-Entubado o quê? – perguntei sem entender o que John disse.
-Encourado. – ele me corrigiu. – Mais conhecido pelos nordestinos como Vampiro do nordeste, um homem totalmente vestido de couro preto com enormes asas de morcego, olhos vermelhos e todo seu corpo tem um fedor de sangue.
Vampiro?! Era só o que faltava. Um parente do presidente Michel Temer!
-O Encourado? – a voz do Negro D água saiu engasgada como se ele quisesse tossir, seus punhos se fecharam. – Então é ele que está invadindo meu território ?! O que aquele maldito faz aqui!
-Uma boa pergunta para outro momento. – disse Yancy se abaixando perto da pequena menina. – Ágata, acha que pode fazer alguma coisa?
-Não sei, eu não curandeira, sou péssima em feitiços de cura. Só consigo curar pequenos machucados e coisas do tipo, mas eu posso tentar. – respondeu ela. – Vamos levar ela para dentro da van.
Yancy se abaixou e a pegou no colo.
-Com certeza não tem apenas ela. – disse John, pensativo. – Se ele está solto por essas redondezas, deve ter feito diversas vitimas. Como a legião não reparou nisso? Quem está no comando do centro-Oeste, atualmente?
-Eu também gostaria de saber onde os semideuses que deveriam ser nossos protetores se meteram. – disse o Negro D água. – Fiquei dias emergindo de rio em rio e não achei nenhum até encontrar esse enojadinho aqui perto.
Enojadinho?!
-Desculpe por isso, estamos com muito problemas. – respondeu Tainá. - Acredite não é por mal, mas eu também gostaria de saber quem está liderando a legião desta parte.
-O Miguel, filho de Guaraci. – respondeu Yancy. – Da última vez que tivemos noticias dele foi quando ele enviou uma mensagem dizendo que quase toda a legião estava ocupada combatendo incêndios no pantanal e o trafico animal, tem uma rede enorme de caçadores vindo dos países vizinhos entrando nas matas... infelizmente a barreira não os permite passar pela fronteira.
-Qual barreira? – perguntei.
-Você não sabe nada mesmo, não é? – questionou Victor fazendo uma careta. – Nós não podemos sair desta merda de país. Estamos presos aqui.
Estamos?!
-Victor, não fale assim. – murmurou Tainá.
-Mas é verdade, estamos presos aqui, novato. – respondeu ele como se dizer tais palavras aliviasse alguma coisa dentro de si. – Desde que você nasce como semideus brasileiro, seu destino é ficar preso aqui e defender essa droga de equilíbrio, você não pode sair do Brasil por nenhum motivo, essa é a lei dos deuses. Nem que sua vida dependesse disso, nem mesmo a vida de sua família é levada em conta.
Seu olhar que a maioria das vezes está irônico ou emburrado se tornou levemente triste. De todos que conheci, o Victor é o mais como posso dizer, reclamão sobre ser semideus. Ele já disse várias vezes que é um saco e injusto, pois ele não pediu para ser o que é. Eu me lembro de suas primeiras queixas nas reuniões da legião, todos pareciam ignorar ele na maior parte do tempo, menos Ágata, Tainá e João.
-Victor, se acalme. Vamos pensar nisso depois, a menina precisa de ajuda. Sei que pode ajudar ela, você pode sugar o frio que ela está sentindo? – perguntou Yancy. – Sei que isso vai ajudar um pouco ela.
Victor olhou para a menina em seus braços e suspirou, assentindo com a cabeça.
-Obrigado. – Yancy o agradeceu e ambos seguiram junto de Ágata para a van.
-Eu posso ajudar. – disse a Rafaela para a surpresa de todos, ela estava corada. – Já vi isso uma vez, minha tia foi uma das vítimas do Encourado á muito tempo. Meu avô administrou uma cura com ervas e outras plantas, acredito que posso consegui-las nas redondezas. A pequena garota ainda está no primeiro estágio da doença, se eu conseguir fazer rápido o antidoto, ela vai ficar bem.
-Sério? – Ágata sorriu. – Por favor, faça isso.
-Seria uma enorme ajuda. – disse Yancy, animado.
Rafaela sorriu de forma animada e se apressou em correr para o meio da mata.
-Kauê, vá com ela e a ajude, fazendo o favor. – pediu Yancy.
