DORMIR FOI UM POUCO DIFÍCIL QUANDO CHEGUEI EM CASA. Por alguns motivos óbvios. Primeiro: Storm estava me esperando acordado, com um prato de macarrão gigantesco que ainda me chocava em como poderia caber dentro daquele corpo. E pior, como ele poderia comer aquilo tudo e ainda se manter esbelto. Maldito metabolismo masculino. Se eu comesse aquele prato inteiro, iria tudo para a minha bunda. Segundo: porque o beijo de Mike acabou me atormentando o restante da noite, mesmo eu tendo feito todo o meu ritual de retirar a maquiagem do baile, tomar uma ducha relaxante, jogar o vestido de qualquer maneira no canto oposto do quarto, para só então pendurar o infeliz quando eu estivesse a fim, soltar os cabelos emaranhados pelas mãos experientes de Mike... Quando pensei na experiência das mãos de Mike, lá se foi o meu sono tão almejado. Porque fiquei pensando não somente no momento terno e sedutor, mas também em como ele usava aquelas mãos. Será que toda aquela experiência era oriunda de muito treino intenso apenas com a prática do agarre da bola de futebol, ou também com as garotas que deviam pulular pelo campus ? Eu não queria admitir para mim mesma, mas estava enfiada em uma névoa densa de ciúme. O maldito monstro de olhos verdes chegou mordendo com muita força o meu traseiro. As palavras de Mike entraram em conflito no meu cérebro sonolento. Ele voltou mais cedo, pois admitiu que tinha descoberto que eu iria ao baile e estava com ciúme. Isso era um sinal muito bom. Um sinal fantástico. Ele me queria, só na admissão daquele fato, já senti o aperto dos batimentos cardíacos acelerados no meu peito e achei que pudesse estar tendo palpitações. Ri sozinha do meu próprio disparate, com medo de morrer naquele momento. Fiquei imaginando bater à porta de Rainbow, pedindo para dormir ao lado dela, no intuito de sentir uma segurança de que, se fosse morrer de algum ataque cardíaco durante o sono, pelo menos não morreria sozinha. Mas existia a grande possibilidade de me deparar com Thomas na mesma cama, e seria muito embaraçoso, no mínimo, compartilhar do aconchego daquele casal de pombinhos fofos. Quando a manhã por fim chegou, eu contabilizei provavelmente apenas uma hora de sono ininterrupto. Depois que saí do banheiro, desci meio que trotando as escadas e me dirigi à cozinha, onde mamãe e papai já estavam ajeitando um café da manhã fantástico. Eca. Suco de couve com sementes de gergelim. Meu Deus, aquilo era comida de passarinho!
- Bom dia, querida! - mamãe me saudou com efusividade e senti meus ouvidos tinirem. Isso porque eu nem ao menos tinha bebido, para queixar uma ressaca monstruosa.
- Bom dia, mama. O que é essa gosma nojenta? Eca. Não me responda.Já sei. É aquela coisa que você faz para soltar o intestino - falei e ri.
- Exatamente. Seu pai está precisando.
- Mãe! Por favor, me poupe dos detalhes sórdidos dessa informação! - gritei e cobri os ouvidos.
- Mas é a verdade... alguma verdura que cultivamos no jardim deve ter fermentado de maneira errada.
- Eca! Pelo amor de Deus! Alguém me mate agora - falei e caí na cadeira cobrindo a cabeça.
- Você quer com faca ou a torradeira serve? - Storm perguntou ao entrar na cozinha.
- O quê? - perguntei sem entender. - Quer que eu te mate com uma facada letal ou uma paulada na cabeça, com a torradeira da mamãe? - Nossa, Torm... você me assusta, às vezes, sabe? Percebe que falei apenas como expressão dramática?
- Mas estou muito a fim de matar você hoje, Sunny. Pela palhaçada de ontem, sabe? Eu estava em casa, tranquilamente, assistindo uma luta de MMA, e, de repente, tive que sair para buscá-la no antro de hormônios juvenis. E fiquei a ver navios. Percebi que papai e mamãe acompanhavam nossa interação com interesse. Se minha mãe comesse pipoca, tenho certeza de que seria o que ela estaria comendo no momento. Como ela não comia, a escolha era exatamente os grãos de gergelim que estavam na vasilha à frente.
- Cara, deixa de ser dramático. Eu nem sequer pedi pra você me buscar naquele momento - falei e cortei um pedaço de torrada, colocando-a toda na boca. - Aliás, o que me leva à pergunta...
- Esvazie a boca primeiro - mamãe corrigiu. Engoli com um gole longo de leite.
- Por que mesmo você não foi ao baile? Que eu saiba, era para nós dois, já que você está na mesma série que eu... Storm sentou-se de qualquer maneira na cadeira à minha frente. - Eu não estava nem um pouco a fim de ir.
- Hummm... Por que de repente acho que tem muito mais nessa sua frase do que você não disse, Torm? Ele teve a gentileza de dar um sorriso e entrecerrar os olhos.
- Você não sabe de nada, irmãzinha... só o que deixo você saber. E, para sua informação, eu desmarquei meu encontro do baile. Fiquei chocada com a informação. Até onde eu sabia, Storm iria com Shayna, uma garota que ele paquerava desde o ano anterior.
