Capítulo 31

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A BAIXEI A CABEÇA E ENCOSTEI A TESTA NA PORTA ABERTA DO CARRO . Droga. Merda. Saco. Fechei os olhos e esperei.
— Sunny? — A voz de Mike era tipo de surpresa, como, uau, que surpresa te ver aqui! Puxa, eu estava ali conversando com outra garota, por que não avisou para que eu escondesse o corpo?”, bom, ou ao menos eu pensei naquilo.
— Oi! O que estão fazendo aqui? Eu poderia ser sarcástica. Juro que a resposta atropelada veio deslizando pela minha língua, pediu pra sair, mas eu a enfiei de volta, porque minha mãe podia ser hiponga , mas me deu educação e me ensinou a ser gentil com as pessoas. Ainda mais com as pessoas que eu gostava.
— Então… não é? Eu vim… ah… — Busquei uma mentira plausível, mas estava complexo. — Ver uns formulários… Olhei para Rainbow, implorando com o olhar que ela não falasse nada, e vi a confusão em seus olhos. Tipo algo como: o quê? Tá louca? Você não veio aqui pra comemorar seu aniversário com o Mike?
— Sunny? — Mike chamou meu nome.
— Hummm?
— Por que não acredito em você? A resposta desaforada subiu à vida como um refluxo gastroesofágico, e aquela merda ardia que era uma coisa. — E por que você não olhou pra mim até agora? — questionou, insistindo na investigação do meu comportamento silencioso.
Oh, uau. Ele percebeu aquela velha tática de guerra? Não olhe nos olhos, não olhe nos olhos. Os olhos são o espelho da alma. Os olhos revelam a verdade, nua e crua. Os olhos podem queimar uma pessoa, ainda mais se você for o Superman e tiver visão raio laser. Os olhos são muito doidos, e os seus vão dizer na hora que você está fervilhando por dentro. Não olhe nos olhos! A litania no meu cérebro não me serviu de nada. Eu o olhei diretamente nos olhos. Os deles estavam cândidos, como se não houvesse absolutamente culpa alguma ali. Os meus deviam estar tormentosos, como se um vulcão estivesse em erupção por dentro e as lavas fossem ser despejadas diretamente da minha boca e algo como: quem era aquela loira com quem você cochichava de maneira tão intimista, hein?
— Sunshine? — Rainbow me chamou e desviei o olhar
de Mike para ela. Thomas também olhava de mim para Mike e vice-versa.
— O quê?
— O que você quer fazer?
— O radar da minha irmã tinha sido ativado. Ela no mínimo tinha detectado algum sinal grandioso de merda épica aflorando e resolveu estender seu apoio. Numa espécie de “estamos juntas, irmã, se você quiser bater, eu seguro”.
— Eu vou procurar um Starbucks — repeti. Eu realmente precisava de um café. Um chocolate quente. Qualquer coisa que viesse naquele copo onde meu nome estivesse escrito e eu ainda sentisse meu eixo no chão. Quem era aquela garota loira?
— Eu vou com você — Mike informou. O que eu iria falar? Ah, não, senhor… você não vai. Eu tinha ido àquele lugar para vê-lo. Uma hora e meia de carro de Westwood, matando aula numa quinta-feira, para simplesmente vê-lo, porque queria passar aquele dia especial com ele. Só não sabia que eu é que teria a surpresa desagradável.
— Okay.
Entrei no carro e esperei que ele se sentasse no banco do passageiro. Acenei para Rainbow e Thomas e saí, sem rumo. Literalmente.
— Ahn, será que você poderia me dizer pra que direção eu deveria ir? — perguntei baixinho.
— Eu posso, mas, antes, gostaria de deixar essas coisas no meu apartamento, pode ser?Olhei para suas mãos e percebi que ele carregava uma porrada de livros e apostilas.