-Tudo bem. – respondi.
- Isso está muito estranho. – suspirou John, levantado a mão ao queixo de forma pensativa. – Não faz sentido... Negro D água, vamos conversar. Eu preciso que me diga tudo que sabe. – respondeu John. – Se conheço bem o Encourado, ele irá voltar, precisamos dar um jeito nele aqui e agora.
-Concordo. – respondeu ele. – Inclusive, tenho algo que quero mostrar a vocês.
-Me espere! - exclamei.
-Eu vou junto, Purê! – gritou meu papagaio, pousando em meu ombro. – Eu disse para o George ficar ali parado, se tivermos sorte, ninguém irá perceber o que ele é. Mas vamos precisar dar um jeito depois.
-Eu sei... eu sei. – suspirei seguindo a garota que pelo jeito não estava nem um pouco interessada em me esperar.
...
Não andamos muito, o silêncio poderia ter sido bem-vindo se meu papagaio não parasse de falar a todo momento, a garota não era de conversar muito, praticamente ela nem olhava para mim, apenas ficava procurando por raízes e plantas. Agora que reparei mais nela, parece ter uma tatuagem na perna esquerda, mas não consigo ver direito por causa da causa jeans que ela está usando. Está um calor infernal por aqui, eu, Yancy e John estamos de shorts, assim como Ágata e Tainá que estão usando um short também, menos Victor que está usando uma calça e um casaco... já mencionei que passo mal só de olhar pra ele?! O engraçado é que está quente, mas diversas nuvens escuras estão se formando e chegando mais perto, logo irá chover.
-Se quiser voltar, pode ir. Não preciso de ajuda. – disse ela e realmente não precisa, ela é filha da deusa a agricultura e das plantas, praticamente tudo que ela precisa está vindo na mão dela ou crescendo automaticamente.
-Boa ideia. – respondeu meu papagaio e eu tapei o seu bico. O bicho que não pensa antes de abrir a torneira.
-Pelo menos me deixe fazer companhia. – respondi dando de ombros. – Ou por acaso você também não gosta de mim por eu ser o azarado do século?
Algo que não é muito difícil, não sei se é impressão minha, mas ela não me parece muito contente em estar aqui, digo... pode ser imaginação minha, no entanto, pelo que pude ver, ela é um tanto solitária dos demais e bem reservada, digo isso porque eu sou assim, fui assim na minha vida escolar inteira e acredito que ainda terei que ser.
-Eu não ligo pra isso, não me importa quem é seu pai ou não. – respondeu ela, limpando suor que estava em sua testa. – Seria muita hipocrisia da minha parte ser preconceituosa com você, não acha?
Eu não entendi.
-Desculpe, mas não entendi. – respondi.
-Ora, não se faça de bobo, com certeza já ouviu os boatos e as piadinhas sobre mim por todo Eldorado. – respondeu ela de forma cansada e exausta. Ela parecia estar com um pouco de dificuldade para respirar. – Sempre falam de mim para os novatos.
Falam o que? Eu não sei... realmente a única coisa que escuto naquele lugar é que devo ser morto pelo bem da humanidade e quem sabe até do universo.
-Eu não sei do que está falando. – respondi.
-Vocês nunca sabem. – murmurou ela.
Ela não falou mais nada e limitou a fechar a cara e a continuar seu trabalho. Qual o problema dela?
Eu não puxei mais conversa, nem disse mais nada. Ela conseguiu todos os ingredientes que ela disse serem necessários e voltamos para junto de todos. John por algum motivo estava com sua enorme foice em mãos enquanto conversava com o Negro D água. A Iariadéte havia criado pernas e estava na porta da van, quando chegamos mais perto e adentramos ela, eu fiquei bobo, mais uma vez. A van como as ocas, é totalmente espaçosa por dentro, parece aqueles quartos enormes de luxo que em sua maioria aparecem em fanfics do Bad Boy rico e a patricinha pobre e tonta, pois é, eu leio este tipo de coisa.
Victor estava com a cabeça da garota deitada em seu colo, ela está menos pálida que antes, com certeza ele conseguiu tirar todo o frio que ela estava sentindo. A mesma estava coberta com um cobertor e o curioso é que as pontas dele estão levantadas como se ela estivesse com as pernas abertas para os dois lados. Yancy estava com uma pequena adaga em mãos e Ágata com uma pequena bacia de madeira, seus olhos estavam roxos.
