CAPÍTULO 02: Tópicos para o medo

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DANIEL

VOCÊ SE CONSIDERA UMA Pessoa de dia ou de noite? Diurna ou noturna, bom, não sei a definição certa para isso mas acho que fico com a segunda opção.

Apesar de que hoje é uma exceção.

São sete horas da manhã de uma terça-feira nublada e por incrível que parceca, eu estou acordado. Disperso. Vivo.

Normalmente eu durmo a manhã - e a tarde - toda, para ficar acordado com a noite só pra mim. Gosto dela. Sem o sol quente sobre a casa, fazendo tudo ficar um calor e sem o estresse das vidas agitadas. A noite parece que tudo fica mais simples, mais calmo, leve e silencioso.

Estou sentado na minha escrivaninha, com uma folha de papel em cima da mesa e um lápis na minha mão direita. Na janela do meu quarto, a cortina revela uma brecha do mundo exterior na qual não vejo a muito tempo. Do lado de fora do meu quarto, consigo escutar os murmurinhos da minha mãe e da minha irmã, Mia, se organizado para irem ao trabalho e faculdade.

Depois de um tempo batucando com o lápis na mesa, finalmente resolvo criar os tópicos para oque chamo de: lista para superar o medo.

Idiota, eu sei.

Mesmo sabendo que a minha situação não era muito saudável - de acordo com a minha mãe - , eu já estava acostumado. Me sentia confortável do jeito que estava vivendo - ou melhor: vegetando - e se pudesse, ficaria assim por provavelmente o resto da minha vida.

Acontece que cheguei em um momento crucial desse comodismo e acho que posso dizer que: não tenho mais escolha.

E isso é culpa do meu eu de dois meses atrás. Do garoto que ainda tinha esperança e achava que podia dar a volta por cima depois de tantos problemas.

E se você estiver lendo isso, Daniel-de-dois-meses-atrás, você é um merda.

Me estico com a cadeira giratória e alcanço o documento que tinha recebido ontem do correio. Retiro a carta que já tinha lido provavelmente umas seis vezes desde que ela chegou e não faço diferente, a leio de novo.

PREZADO DANIEL,
A equipe de direção da universidade de Wisconsin tem o prazer de confirmar e garanti-lo a uma vaga de Música, para realizar um período do curso no final desse ano académico, com duração de 5 meses, sobre o enquadramento da Associação de Bolsistas de Minnesota.

As informações e horários dos respectivos cursos serão enviadas assim com o constatamento do documento remetido e antes da data iniciada para a aceitação da bolsa.

Acreditamos que a sua experiência e habilidades serão um ativo valioso para o nosso campo.

Estamos ansiosos para recebê-lo em nossa equipe. Sinta-se a vontade para entrar em contato conosco caso tenha alguma dúvida ou preocupação.

Atenciosamente,
UW - Madison.

É, parece que eu tinha sido aceito na melhor academia de Wisconsin para cursar musica.

Eu havia me inscrito logo depois que o Todd morreu, quando minha psicologa na época - Karol, 34 anos, cabelos curtos, sorrisinho simpático ensaiado - tinha dito que o melhor a se fazer no momento era me apegar à hobbies que eu gostava de fazer e investir neles.

Foi quando eu me inscrevi nessa maldita academia que misteriosamente me aceitou. Não culpo esses caras, - sem me gabar mas - eu realmente era muito bom tocando piano. Era. Uma pena que hoje em dia eu não tenho mais prazer em executa-lo.

Pensei em escrever de volta e dizer educadamente que eu dispensaria o ensino deles. Mas aí a parte sensata da minha cabeça deu sinal de vida (ela aparece as vezes) e concluiu que essa seria a minha ideia de escape.

Eu iria sair de Minnessota, iria para um lugar onde ninguém me conhecia, me reinventaria e seria aceito. Eu praticamente sumiria do mapa e poderia ser eu mesmo. O garoto aleijado que Minnesota conhecia nunca existiria.

Era genial, mas como tudo que é bom dura pouco, esse plano tinha um problema: a maldita agorafobia.

Como eu iria enfrentar o meu maior medo se nem conseguia sair de casa?

Precisava de um plano. Na verdade, precisava parar de enrolar e começar logo a escrever os malditos tópicos dessa maldita lista. Para ajudar, abri o notebook e pesquisei algumas dicas que poderiam ser úteis.

1. Avalie a situação

O site falava sobre ir ao psicólogo. Revirei os olhos e cruzei os braços. Eu já havia avaliado a minha situação com três psicólogos diferentes a muito tempo. Tudo oque eles faziam era encher a minha cabeça de coisas e palavras reflexivas que no final do dia, não serviam para coisa alguma.

Não adiantava nada, eu precisava agir.
E rápido. Próximo tópico.

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