Capítulo 12

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— SUNNY ESTÁ VOANDO NOVAMENTE — Jamilly disse e jogo uma bolinha de papel na minha cabeça. Acordei do meu devaneio e  dos momentos idílicos que tinha vivido com Mike no final de semana. Já teria que me preparar, pois ele havia avisado que no próximo final de semana teriam jogo em Maryland. O que significava que eu e Rainbow assistiríamos a algum filme de comédia romântica no Netflix, ou pintaríamos a unha uma da outra.
— Ah, me deixem em paz — arreliei. — Cara, você só falta expelir corações pelas orelhas, Sunny — Tayllie disse rindo.— Os olhos já têm um brilho muito doido, parece algo possuído, sei lá… Tenho o maior medo de olhar dentro da sua pupila e de repente adquirir a forma de um coraçãozinho. Seria medonho… Comecei a rir do disparate da amiga louca que eu tinha. Tayllie tinha levado uma bronca épica de Rainbow, por conta da história da bebida, e ficamos meio estremecidas por… um dia apenas. Ela era minha melhor amiga. Seguida de Jamylle.
— Estou apaixonada… o que posso fazer? O mosquito do amor me picou — admiti e suspirei.
— Eca, mosquito do amor ficou meio nojento — Jamylle disse. Quando a aula encerrou,saímos para a aula de Educação Física e nos reunimos com a equipe de cheerleaders . Samantha e Mandy já nos aguardavam, bem como as outras vinte e três meninas do Ensino Médio, que disputariam as vagas das dez colocadas.
— Okay, garotas. Os testes serão feitos hoje à tarde. Depois da última aula — Samantha Parker disse, depois de explodir uma bola de chiclete. — Espero que todas tenham vindo preparadas para conquistar as vagas que disponibilizamos. Eu, Tayllie e Jamylle nos encaramos e vibramos discretamente. Jamylle já tinha decidido não participar. Estava com uma lesão no joelho, das aulas de balé, e acreditava que não estaria apta a disputar. As aulas transcorreram com a lentidão de uma lesma gripada, embora eu não fizesse ideia do porquê de usar a analogia de uma lesma gripada, mas a imagem foi  hilária na minha mente, então compensou meu próprio riso no corredor, rumo ao ginásio. Dei um esbarrão de encontro ao peito duro de Maxwell. Um ooompft pôde ser ouvido até na China, se brincar, tamanho o impacto. O garoto estava usando granito nos peitorais?
— Oooa, gata… desse jeito posso pensar que você queria entrar dentro do meu bolso… — ele disse, com uma mão segurando com força minha cintura. Maxwell jogava no time de futebol. Pelo tórax, que quase quebrou meu nariz, deduzi que só poderia ser da defesa, um bloqueador desses que fazem questão de se jogar sobre os pobres coitados dos jogadores, que têm a única e específica tarefa de tentar levar a bolinha oval para a End Zone .
— Max… Você estava olhando pra frente? — perguntei desconfiada.
— Claro que sim, coisa linda.
— Então você poderia ter desviado — falei o óbvio.
— Claro que sim… — repetiu.
— Mas aí eu perderia a chance de ter esse contato que tivemos aqui.
— Você se importaria de me soltar? — perguntei com gentileza fingida. Eu começava a entender por que Tayllie e Jamylle não gostavam muito dele.
— Eu gostei muito de segurar você junto a mim naquela festa, Sunny — ele disse e me puxou para mais perto. — Sabe? Quando você estava apagada? Foi uma sensação deliciosa… Senti um arrepio esquisito percorrer minha nuca. Uma dúvida começou a apitar, como um sonar de um submarino. A pulga atrás da minha orelha direita – e não sei porque escolhi a orelha direita, talvez seja por causa dos meus piercings – deu um coice fenomenal e entrecerrei meus olhos.
— Foi você que colocou algo na minha bebida, Max? — perguntei, desconfiada ao extremo.
— Eu? Não… O que é isso, Sunny — falou de maneira fingida. A verdade estava em seus olhos. Tinha sido ele que havia dado a bebida adulterada para Tay me entregar.
— Você me drogou, porra?
— Claro que não, Sunny! Era só uma brincadeira. Você é que é fraca para a vodka da casa dos pais da Samantha — ele disse e piscou. Suas mãos ainda me mantinham presa.