-Como ela está? – perguntou a Rafaela.
-Victor conseguiu fazer o corpo dela voltar a se aquecer, mas surgiu outro problema, eu estou sentindo uma coisa estranha, pelo que John disse...
-Ela está começando a se transformar. – concluiu Rafaela, interrompendo Ágata.
-A se transformar no que? – perguntei.
Victor levantou o cobertor e mostrou para nós que nas costas da menina, haviam surgido duas asas de morcego, bem nojentas.
-Esse é o estágio 2, preciso me apressar. – disse Rafaela indo até uma mesa no interior da van, sem querer ela derrubou uma pequena bacia de madeira. – Desculpa!
-Calma, não foi nada. Temos tempo. – disse Yancy. – Ágata não pode curar ela, mas ela pode retardar a mutação.
Com toda coragem do mundo, Yancy deferiu um corte em seu braço, ele apertou o mesmo e o sangue começou a escorrer para o pequeno pote que Ágata estava segurando.
-POR QUE ESTÁ FAZENDO ISSO?! – exclamou Rafaela de forma desesperada e de repente que quase pulei entre Yancy e Ágata. Quando ela reparou que se excedeu um pouco, ela recuou alguns passos, ficando vermelha.
-É um ingrediente do feitiço, precisa fazer um círculo de sangue e depositar a vitima nele, assim Ágata poderá ativar o feitiço e qualquer male que estiver na garota, irá se conter e não se espalhar. – respondeu Yancy sorrindo com o olhar suavizado. – Relaxa, Rafa. Já passei por coisas piores do que ser cobaia dos feitiços de Ágata.
Ágata lhe deu um tapa no topo de sua cabeça e ele riu. Quando conseguiu sangue suficiente, ela desenhou um círculo com ele e disse umas palavras complicadas. O círculo brilhou com uma luz roxa. Rafaela foi até Yancy e de forma tímida lhe deu um lenço para colocar sobre o ferimento, mas ele recusou.
- Obrigado, mas não precisa. – respondeu ele balançando a mão direita e uma fumaça branca... Não, não é uma fumaça, é uma pequena nuvem. Gotas de água começaram a cair dela em cima do corte de Yancy e aos poucos o mesmo foi se curando, que incrível! Que demais!
-Agora ela ficar instável. – Ágata suspirou, exausta. – Precisamos saber se outras pessoas não foram atacadas e saber se estão na mesma situação dela, se estiverem, precisaremos ajudá-las também. Rafaela, quanto tempo vai demorar?
-Esta tudo aqui, só preciso ferver. – disse ela indo para fora com uma pequena panela e fazendo sair do chão alguns gravetos secos. – Mas tenho a impressão que está faltando alguma coisa... tem algum fósforo aí dentro?
Todos nós a seguimos, menos Ágata que ficou lá dentro. O sol havia sumido, o céu estava bem nublado e o vento começou a ficar frio.
- Não, mas acho que isso serve. – disse Yancy se aproximando e se abaixando perto dos gravetos secos, ele levou sua mão acima deles e uma descarga elétrica saiu, queimando os gravetos e produzindo fogo.
-Obrigada. – respondeu ela.
BARUMM!!
Um trovão explodiu acima de nós.
-Louvado seja Tupã, a dias espero essa chuva! – exclamou a Iariadéte voltando ao Rio.
- Será que vai ferver antes que o céu desaba em cima da gente? – perguntou Tainá.
-Esqueceu que eu estou aqui? – perguntou Yancy. – Deixa que cuido disso.
-Pessoal. – John se aproximou de nós, o Negro D'água havia pulado no Rio. – Sei que não vão gostar disso, mas não poderemos ir até resolver esse problema. O Negro D' água me contou que o Encourado está atrás da filha dele, a Iariadéte, em outras palavras, ele vai voltar está noite.
-O que ele poderia querer com ela? – perguntou Victor.
