CAPÍTULO 26: Juan, o mendigo

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#dedico esse capítulo a FernandaTucker  que foi uma das primeiras pessoas que começou a ler I See You e sempre me apoiou. sei que está passando por um momento difícil e só queria pedir que, por favor, não se esqueça de que tudo vai passar. você é maravilhosa e merece viver.

DANIEL

MAIS OUTRA MADRUGADA E eu estou disperto - acordado. Pensei tanto sobre o convite que a Sophia tinha me feito e para falar a verdade, não era tão ruím.

Ir para o baile da escola disfarçado, com uma máscara cobrindo o meu rosto e vestindo uma calça para cobrir a minha prótese. Será que daria certo? Ou talvez eu esteja exagerando nessa esperança que crescia dentro de mim. Não sei direito.

Ultimamente eu estava me sentindo tão bem. Tão motivado. Talvez se eu conseguisse sair de casa mais uma vez... não sei. Será que eu conseguiria?

Larguei a vasilha com os deliciosos brownies que a minha mãe tinha feito - e que ocasionalmente me lembravam a Sophia - em cima da escrivaninha e sai do quarto.

Talvez eu conseguisse. Não sei. Vou descobrir.

Andei até a cozinha e bebi um copo d'água gelada para me dar coragem. Sem fazer muito barulho, ando até a porta da saída e respiro fundo. Abro a porta de uma vez só e ando calmamente até a varanda.

Eu saí

─ Estou aqui fora. ─ sussurrei. Quando fui perceber, minhas mãos tremiam e minhas pernas estavam bambas. ─ Não acredito... ─ soltei um riso abafado.

Eu saí.
Eu estou aqui fora.
E tenho certeza de que por mais de seis segundos.

─ Eu consegui...!

─ Parabéns, cara. ─ escutei uma segunda voz masculina e então me virei para o lado, encarando a alguns metros, um homem baixo - com roupas folgadas e aparência meio suja, mexendo no vaso do lixo do vizinho.

─ Hm..ahr.. obr-obrigado. ─ gaguejei, engolindo seco.

─ Você tem alguma coisa legal aí pra comer? ─ perguntou e eu cocei a cabeça.

─ Você t-tá falando comigo? ─ apontei para mim mesmo.

─ Quê? ─ o homem riu, achando a minha pergunta a maior graça do mundo.

─ V-você está com fome? ─ perguntei.

─ Pra porra.

─ Tá bom... Eu vou ver... ─ entrei dentro de casa novamente e não contive meu sorriso. O que estava acontecendo comigo? Eu tinha conseguido definitivamente sair de casa e estava trocando algumas palavras com esse homem...

Fui em direção à geladeira na cozinha e peguei a caixa de pizza - que tínhamos jantado mais cedo. Também peguei um copo e um refrigerante guardado.

─ Caralho, pizza?! Eu sou muito sortudo. ─ o homem disse, assim que me viu com a caixa de pizza, se aproximando da minha casa e se sentando no batente da varanda. ─ Valeu aí, cara.

Eu dei de ombros e me sentei ao seu lado, hesitante e com as pernas meio bambas.

─ Pode.. ficar à vontade. ─ coloquei as coisas ao lado e ele já foi em direção as fatias de pizza, enfiando um grande pedaço na boca.

─ Isso é melhor do que ganhar na loteria. ─ disparou, com a boca cheia.

Não disse nada, apenas soltei um riso vazio - de nervosismo.

─ Qual o teu nome, garoto? ─ perguntou e eu tentei não gaguejar antes de responder:

─ Daniel.

─ O meu é Juan. ─ respondeu, abrindo o refrigerante e o levando direto até a boca, dispensando o copo. ─ Tu tem quantos anos?

─ Dezessete. ─ definitivamente não sabia como socializar. ─ E você?

─ Vinte e oito.

Juan era baixo, magro, tinha um rosto redondo. Apesar de ter apenas 28 anos, aparentava ter mais, com a barba mal feita, roupas folgadas e um cheiro não muito agradável.

─ O que é isso na sua perna? ─ perguntou curioso, apontando. Não notei nenhum tom malicioso, então, respondi sem dar muita importância:

─ É uma prótese.

─ Então você não tem perna?

─ Eu tinha, mas fiz uma cirurgia e ela foi retirada. ─ tentei explicar de uma forma simples. ─ E eles colocaram essa prótese no lugar.

─ Porra, que massa. ─ comentou. ─ Então você é tipo o homem de ferro?

Eu comecei a rir, achando graça do modo em que ele tinha falado.

─ Não, definitivamente eu não sou como o homem de ferro.

E então ele continuou comendo a pizza. Acho que só do tempo que fiquei ao seu lado, ele comeu cinco fatias. E então, suspirou, passando a mão pela barriga satisfeito.

─ Valeu, cara. ─ disse e eu encarei a caixa, restando ainda uma fatia. ─ Por que eu sempre passo por essa rua e nunca te vejo?

─ Não saio muito de casa.

─ Massa que resolveu sair hoje. Eu estava faminto.

Não contive e soltei uma risada. Estava me sentindo tão bem. Ali fora, conversando com Juan - que eu nem mesmo conhecia.

Me senti vivo de novo.

E então, um sentimento de melancolia foi entrando e se instalando no meu peito. Nostalgia e tristeza. Porque ali, onde eu e Juan estávamos, era onde eu e o Todd costumávamos sentar para conversar.

E agora, sei que ele não está mais presente, e por mais que talvez isso soe egoísta, eu estou. E preciso continuar seguindo em frente. Porque as coisas mudam, os amigos partem, a vida não para para ninguém e o mais importante: eu estou vivo. Eu estou vivo.

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