- O que aconteceu com seu encontro? - perguntei desconfiada. - Nada que seja da sua conta - ele disse e jogou uma migalha de pão em mim.
- Credo, que grosseria. Rainbow entrou na cozinha naquele momento, completamente amarrotada. Q
- Ora, ora... se não é nossa irmã mais velha, tão cheia de classe, que nem ao menos se dignou a pentear os cabelos... - Storm zombou e levou um tapa na cabeça quando ela passou por ele.
- Bom dia, filha - nosso pai disse e recebeu um beijo espontâneo de Rain. Até eu me surpreendi. Rainbow não era dada a demonstrações públicas de afeto assim tão abertamente.
- Bom dia, mãe, pai. Está ou não um dia lindo hoje?
- Meu Deus, agora eu que peço que alguém me mate. O que vejo é a porra de uma alucinação logo nessas horas da manhã? Minha irmã mais velha, saudando a todos e ao dia com essa naturalidade e graça? O que está acontecendo com o mundo, meu Deus? - Storm quase gritou na cozinha. Nossos pais começaram a rir. - Deixe de exagero, Storm. Sua irmã está apenas feliz. Não estrague seu momento.
- Seu momento? Que momento? - ele perguntou desconfiado e até eu a olhei mais atentamente. Fiquei em busca de sinais evidentes que delatassem alguma ação escusa ou que desabonasse a virgindade intacta de Rainbow. Será que ela tinha, finalmente, rompido suas barreiras mais restritas e dado tudo, tipo... tuuuuudo, para Thomas Reynard? Nossa, eu precisava de uma conversa com minha irmã naquele momento. - Deixa de ser estúpido. Estou apenas feliz. Só isso.
- Só não me digam que Thomas dormiu aqui. O rosto de Rainbow ficou vermelho como um pimentão. - Storm! - ela gritou exasperada. - É uma pergunta justa, porra. - Ele não dormiu aqui, e, mesmo que isso não seja da sua conta, o que isso tem a ver com o fato de eu estar feliz?
- Cara, me recuso a responder essa sua pergunta aí. Porque até mesmo processar a possível resposta me dá náuseas cabulosas.
- Storm, já vi que posso deixar você a cargo de suas irmãs e que elas morrerão virgens, com toda a certeza - meu pai falou rindo.
- Herb, não dê ideias a esse garoto, por favor. Eu estava passada com aquela troca matinal. Nossa família era assim. Trocava diálogos nada a ver a qualquer hora do dia. E talvez tenha sido isso o que mais senti falta quando meus pais tiveram aquele tempo longe. Eu sabia que havia uma viagem programada para uns meses à frente, mas agora estávamos acostumados e não seríamos pegos de surpresa.
- Apenas fiquei feliz com a chegada surpresa de Thomas. Só isso. - Rainbow abriu a geladeira e pegou uma jarra de chá gelado. - Embora eu quisesse que ele ficasse aqui, ele foi para a casa dos pais, okay, Storm? - Ela deu-lhe a língua.
- Ótimo. Já foi perturbador descobrir que Mike estava com minha gêmea. A cabeça de Rainbow virou em minha direção como a cabeça da guria do O Exorcista. Foi meio assustador.
- O quê? O Mike estava com você? - perguntou, e sentou-se à minha frente.
- Bom, lindos. Vamos deixar vocês trocando ideias no café da manhã, okay? - mamãe falou.
- Seu pai e eu vamos a uma feira ao ar livre hoje e voltaremos tarde. Concordamos rapidamente e nem demos com a saída deles dali. Rainbow voltou seus olhos verdes e afiados em minha direção novamente. Credo... quando ela olhava atentamente daquele jeito, seus olhos pareciam de lince.
- Vá contando tudo, sua pilantra. Mike estava com você? Por quê?- perguntou com suspeita.
- Bom, não sei explicar isso direito. Há um homem no recinto - falei e mexi as sobrancelhas apontando para Storm, que havia cruzado os braços à espera do relato.
- Qual é o problema em eu estar exatamente aqui? Hein? Está tentando esconder alguma coisa? Fez algo ilícito? Cometeu algum pecado carnal? Revirei os olhos diante de tamanha atitude ridícula. Storm conseguia irritar meus cabelos sedosos logo cedo.
- Storm, por que você não vai conferir se a plantação de batatas do papai está radiante e gloriosa? - Rainbow perguntou e segurei o riso. - Esse foi um jeito engraçado de você me mandar plantar batatas? - perguntou, coçando a cabeça. Tapado. - Não, idiota. As batatas já estão plantadas. Eu quero apenas que você confira os aspectos desses adoráveis tubérculos que estão lá atrás, no jardim... Storm bufou e apontou os dois dedos para Rain e para mim antes de sair da cozinha, não sem antes proferir sua sentença:
- Haverá retaliação, senhoras. Começamos a rir do idiota.Rain pegou minha mão e olhou diretamente em meus olhos.
- Agora me conte tudo e não ouse esconder nada. Respirei fundo antes de começar.
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Sunshine
Teen FictionEntre as irmãs Walker, Sunshine sempre foi conhecida como a mais descolada e de personalidade expansiva. Sempre se sentindo à sombra da irmã mais velha, Rainbow, tão certinha e centrada, Sunny fazia questão de manter uma imagem de que na verdade não...