-Seu sangue. – respondeu John. – Por alguma razão que não consigo entender, ele começou a atacar outras criaturas folclóricas também. Geralmente ele saia por aí sugando o sangue das pessoas que não frequentam a igreja, crianças não batizadas e ele sempre sabe quem é sua vítima. O Encourado não é uma criatura desejada, ele não protege a natureza como a maioria das criaturas folclóricas, só é um monstro sanguinário. Ele não é um vampiro comum, então não adianta usar alho, cebola, Cruz, luz do sol ou qualquer coisa do tipo contra ele. O Encourado não deve ser vencido e sim evitado.
- Então como matamos ele? – perguntou Tainá.
- Não dá pra mata-lo, mas podemos incapacita-lo. – sugeriu John. - Da última vez que enfrentamos ele, nós arrancamos suas asas e seus braços, assim ele não pode fazer mais nada para ninguém, depois o prendemos dentro de uma caverna selada pelos irmãos de Ágata.
- Então como ele se soltou? – perguntei.
-Alguém o ajudou. – respondeu ele. – É a única explicação.
-Esse é o plano? – questionou Victor fazendo uma careta irônica. – Cortar ele em pedaços, prende-lo e torcer para que não escape e faça vítimas de novo?
-É, é a única forma de para-lo. – finalizou John. – Mas não vai ser fácil, nenhum pouco fácil. Ele é muito rápido e tem uma força descomunal, seu odor repugnante de sangue nos deixa atordoados e seus ataques são letais.
- Co-com licença. – Gaguejou a Rafaela, com os punhos fechados, apertando as ervas que estavam em suas mãos, ela parecia nervosa. – Posso interromper?
- Não precisa pedir permissão, Rafa, ninguém aqui faz isso. – respondeu Tainá.
- Eu faço. – respondeu Yancy, fingindo estar ofendido.
-Calado! – exclamou ela.
-Bom... O antídoto está quase pronto, mas para dar totalmente certo, ele precisa de outro ingrediente. Um ingrediente complicado de conseguir, agora que me lembrei que meu avô o conseguiu por pouco. – respondeu ela. – Vamos precisar de um pouco de fios de cabelo do Encourado.
-Por que sempre precisamos de alguma coisa dessas coisas?! – exclamou Victor, revoltado.
-Desculpe. – respondeu Rafaela, mas porque ela pediu desculpa? Não é culpa dela.
-Tudo bem, tudo bem, vamos conseguir. – respondeu Tainá, por fim. – Teríamos que lidar com ele mesmo, deixar ele careca será consequência. Primeiro vamos comer algo, a chuva está chegando e logo irá anoitecer, vamos nos preparar.
...
A chuva caia intensamente em nosso redor, Yancy estava impedindo que ela caísse em cima de nós, estávamos bem protegidos das pancadas de água. Está bem escuro, se não fosse a fogueira, não daria para enxergar nada. Todos estávamos sentados em volta dela, menos a Rafaela que se sentou na beira do rio, e Yancy que estava sentado em cima da van, impedindo que a chuva caísse em cima de nós, John e Victor conversavam sobre algum plano para quando o Encourado aparecer, Tainá conversava com a Iariadéte. O Negro D'água estava de vigia do outro lado do rio. Meu papagaio e minha Bike voadora estavam denteo da van, descansando. Ágata e eu estávamos juntos, comendo os sanduíches que estavam na mochila que Robert me deu. Estávamos em silêncio, observando os outros, isso até a Ágata quebrar este momento.
-Foi o Robert não foi? – perguntou ela e quase engasgo com o sanduíche. – Ele que ajudou não é?
Não adianta tentar mentir, seu olhar estava sério e direto.
-Sim, foi ele. – respondi.
- Eu sabia, só ele ora fazer um sanduíche tão horrível. – ela resmungou, limpando as mãos de farelo de pão. – Meus irmãos não te ajudariam, não correriam o risco, mas Robert... Ele não liga muito pra regras, é um idiota.
- Ele só queria me ajudar. – respondi. – A culpa não é dele.
-Querendo te ajudar ou não, ele fez algo muito errado. Ele até pode ser expulso de Eldorado se descobrirem. – ela bufou. – Só espero que não chegue a isso. Odeio quando ele faz as coisas sem pensar nas consequências.
-Entendo. – respondi.
-Bom, não adianta reclamarmos agora. – respondeu ela pegando algo em seu bolso e colocando em minha mão. Era uma das armas que Robert colocou na mochila. – Vai precisar disso, mesmo sem treino adequado.
-Atchim! – Rafaela espirrou.
