A Canção de Gelo e Fogo sonata I

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Uma voz no vento, chama azul do dia, doce perfume, canção 
Uma voz no tempo, resiste na noite 
E as lágrimas fogem de ti 
Uma voz no vento, uma voz me chama 
Brisa de amor, doce coração, uma voz no tempo 
Carinho na alma 
E as lágrimas fogem de ti , e a as lágrimas fogem de mim... e um rio se forma de nós...

(Uma voz no vento - Leila Pinheiro)

VOLANTIS

Daenerys Targaryen estava grávida há pelo menos oito luas. Não que ela estivesse contando, mas era o que Aisha lhe dizia. Sua barriga estava grande e perfeitamente redonda, os seios pesavam de leite, mesmo assim ela não se importava. Os últimos meses haviam sido difíceis, mas ela aprendera a se distanciar de si mesma, desprender-se de sua pele machucada.

Nas horas que não estava aprendendo feitiçaria com Aisha, ela se sentava encostada no beiral da grande janela da casa de madeira e olhava para o céu a procura de Drogon. Às vezes ela conseguia alcançá-lo. Ver através dos olhos dele e sentir o que ele sentia. No início Drogon resistia, tentava fazê-la sair, mas relaxava quando entendia que era ela. Agora escorregar para dentro das escamas e do calor de seu dragão era quase natural.

A última vez que o buscara, ele voava sobre um mar verde de grama que se movia como ondas logo abaixo conforme o vento soprava. Ela reconheceu o Mar Dothraki e a imagem a encheu com uma estranha emoção. Fora lá que ela perdera Drogo, Rhaego e dera vida aos seus dragões. Ela sentia a atração de Drogon pelo lugar. Como eu, ele também procura por um lar.

Pensou em Pedra do Dragão, o assento ancestral de sua família perdido a milhares de distâncias no mar. Dany se lembrava de como tentara se conectar com o lugar na primeira vez que o vira. Como ela tentou encontrar parte de si e de seus antepassados ali. Nos corredores vazios e escuros de Pedra do Dragão, ela tentara ouvir os passos de Rhaegar, as voz de Jaehaerys e sua irmã esposa, Alysanne. Tentou imaginar sua mãe e seu pai e todos que vieram antes dela. Mas ela não conseguia. Estavam todos mortos. Ecos distantes e fantasmas. Ela sabia que não poderia alcança-los.

A verdade amarga é que Daenerys nunca sentira que Pedra do dragão era o seu lar e isso a entristeceu. A fortaleza fora apenas uma concha vazia e fria flutuando no meio do oceano. Não existe lugar pra mim no mundo, Drogon. Eu nunca terei um lar. - Dany tentara aquilo. Ela tentara criar um lar para si dentro de seu coração. Primeiro com a grande porta vermelha em Bravos, depois no khalasar de Khal Drogo, por fim entre seus amigos, dragões, Westeros e Pedra do Dragão. Eu tentei construir um lar em mim com Jon Snow. Eu pensei que havia encontrado enfim o meu lugar. Mas eu estava errada... Nunca haverá um lar para Daenerys Targaryen. Pensar naquilo fazia seu estômago doer e seu coração encolher.

Naquela noite a lua estava cheia no céu, espalhando fios prateados sobre as nuvens. Sentada contra a grande janela, Dany olhou para o disco prateado com intensidade, lembrando-se do conto que Doreah havia lhe contado sobre a lua e os dragões na época que ela vivia feliz entre o khalasar de Drogo. Nós viemos mesmo da lua, Drogon? Dany esperou que a lua respondesse, mas ela não respondeu. O silêncio ensurdecedor que se seguiu a fez sentir falta de Sor Jorah, das histórias que ele lhe contava e de sua companhia. Sentia tanta falta de seu urso que doía. Dany ficara longe por meses e anos de Jorah Mormont, mas sabia que agora era diferente. Ele não preencheria mais o silêncio. Agora ele era o silêncio.

Por mais que se esforçasse, pensar em seus mortos sempre a fazia chorar. Sentia falta de Missandei, a única amiga de verdade que ela tivera. Sentia falta do seu riso doce e do toque dos seus dedos delicados em suas tranças. Sentia falta de dormir ao lado dela e rir dos pequenos segredos que elas compartilhavam. Sentia falta de seus filhos, Rhaegal e Viserion ou mesmo de Rhaego, que ela nunca segurara nos braços. Eram tantos mortos e fantasmas que ela nem sabia por onde começar a contar . Eu os arrastei para a morte... Tudo em vão... tudo o que eu toco morre.
O ar da noite estava gelado e ela sentiu o cheiro das folhas de um pé de limão sendo carregados pelo vento, embora ela soubesse que não houvesse frutos naquela época. Estavam naquela casa há pelo menos duas luas. Aisha havia achado melhor tirá-la do templo e partiu com ela e Benerro alegando que Daenerys precisava ver coisas bonitas. Dany não disse nada, ainda não sabia se podia confiar neles mas no fundo ela agradeceu pela mudança. O templo sempre lhe dava uma sensação de claustrofobia e naqueles dias andava agitado devido a necessidade de escolher um novo Alto Sacerdote.
Agora os três viviam numa casa de madeira no interior de Volantis, um pequena reduto cercado por grandes árvores e próximo a um rio que Benerro dizia ser um dos braços do rio mais poderoso do mundo, o Roine. Dany não confiava no homem, mas gostava quando ele lhe contava histórias sobre os antigos roinares e o conflito sangrento que eles travaram contra os senhores do dragão da antiga Valíria. Alguma coisa no jeito que ele falava às vezes a fazia lembrar-se de Jorah e isso era reconfortante de um jeito estranho.
- Eram um povo feroz - ele dissera certa vez enquanto os dois estavam numa carroça voltando do mercado local, que ficava algumas léguas de distâncias de onde eles estavam hospedados. Benerro e Aisha nunca deixavam Dany sair sozinha. Nunca. E ela precisava sempre esconder seus cabelos prateados que cresciam a cada dia - Os roinares haviam enriquecido graças a generosidade de seu rio, a Mãe Roine, como eles o chamaram. Arte e música floresciam nas cidades do Roine e há quem diga que seu povo tinha sua própria mágica. Uma mágica muito diferente das feitiçarias de Valíria que conforme Vossa Graça deve saber, estão enraizadas no fogo e no sangue.

Sangue do DragãoOnde histórias criam vida. Descubra agora