Os Volturi

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Esperamos até o anoitecer para deixarmos o galpão. Ainda que não houvesse um único filete de luz do Sol restando na noite que subia, partimos no interior de uma limusine com os vidros totalmente pretos. Aos poucos, as árvores e as mínimas vegetações rasteiras da paisagem da gloriosa Toscana foram cedendo espaço à cidade milenar e as torres muradas que pontuavam o cume da colina; quando o carro se embrenhou por uma rua estreita de pedra, que naquele crepúsculo apresentava um tom pálido de marrom, pensei ter ouvido os portões da prisão se fechando ao meu redor.

Volterra. Por tempo indeterminado, minha nova morada. E, muito possivelmente, minha sepultura.

Até a arquitetura da cidade parecia agressiva. Descemos da limusine entre imponentes edifícios de três andares com portas duplas envoltas em arcos que pareciam avançar no beco, quase não deixando espaço para os pedestres. As janelas, em sua maioria, se espalhavam nos planos mais elevados e tinham tons sóbrios de castanho-avermelhado ou verde-escuro; algumas até tinham o beiral cheio de vasos de cravos coloridos, mas nem isso parecia o suficiente para trazer vida àquele mundo de pedra. Automaticamente, senti saudades do verde eterno de Forks.

Avançamos alguns metros e logo nos vimos à esquerda do Palazzo dei Priori com a larga praça se distendendo adiante; ergui meus olhos para a torre exatamente no segundo em que os ponteiros do relógio se moveram para anunciar as oito da noite. Não houve badaladas ou carrilhões de sinos cantando, mas de alguma forma ver aquilo tornou tudo mais real, mais definitivo. Pela primeira vez desde que despertei, fui abstraída por uma pontada de hesitação.

Jane deve ter visto isso transparecer na minha expressão, porque um sorriso sardônico surgiu em seu rosto para exibir todos os dentes, os olhos duros cintilando com um brilho cruel.

— É um lugar bastante agradável, não acha? – indagou retoricamente enquanto analisava a Piazza dei Priori, as mãos unidas nas costas forjando uma falsa postura solícita. – Devia ver durante o dia.

— Especialmente no ápice do Sol – Alec acrescentou, entrando no jogo da sua gêmea. – Estou certo de que seu irmão deve ter dito algo, afinal, ele próprio já teve a oportunidade de apreciar desta beleza.

Estreitei os olhos em fendas, sentindo os punhos adquirirem espasmos severos de ódio. A praça não tinha absolutamente nada de especial – era um cercado de construções de pedra repletas de arcos floreados nas portas e nas janelas, as extremidades coroadas por padrões quadriculados emblemáticos dos castelos medievais – e se eles estavam fazendo tanto alvoroço em cima dela era apenas com a intenção de me provocar, porque aquele foi o palco da tentativa de suicídio frustrada de Edward. Decidi não reagir, porém; seria dar a eles exatamente o que esperavam e eu não queria que me tomassem como um alvo fácil de se atingir com implicâncias. Continuei marchando pela lateral até alcançar um beco ermo que se afunilava à medida que ficava mais íngreme, terminando em um paredão de tijolos e uma abertura pequena no calçamento, a grade ligeiramente afastada para o lado.

Um buraco de esgoto, típico dos ratos, pensei com um sorriso seco antes de saltar dentro dele, pousando com suavidade nas pedras úmidas do fundo. David veio logo atrás de mim, seguido por Jane, que assumiu total dianteira pelos túneis inclinados com paredes escorrendo, e por último Alec, com o som pesado da grade se fechando atrás de si. No final do caminho nos deparamos com mais um conjunto de grades; essas eram grossas e avermelhadas pela ferrugem, e foram fechadas com uma tranca ruidosa assim que passamos elas, para enfim nos vermos diante de uma porta de madeira simples e baixa que guardava um corredor. Era bem comum esse corredor; tinha paredes claras e uma boa iluminação, um tapete cinzento e ordinário. Levava a um elevador que tocava uma música genérica ruim – os dois vampiros de tocaia ali ampliaram os olhos ao me verem, porque pela aparência corada, cheiro incomum ou coração frenético, ficava evidente de quem se tratava. Graças a junção conturbada de David na Guarda, eu já tinha sido peça de cochichos.

Estrela da TardeOnde histórias criam vida. Descubra agora