-Saúde! – gritou Yancy de cima da van. Rafaela murmurou um obrigada e escondeu o rosto.
- Sei que não é da minha conta, mas a Rafaela tem algum problema? – perguntei, sim, estou mega curioso. Não consigo entender esse jeito dela.
Ágata olhou para ela.
- Um problema antigo que muitos sofrem, aliás. – ela suspirou, aumentando as chamas em nossa frente. – Ela sofre Bullying por ser gorda. Tanto do pai dela e seus irmãos mortais, como em Eldorado, principalmente das filhas do Deus do amor. São todos uns idiotas.
Imagino que Iracema esteja por trás ou faça parte disso.
-A maioria dos semideuses é magra ou atlética por causa de nosso treinamento forçado, mas isso não quer dizer que não podemos ser gordos e sermos felizes com o corpo que quisermos. – respondeu ela. – Muitos não ligam, pelo menos acredito que não, mas ela... infelizmente se afeta muito. Ela não se dá muito bem com seus irmãos mortais, eles têm inveja dela por ser uma semideusa e passam o tempo infernizando ela com xingamentos, na escola algumas garotas zoavam ela e diziam que ela jamais teria um namorado... eu não a conhecia nessa época. Em decorrência a tanta pressão com toda essa situação, ela começou a se afogar mais ainda na comida, em doces... infelizmente contraiu diabetes. Yancy foi o primeiro a ajudá-la quando ela chegou em nosso lar e alguns de nós, incluindo seus meio-irmãos tentamos fazer ela se sentir melhor, mas a cabeça dela, ela não se vê como alguém ideal, entende?
Agora entendo as palavras dela mais cedo, que ela seria hipócrita se fosse preconceituosa comigo por ser filho de Anhangá.
- Que situação de merda. Eu achei que o pessoal de lá fosse acolhedor. – respondi.
-Na teoria, Kauê, mas na prática é diferente. São semideuses de todas as partes do Brasil, ok personalidades e jeitos diferentes, é praticamente impossível fazer todo mundo se dar bem, ok, tudo bem, as pessoas têm o direito de pensar qualquer coisa, mas eu acho que não te o direito de falar, sabe, pois se você fala algo para fazer outra pessoa sofrer, então suas palavras são vazias e sem significado, pelo menos eu penso assim. – respondeu ela. – As coisas só pioraram também quando os filhos e filhas de Rudá descobriram que ela...
- Ela o quê?
- Ela é apaixonada pelo Yancy. – Ágata sussurrou baixinho. – Não é bem um segredo, acho que você já viu a forma que ela age perto dele, fica toda nervosa, tímida e sorri automaticamente.
Sei como é estar apaixonado, é um saco. Já me apaixonei antes, da cada dor no peito... só que se isso acontecer de novo comigo, eu só espero que seja um infarto, Deus me livre de amar de novo é quebrar a cara mais uma vez...
- Ele sabe disso? – sussurrei.
-Deve saber, é um pouco difícil esconder as coisas do Yancy, ele sempre sabe quando estamos mentindo e tem a melhor audição de Eldorado. Mas até onde sei, ele nunca disse nada pra ela. – respondeu Ágata dando de ombros. - Não sei também se ele corresponderia o amor dela, Yancy é muito difícil de ler, sabe. Ele é bem reservado na dele, eu sei que ele é carismático e você já percebeu que ele é uma ótima pessoa, mas a maior parte do tempo da ver dele prefere ficar sozinho com seus pensamentos. Exatamente como ele está fazendo agora.
Ágata apontou e podemos ver Yancy olhando pro céu, com o olhar calmo que parecia estar perdido e sereno. Por um instante ele se virou em nossa direção e eu rapidamente virei meu rosto pra frente e senti minhas mãos e meu rosto esquentaram, com certeza é por causa do fogo... ele está queimando mais alto do que antes.
- Não disse. – Ágata riu baixinho. – Com certeza ele ouviu tudo que estávamos falando.
- Já anoiteceu, fiquem em alerta. – disse John.
- Eu vou voltar pro Rio. – respondeu Iariadéte. – Preciso aproveitar está chuva antes que ela pare.
Yancy desceu de cima da van.
-Vocês estão ouvindo esse barulho? – perguntou ele.