— Me larga, por favor.
— Cara, se seu namorado não tivesse chegado, tenho certeza que teríamos nos divertido… porque, antes de você apagar, você até mesmo me confundiu com ele — Max disse rindo. Senti o ódio me rasgando por dentro. — Você é um babaca, sabia?
— Sabia. Sempre soube. Mas tenho uma queda por você e nunca escondi. Ao contrário da maioria dos garotos idiotas da escola — ele disse.
— Ainda não consigo entender por que você preferiu aceitar o convite de Tyson para o malfadado baile, em vez do meu… Eu não podia acreditar no que estava ouvindo. O imbecil estava se gabando, achando que o que fizera era um mérito e devia ser reconhecido como tal. Ouvi passos no corredor.
— Você pode tirar as mãos da minha irmã? Tipo… agora?! — Storm rugiu atrás de mim. Revirei os olhos, mas dei graças a Deus pela ajuda providencial. Não que eu não pudesse me livrar do babaca, mas pelo menos daquela maneira eu não quebrava as unhas e não estragava meu cabelo, nem me atrasava para o teste no ginásio. — Opa… desculpa aí, Storm… Sunny e eu estávamos apenas conversando — Max mentiu. Olhei para Storm, que só faltava espumar pela boca, tal qual um pitbull com raiva, e ele era meio assustador quando estava daquele jeito. Será que eu ficava assim quando estava furiosa? Se nós éramos gêmeos, aquela imagem foi meio atemorizante pra mim…
— Já estou indo, Storm — falei e me desvencilhei do babaca.
— Vaza — falou e não tirou os olhos de Max. Eu saí e, quando olhei para  trás, a disputa de encaradas prosseguia firme e forte, mesmo que Max mantivesse as mãos para cima, como um bandido rendido. Uau. Storm podia dar medo quando queria. Senti um orgulho absurdo daquele lado macho man do meu irmão. A garota que conquistasse seu coração teria um trabalho árduo para lidar com toda a personalidade esfuziante dele, mas também teria um protetor de primeira qualidade nas mãos. Praticamente um cavaleiro de armadura ultramoderna, daquelas que vinham com um uniforme de futebol americano e ombreiras volumosas e protetores em locais engraçados.Cheguei ao ginásio rindo sozinha da imagem mental que pintei. Tayllie acenou sem discrição nenhuma da arquibancada onde estava sentada, e caminhei calmamente, mesmo que meu coração estivesse quase saltando pela boca.
— Cara, você quase perdeu o início. E a Samantha é jogo duro — ela sussurrou no meu ouvido.
— Falou que quem se atrasar para qualquer um dos treinos ou reuniões está fora.
— Maxwell me travou no corredor.
— Max?
— O próprio.
— Virei de frente para Tayllie e chamei sua atenção, olhando ao redor para saber se alguém nos observava. — Tay, na festa, foi Max quem te deu a bebida?Ela pareceu envergonhada e assentiu.
— Cara, Sunny… desculpa. Foi ele sim — ela admitiu.
— E estou me sentindo uma idiota, porque eu e Jamylle sabemos do que Max é capaz e mesmo assim apaguei da mente e acabei lhe dando o copo que ele mandou te entregar. Então havia sido o babaca mesmo.
— Ele já tinha feito isso? Tayllie olhou ao redor.
— Sim. No início do ano passado, antes de você entrar na escola. Ele deu uma bebida batizada pra… — ela pareceu envergonhada em confessar — Jamylle. Os dois acabaram num quarto na casa dele naquela noite, e no dia seguinte ela não se lembrava de nada. Eu estava chocada. Max tinha drogado Jamylle e os dois tinham… transado? Tipo… sem ela saber? Mas aquilo ali não era estupro?
— Caracas, e a Jamylle não fez nada? — perguntei.
— Ela confrontou Max, mas ele disse que ninguém acreditaria, porque os dois estavam dançando juntos a noite toda, no maior agarramento.
— Isso é tipo estupro, Tay! — sussurrei horrorizada.
— Nós sabemos, ela sabe, o Max sabe. Mas ninguém acreditaria, Sunny.Jamylle já não era virgem, tem o temperamento meio que… hum… expansivo demais, entende?
