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Eu tinha duas escolhas: recomeçar ou  me entregar.  

Adivinhem qual eu escolhi...

  Há três anos, eu tento lidar com toda essa merda de luto, mas a cada dia, quando percebo que fui a única sobrevivente daquele maldito incêndio, me jogo de cabeça na escuridão.  

  Quero aliviar essa dor sobre o fato de  eu não ter mais ninguém, quero aliviar o  fato de que  eu nunca mais vou voltar a vê-los.  

Duas batidas na porta do quarto me  fazem sobressaltar.

— Sim? 

  Não vou abrir a porta, me nego a conversar com qualquer um depois da noite de ontem, depois de ter voltado  para essa orbita dolorosa, depois que a bebida saiu do meu sistema.

— Joy, sou eu, a Salete, Ramon está aqui, digo para ele ir embora?  

  Salete é a minha empregada tanto pessoal quanto do hotel e Ramon é o  meu advogado!  

  Ambos tentam me ajudar, mas não  quero ninguém na merda comigo, basta um apenas de luto.

— Diga para ele me esperar no escritório- Digo, sem levantar da cama. 

  É provável que eu esteja com um  processo nas costas, afinal, desacatei  um policial e dirigi embriagada.

Então Ramon deve ter livrado minha cara!

  Odeio essas merdas de visitas, Ramon sabe, ele poderia me ligar ou mandar  um e-mail, mas insisti em me tirar do meu casulo.

  Então escondo a foto dos meus pais embaixo do travesseiro e deixo o quarto.

— Obrigada, Salete- Beijo sua testa.

  Ela é um ser iluminado em minha vida escura, tenho um enorme apreço por essa mulher!

— Não está com fome? Fiz bolo de chocolate para o café da manhã, você adora bolo de chocolate.

Beijo sua testa mais uma vez!

— Agradeço, Salete, mas estou de ressaca, nada desce.

  Ela fica visivelmente triste por eu me negar a comer do seu bolo, então, suspirando eu digo:

— Mais tarde você traz uma fatia pra mim?

Seus olhos se iluminam.

— Sim, Joy!

Pronto, uma alma está feliz!

Deixo-a ir trabalhar e vou direto para o escritório do meu pai, no térreo.

— Oi, Ramon- Digo, ao entrar e encontrá-lo já me aguardando.  

  Meu advogado tem quase quarenta anos (acho eu), tem uma beleza contida e trabalha duro para me manter longe das confusões. 

O que não é tão fácil!  

Porque nos últimos três anos, é so o que tenho feito: criar problemas!  

  Sento-me toda desengonçada na poltrona confortável que foi do meu pai, esse escritório era dele, e tem cada pedacinho do seu bom gosto espalhado por aqui!

— E então?- Pergunto, devido o seu silêncio— O que houve?

Ramon me encara, com cara de poucos  amigos.

— Convenci o policial a não prestar  queixa, mas não teve a mesma sorte quanto ao fato de que estava dirigindo bêbada, ganhou pontos na carteira e vai pagar uma multa altíssima.

Junto as mãos e posiciono o queixo  sobre elas.

— Só isso?

— Só isso, Joy?!- Sei que ele está irritado, só pelo tom de voz— Estou cansando disso, sabia? Não dá pra livrar sua cara todo o tempo, não!  

  Vamos entrar agora no papo do  aconselhamento, mas não estou com saco pra isso hoje, então simplesmente saio do escritório.

— Joy!- Ele me segue— Precisa assumir suas responsabilidades, precisa assumir  a rede de hotelaria, precisa parar de  fugir.  

É o mesmo assunto sempre!

— Tenho 23 anos e uma vida toda pela frente, Ramon, não estou pronta pra nada disso- Ergo a voz para ele, ainda de costas— Além do mais, eu tenho você a frente de tudo.

— Não para todo o sempre- Diz, então suspira— Reaja, Joy!

Suspiro eu agora, exasperada.

— Eu sei o que estou fazendo, Ramon!

— Sabe mesmo?!- Ele expode— Já faz três anos, Joy, precisa deixá-los partir.

Viro-me bruscamente e o encaro.

— Para mim é como se tivesse sido  ontem- Dou as costas a ele e sigo em  frente.

  Por isso eu odeio essas visitas, a gente sempre briga, ele sempre me lembra que tenho de reagir.  

  Todos ao meu redor me falam sobre reação, mas nenhum deles sentiram a minha dor, ninguém mais sofreu como sofri.

NINGUÉM!

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Bem, dou início oficialmente as postagens!
💁‍♀️

A Joy se resume em uma única palavra: Dor!
Ela passou por uma situação de trauma da qual não se recuperou
😐

Não sei quando volto, então, a qualquer momento eu posso estar por aqui!
♥️

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