— Okay. Mike indicou o caminho e fui seguindo em silêncio, prestando atenção às placas e às batidas frenéticas do meu coração. Quando paramos no estacionamento do prédio em que ele e Thomas dividiam um apartamento, desliguei o carro, mas Mike segurou minha mão, antes que eu pudesse dizer qualquer desculpa esfarrapada.
— Sunshine?
— Humm?
— O que aconteceu? Por que você está agindo dessa forma? Uau. Pense em seres meio tapados. Eram os homens. Precisavam que tudo fosse falado escancaradamente, em letras Caps Lock, quase. Respirei profundamente, lembrando os ensinamentos da mãe sobre yoga e meditação. Procurar o seu Eu interior. Putz. O meu estava enfiado lá nas profundezas do meu próprio melodrama e completamente afogado no meu ciúme.
— Não sei. Eu era uma mentirosa. Péssima, mas estava entrando no clube do Pinóquio e podia sentir o formigamento no meu nariz naquele momento.
— Sobe comigo e a gente conversa lá em cima. Você quer? — perguntou. Pensei uma. Duas. Três vezes. Não vou negar que estava curiosa para conhecer o lugar onde ele passava a semana toda enfiado.
— Tá.
Desci do carro mais devagar que uma idosa de noventa anos e o segui pela portaria envidraçada. Observei quando ele abriu a porta principal com sua chave e subiu mais dois lances de escadas. Era um complexo de apartamentos típicos para estudantes e profissionais que gostavam de um estilo de vida mais básico. Mas era agradável demais aos olhos. Superorganizado.Evitei demonstrar a fadiga horrível ao subir as escadas atrás dele, e evitei seus olhares furtivos, que sempre me buscavam por cima dos ombros, enquanto seguia à frente. Mike abriu a porta do apartamento e acabei ficando surpresa com a arrumação. Para um ambiente tipicamente masculino, com dois residentes jovens e que teriam tudo pra curtir uma zona, até que era muito limpo.
— Uau. Que bonitinho o lugar de vocês — falei admirada.
— Obrigado. Mas eu obrigo Thomas a manter a escala de arrumação.
— Você é psicótico com limpeza, é? — brinquei.
— Não, mas também não sou adepto de bagunça desmedida. Era bem a cara do Mike mesmo. Todo certinho e organizado. Sentei no sofá, crente que ia deparar com um par de meias sujas, latas de cerveja, casquinhas de pipoca. Nada. Tudo arrumado. Mike largou a mochila e os livros que carregava, de qualquer jeito, na mesa ao lado e sentou-se diretamente à minha frente.
— Agora você vai me falar o que está acontecendo nessa sua cabecinha? Suspirei. Droga.
— Não é nada, Mike. Sério. Besteira. — Não é besteira, Sunshine. Você veio aqui por uma razão.
— Sim. E já falei qual é — menti de novo. Estava começando a ficar craque.
— E não caí nessa desculpa fuleira, Sunny. Você veio aqui por outro motivo. Nossa… que coisa. Eu não queria expor meus sentimentos assim. Tão abertamente.
— Eu… hum… vim, hum… vim te dar um oi. Só isso. Não foi você mesmo quem disse que eu poderia ser mais espontânea e, sempre que eu quisesse, poderia ligar pra você e mandar mensagem?
— Mandar mensagens e ligar é bem diferente de vir pessoalmente — argumentou e cruzou os braços à frente.Mas que porra era aquela? Ele estava achando ruim? Era isso?
— Nossa! Desculpa, Mike. Foi mal! — Levantei de supetão. No processo, quase o derrubei da mesinha onde ele estava sentado.
— Não achei que a minha presença fosse ser um incômodo assim… Comecei a caminhar para a porta de saída, quando Mike agarrou minha mão e me puxou de uma vez para trás. Acho que dei um voo meio rasante e aterrissei no tórax rígido dele, com um ooompft nada delicado. — Não foi isso o que eu quis dizer, Sunny! — falou em um tom irritado. Era difícil alguém tirar Mike do sério. Aparentemente eu conseguia esse feito com tranquilidade.
