CAPÍTULO UM - KAYA

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O ano em que eu nasci marcou também o centésimo ano da guerra entre os reinos de Yas e Agneya.

Porém quando se é uma princesa de Yas, e sobrinha do rei, os horrores de uma guerra centenária parecem apenas histórias e lendas que os empregados cochicham pelos corredores. E para mim, Agneya não era nada além do nome de uma terra que parecia tão distante quanto o céu ou o inferno.

Minha mãe recontava as histórias que sua própria mãe lhe contara, histórias que eram passadas de geração em geração. Lembranças de um mundo sem guerra, memórias de pessoas que já não estavam mais entre nós. Eram histórias de um tempo em que podia-se atravessar os muros da fortaleza e ir de um vilarejo ao outro, onde os nobres viviam espalhados pelos quatro cantos de Yas, cada um com seu próprio castelo e as crianças podiam correr pela neve e brincar com seus trenós. Um tempo onde liberdade significava poder ir onde quisesse e não apenas de um ponto ao outro do castelo.

Essa vida de grandes espaços, de distâncias geográficas que podiam ser percorridas, pareciam quase como um universo fantástico aos meus ouvidos e à minha imaginação. Tão diferente da realidade em que vivíamos, onde o rei, seus parentes, nobres e serviçais viviam todos enclausurados na fortaleza real, protegidos e isolados, baixando a ponte levadiça apenas para deixar sair mais um grupo de meninos prontos para a guerra ou receber os corpos daqueles que caíram em uma batalha para nunca  mais levantar.

Mas a vida encarcerada por trás da enorme muralha era tudo que eu conhecia e, portanto, era a vida que eu amava.

Eu gostava de assistir os jovens soldados treinando no pátio. Gostava de pregar peças nos nobres da corte junto com meu irmão Kari e nunca sermos repreendidos – porque nós éramos os únicos sobrinhos do rei. Gostava de ficar na varanda do salão principal pegando flocos de neve com a ponta da língua e ouvir as histórias de terror que a babá de Kari contava antes de irmos para a cama. Gostava quando minha mãe trançava meu cabelo e quando meu tio me levantava no colo e dizia que eu parecia uma raposa da neve. Aquilo sempre me fazia rir mesmo que eu não entendesse se era uma coisa boa ou não.

Eu amava meu pequeno e perfeito mundo. Até o dia em que tudo mudou.

 Até o dia em que tudo mudou

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Princesa de Dois Reinos [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora