Capítulo 01

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— Narrado por Pilar
- Pili? — Ouvi Fernanda me chamar e abri os olhos lentamente. Meu corpo inteiro doía, era como se eu tivesse sido atropelada por um caminhão. Ela sorriu meigamente e se aproximou sentando ao meu lado.
- Como ele tá? — Falei tão baixo que mal escutei minha voz.
- Tá bem, quer dizer...pelo menos ele acordou!— Ela forçou um sorriso. - A gente precisa conversar. — O sorriso desapareceu do rosto dela e eu senti um aperto no peito. Balancei calmamente a cabeça confirmando e a olhei tentando me manter calma.
- Aconteceu alguma coisa? — Minha voz saiu falha.
- Aconteceu sim minha querida. Eu conversei com o médico e ele me falou algumas coisas sobre o estado de saúde do Purre. — Ela parou suspirando e cada vez mais eu sentia meu peito ser esmagado. - Ele me falou tudo detalhadamente claro, disse que agora o estado dele está estável. Mas que eles não conseguiram evitar uma seqüela. — Ela pegou minha mão que tremia e suava frio.
- Fernanda, pode falar. Eu agüento. — Mentira, eu estava quase desmaiando. Forcei um sorriso.
- Pili , ele...perdeu parte da memória. — Senti o chão sob meus pés simplesmente sumir e uma dor insuportável em meu coração, por alguns segundos achei que tivesse perdido todos os sentidos, até sentir a mão de Fernanda apertando a minha. Olhei para seu rosto tenso ainda tentando assimilar as palavras dela.
- P-perdeu? — Gaguejei.
- Perdeu Pili , não completamente. Ao que parece ele só lembra até mais ou menos uns 14 ou 15 anos. Eu e o médico conversamos com ele, para tentarmos descobrir. Ele lembra dos amigos, da banda, mas... — Ela me olhou apreensiva.
- Mas? — A olhei já com os olhos cheios de lágrima.
- Ele não lembra de você Pili , e nem do Théo. —  Soltei um gemido de dor e ela me abraçou forte. Era como se tivessem arrancado meu coração ou então partido ele em milhares de pedaços. O Théo, logo o Théo, ele é uma criança, ele não vai conseguir entender isso.
- Calma Pili, por favor. — Fernanda pediu nervosa sem saber direito como agir.
- D-desculpa. — Me afastei dela e cobri o rosto com as mãos.
- Não, tudo bem minha querida. É só que ver você assim me parte o coração, e eu não posso fazer nada pra te acalmar, te tranqüilizar. — Ela pegou minhas mãos e sorriu. — A partir de agora vai ser tudo diferente Pili, por mais que a gente diga ao Purre tudo que aconteceu, o médico disse que ele dificilmente recuperará a memória, mas que não é impossível. Quem sabe com o tempo, a convivência. — Ela falava calmamente enquanto eu ainda soluçava alto atraindo os olhares curiosos de algumas pessoas que passavam por ali.
- Mas Fernanda, o Théo. Ele é uma criança, como ele vai lidar com tudo isso? — Falei com a voz embargada.
- Eu sei Pili, vai ser difícil. E eu sinceramente não tenho um bom conselho pra te dar, também estou perdida ainda com tudo isso que aconteceu. Achei que quando ele acordasse tudo voltaria ao normal. — Ela começou a chorar e eu me senti um pouco egoísta por estar tão desesperada apenas por mim. A Fernanda sempre foi uma mãe coruja, Purre é o garotinho dela, ela sempre teve tanto medo de acontecer qualquer coisa com ele.
- Fernanda desculpa, eu estou sendo egoísta. — A abracei e ficamos lá chorando juntas, sofrendo juntas. Porque tudo isso tinha acontecer?

Comecei a pensar nos últimos 3 anos da minha vida, tudo tinha ficado de cabeça pra baixo. Me mudei pra Londres na expectativa de uma vida melhor, queria estudar, me formar e me dedicar ao trabalho, o resto seria conseqüência. Até eu conhecer o cara perfeito e ver a noite que era pra ser a mais perfeita da minha vida se transformar em um pesadelo. Conheci Purre em um bar junto com seus amigos de banda. Logo da primeira vez que o vi senti as famosas borboletas no estomago, meu coração bater acelerado e um sorriso idiota tomar conta do meu rosto. Conversamos a noite inteira e acabamos ficando, mas estávamos bêbados demais pra ficarmos apenas nos beijando, precisávamos de alguma coisa a mais. Ele me chamou pra ir ao apartamento dele e eu fui mesmo sem saber direito que estava fazendo, e como dá pra imaginar acabou rolando muito mais do que simples beijos.

Até hoje não me lembro muita coisa daquela noite, apenas alguns flashes. Acordei no dia seguinte completamente de ressaca e completamente sem roupa, assim como Purre. Saí da casa dele antes que ele acordasse e deixei o numero do meu celular embaixo do telefone dele. Nem sei por que fiz aquilo, sabia que ele não ia ligar, mas quando estou de ressaca faço as coisas meio inconscientemente. Passei a semana toda pensando em Purre, lembrando do sorriso dele, da risada, dos seus olhos, e quando já tinha certeza que ele nem lembrava mais de mim, meu celular tocou e pra minha surpresa reconheci sua voz do outro lado da linha.

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