jogar minha mulher na cama e...
- Ei, não precisa dar esses detalhes podres - Pitt riu.
- Eu sei, pensei alto demais - ele devolveu o sorriso.
- Eu faço a ligação direta para você, caso não encontre um carro com a chave no contato.

Patrick e Pitt ficaram conversando sobre suas vidas antes de se encontrarem no hospital. Haviam perdido o sono e o jeito era esperar amanhecer para que cada um seguisse o seu caminho em meio as estradas infestadas por mortos-vivos.

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