— Mas pareceu! Desculpa, tá? Eu sou apenas a namoradinha idiota e bobinha que muito provavelmente você tem vergonha de desfilar na faculdade bacana, né? Mike fez uma cara de chocado e me largou. Aí eu quase caí pra trás.
— O quê? Você está louca?
— Não. Não tô, não! Estou muito consciente das coisas que estou falando! — gritei. Opa. Eu quando ficava brava, meio que perdia as estribeiras.De leve. Caminhei até o lugar onde tinha deixado minha bolsa e as chaves do carro. Eu já podia sentir as primeiras gotas de chuva, digo, de lágrimas querendo deslizar pelo meu rosto, então, precisava sair dali rapidamente, antes que pagasse um mico épico.
— Aonde você pensa que vai? — Mike falou mais alto. Ele não gritava. Ele era um lorde.
— Embora. Vou voltar para Westwood. Daí, quando chegar lá, eu mando uma mensagem. Acho que assim você ficará mais confortável, né? — A ironia pipocou da minha boca.
— Sunshine, você está louca?
— Devo estar. Acho que meu fluxo está perto. Dá licença, Mike. — Tentei passar por ele, mas a muralha não saiu da frente.
— Não. Você não vai sair assim daqui de casa. Você está muito nervosa,precisa se acalmar. Ninguém pode dirigir assim.
— Eu dirijo nesse estado de nervos todo mês, nessa mesma época. Acho — divaguei. — E sempre quando tem prova de Física. Então, isso não vai ser nenhuma novidade. E não vou oferecer risco a nenhum cidadão do bem aqui dessa cidadezinha.
— Sunshine! — Mike gritou. Agora sim ele gritou. E me deu um abraço apertado. Opa. Eu estava com saudade daqueles braços ao meu redor. Mas espera… o que ele estava fazendo? — Você não sai daqui de carro! O idiota arrancou as chaves da minha mão?! Numa manobra traiçoeira!Cretino! Eu pensando que era um abraço caloroso, que estaríamos caminhando para uma reconciliação. Seria 2% de uma caminhada longa para a paz celestial e beijos ardentes, mas era um começo. Mike foi distraído pelo seu celular que começou a tocar naquele momento. Enquanto ele atendia, eu simplesmente voei porta afora. Sem as chaves do meu carro mesmo. Não dava pra ir motorizada? Eu iria a pé. Estaria pra nascer a pessoa que me impediria de ir e vir. Desci as escadas numa velocidade estilo Usain Bolt, quase parei no final e fiz a comemoração que o atleta fazia, com aquela espécie de raio, só pra zoar com o Mike mesmo. Storm adorava fazer aquilo. Dizia que o Usain, na verdade, resolveu adotar aquela prática, porque sentia muita inveja do nome fabuloso que Thunder Storm ostentava. Como ele não tinha o nome, ficaria com o gesto. Palavras de Storm, não minhas. Ter um Waze no celular era maravilhoso, porque eu simplesmente saí andando a esmo, mas, em contrapartida, pesquisei em qual direção estava a porcaria do Starbucks. Eu tomaria um copo enorme de latte hoje. Nem que fosse a última coisa que eu fizesse.

                             MIKE

Sally estava me irritando profundamente, desde a semana anterior, quando a garota foi interferir com o professor, alegando que não achava justo que eu fizesse o trabalho indivualmente, quando era uma exigência curricular que toda a turma cooperasse em equipes. O que ela esperava com aquilo? Ganhar a minha atenção à força? Na marra? Será que a criatura não percebia que aquilo faria minha irritação crescer a níveis gritantes?O grama de cavalheirismo e educação com o qual eu a tratava já estava deixando de existir, então não sobraria absolutamente nada.