— E daí? Isso não justifica um babaca achar que pode ir lá e pegar o que acha que ela está oferecendo — falei irritada. — Se ela quiser expansiva e quiser dar pra todo mundo, essa é uma decisão meramente dela, ela não tem que ser induzida por uma bebida para participar. Nossa… eu estava puta agora. Minha vontade era ir atrás de Maxwell e caçá-lo como se eu fosse a Buffy, a caçadora de vampiros. Okay, eu de vampiros. Okay, eu tenho que admitir que assistia esse seriado velho pra cacete. Era legal e eu tinha uma queda muito brusca pelo David Boreanaz, o Angel.
— Eita… use esse ódio todo na coreografia e você vai conquistar uma das vagas — Tay falou e passou a mão nas minhas costas.Eu precisava me acalmar. Estava difícil. Vou dizer uma coisa. É muito difícil ser julgada e levar um estigma durante a vida toda por algo que você não é. Eu já devia estar acostumada. Talvez eu estivesse mais enfurecida porque a percepção de que Max tenha tentado fazer comigo o mesmo que fez com Jamylle talvez tenha ocorrido porque ele identificou e já me julgou, pelo meu comportamento alegre e expansivo, como alguém dada a toda e qualquer atividade que envolvesse muito contato de pele roçando à vontade. Eu era brincalhona, extrovertida, fazia amizade com a mesma facilidade com que passava rímel nos cílios e não diferenciava os sexos na hora de dedicar minhas piadinhas. Eu não bancava a coquete para os meninos, embora gostasse de saber que eles me admiravam. Mas que garota não gostava de saber disso? Era bom para a autoestima. Falava aos quatro ventos que estava à caça de gatinhos, quando, na verdade, muito daquilo era da boca pra fora, porque eu mais ladrava do que mordia. Uau… aquela imagem me pintava como uma… cadela? Não gostei da analogia, então vamos mudar aqui. Eu era mais de falar do que de executar. Mas eu nunca, nunca ia com unhas afiadas no modelo Stilleto,igual à Rihanna, já pronta para arranhar, somente porque eram meninos. Eu os tratava de modo igual. Brincava da mesma maneira. Tanto que tinha amigos e amigas, em igual medida. Claro que nas outras tantas escolas e cidades pelas quais passamos em nossa vida itinerante, muitas vezes os garotos confundiam a amizade com algo mais. E aí era o chato da relação. Ter que dizer que eu gostava deles apenas como amigos e tal. Porra. Eu sempre fui assim. Sempre fui brincalhona e não pensava muito antes de falar. Sempre fui muito de abraçar e de distribuir toques. Sou o exato oposto de Rainbow. Enquanto ela não era fã de toques e pessoas ao redor, não curtia abraços, eu, ao contrário, amava andar de braços dados com minhas amigas, gostava de encostar nas pessoas. Eu achava que a energia que emanava de cada um poderia fazer trocas com as que circulavam ao redor. Nesse quesito eu era meio hippie. Talvez a mais hippie dos filhos Walker. Poderia me ver dançando na chuva tranquilamente, com flores no cabelo, rindo em contato com a natureza, em uma grande roda de amigos… num belo comercial da Coca-Cola. Bom, quando entrou a Coca-Cola na equação, matei o sonho dos meus pais, que eram contra o gigante capitalista. E aí estava… eu era um ser efusivo. Elétrica, não parava nunca, estava sempre cercada de pessoas ao redor. Sempre cercada de meninos. Mas ali estava o julgamento que muitos deles tinham de mim. A imagem mental que projetavam em seus cérebros distorcidos. A de que eu era fácil e dada. Descartável como um lenço de papel, volúvel como uma folha ao vento. Muitos me pintavam como uma garota selvagem, quando de selvagem eu não tinha nada. Eu era até pacata. Daí um filho da puta achava que me dando uma bebida adulterada facilitaria o acesso que lhe neguei tantas vezes, nos inúmeros convites e indiretas que fez ao longo do tempo em que estudamos juntos? Aquilo não ficaria assim. Até mesmo porque eu não me chamava Sunshine Walker se eu deixasse aquele merda fazer aquilo novamente com outra garota.

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