— Mike! Mike! — a vaca gritou do fundo da sala. Okay, minha mãe havia me ensinado a ser gentil, e nunca tratar uma mulher com palavras chulas ou torpes. Sally estava dificultando aquele ensinamento. Não parei minha caminhada pelo corredor, apenas diminuí o ritmo. Thomas ficara de me aguardar na saída, já que teríamos treino mais tarde, então provavelmente comeríamos alguma coisa juntos. Fora isso, eu precisava adiantar um trabalho que fiquei de entregar no dia seguinte, mas pedi à professora para enviar por e-mail naquela noite mesmo, deixando-me livre para voltar pra casa ainda de noite, logo após o treino do dia. Daquele jeito, eu conseguiria surpreender Sunshine em seu aniversário. Sally agarrou meu braço e sacudi discretamente, de forma que ela soltasse as garras afiadas de onde estavam fincadas.
— Escuta! Eu queria te pedir desculpas… — falou com tom pesaroso. — Por ter exposto você diante da turma semana passada. Peço desculpas mesmo, Mike.
— Tudo bem, Sally — falei, tentando fazer com que ela me soltasse.
— Eu só queria que você me desse uma chance, Mike. Sabe? Estou tentando desde o início, chegar em você… mas… você ergueu um muro diante de si. Você é quase inatingível. Meus passos diminuíram e olhei bem nos olhos da garota loira que tentou usar daquelas artimanhas ridículas porque queria minha atenção.
— Eu não sou quase inatingível, Sally — falei, quase sussurrando em seu ouvido. Eu precisava que ela ouvisse bem o que eu falaria. Vi um sorriso tentando ganhar forma, então aquele era o momento de não deixá-lo seguir adiante. — Eu sou realmente inatingível, porque eu sou comprometido. Eu tenho uma namorada pela qual sou completamente apaixonado, então, sim, eu sou bem inatingível mesmo. O muro que você viu ao meu redor? Se chama fidelidade, entendeu? Falei e consegui soltar sua mão. Olhei à frente e escutei o nome que estava na minha mente.
— Sunshine!
Minha cabeça se ergueu automaticamente em busca dela. Vi seu carro e Rainbow ao lado de Thomas, o que já me surpreendeu. O que elas estavam fazendo ali? Um sorriso deslizou pelo meu rosto e parti em uma corrida até o carro, percebendo que Sunny estava quase entrando no veículo novamente. Parecia que ela estava com pressa em sair dali. Quando cheguei perto, seu olhar nunca se encontrava com o meu. Ela manteve o rosto baixo, o tempo inteiro, e, por mais que eu a interpelasse, perguntando o que estava acontecendo, e eu sabia que algo estava acontencendo, ou acontecera, suas respostas foram todas automáticas e sem vida. Não era a minha Sunshine. Ainda mais a minha Sunny que fazia aniversário naquele dia. Que completava dezoito anos. A discussão no meu apartamento só fez com que eu ficasse mais revoltado com o que eu supunha que pudesse ter ocasionado aquele arroubo. Ela alegava que poderia ser seu período, mas eu duvidava. Quando meu telefone tocou, e vi que era de casa, até mesmo me surpreendendo, já que Clary nunca me ligava em dia de semana, acabei me distraindo ao atender e Sunshine saiu voando do apartamento.
— Depois falo com você, Clary! — desliguei na cara da minha irmã, sem nenhum pudor. Depois eu me desculparia. Desci as escadas correndo, com medo de que Sunny tivesse saído de carro, nervosa como estava. Ao chegar ao estacionamento, vi que seu carro estava no mesmo lugar, mas não havia nenhum sinal dela. A garota impulsiva que eu amava loucamente tinha simplesmente evaporado. Coloquei as mãos na cabeça, sem saber para onde ela poderia ter ido. Percebi que larguei o celular no sofá, quando desliguei a chamada de Clary bruscamente. Eu teria que subir e tentar fazer contato com Thomas, para, através dele, tentar saber com Rainbow se ela saberia onde Sunshine poderia ter ido. Nós nunca tínhamos nos desentendido. O pior de tudo era que aquele era um desentendimento que eu sequer entendia a razão. Mulheres…

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