-Só escuto a chuva cair, por que não faz ela parar? – resmunga Victor.
-Quem faz chover é meu pai, eu não posso interferir, a terra e os animais precisam dessa água. – respondeu ele. - E além do mais, eu gastaria uma energia absurda fazendo ela parar. Mas a algo fazendo barulho além do som da chuva.
Todos ficaram em silêncio, eu também tentei me concentrar, no começo por diversos minutos tudo que ouvi foi o barulho das gotas de água batendo no solo, mas também havia algo... Um ruído, na verdade um grunhido de algum animal, eu já o ouvi antes.
A Iariadéte estava caminhando até o rio e todos ouviram ela adentrar no mesmo, esse grunhido é igual ao do morcego que me atacou quando cheguei aqui.
-AAHH!! – gritou Iariadéte. – PAI!
Ágata correu em disparada em direção ao rio e eu a segui, Yancy foi voando por cima de nós e por onde ele passava, a chuva parava de cair. Rafaela estava na água com a filha da Iara, abaixo se seus pés, a água estava vermelha... vermelha por causa de sangue e havia um corpo flutuando, o corpo do Negro D'água. Mas ele não está morto, não sei como posso ter certeza disso, mas eu sinto que não está.
- PAI! – gritou ela quase explodindo nossos ouvidos.
-Calma! Ele está vivo! – exclamou John. – Só esta desacordado.
- Foi ele! Foi aquele monstro! – Ela berrou. – Ele está aqui!
-"Filho da deusa da morte, é tão bom revelo novamente." – disse uma voz áspera e melancólica de todos os lados. – Vejo que trouxe novos amigos.
-É você, o Encourado. – respondeu John.
-"Você cresceu, nem parece aquele garoto que junto com aquela legião imunda me deixou preso sem asas e braços, sem ter como cumprir o meu dever... Eu existo pra isso! Por que vocês semideuses precisam interferir?! – ele gritou. – Eu fui criado para isso, nenhum de vocês tinha o direito de negar a minha existência.
- Como saiu de sua prisão? Estava fortemente protegida. – respondeu John colocando sua foice em posição.
-"Recebi uma ajuda digamos que quase divina. – Ele gargalhou, tentei me concentrar e encontrar de onde vinha seu som, mas vinha de todos os lados. – Essa ajuda me pediu para pegar sangue de uma filha da Iara com o Negro D' Água em troca de minha liberdade e total reconstrução. E claro que não vou dizer quem, vamos acabar com isso rapidamente. Eu ouvi todo o plano de vocês contra mim, patético. Vocês são semideuses, não frequentam a igreja, isso já é o bastante para eu sugar seus sangues até a última gota, mas eu posso deixar vocês em paz desta vez, se me entregarem ela.
- Sinto muito, Edward Cullen, mas vai ter que jantar em outro lugar. – respondeu Yancy.
Edward Cullen?! Se eu não estivesse apavorado, com certeza teria rido.
-Vem aqui, rápido! – exclamou Ágata criando uma proteção com sua magia. Rafaela correu com Iariadéte para dentro dela, Victor correu atrás, carregando de maneira desajeitada o corpo do Negro D'água.
-"Pois bem, vai ser do jeito que faz meu sangue ferver." – respondeu ele e um forte cheiro de sangue tomou conta de todo o local, um cheiro tão tóxico que está causando diversas voltas em meu estômago. O Sangue que estava na água logo sumiu em meio a escuridão. – Asa espantosa! Devorem todos eles meus filhos!
-CUIDADO! – berrou Yancy. Milhares, não, milhões de morcegos surgiram da escuridão em nossa direção. Eles não são morcegos comuns, o som que eles emitem é insuportável. Tainá se adiantou e criou uma corrente de ar que lançou vários para longe. John cortava todos com sua foice sem qualquer problema, os morcegos não caiam mortos no chão, eles simplesmente desapareciam no ar. Victor saiu da proteção e lançou projéteis de gelo afiados que foram acertando todos os que podiam, mas mais continuavam vindo. Eles vieram em minha direção, uma saravaia de morcegos, ainda me sinto tonto e enjoado por causa do odor de sangue, apertei o botão de minha pequena espada e ela se transformou em uma lamina enorme, pronta para ser usada. Mas o pânico falou mais alto quando vi aqueles bichos vindo a toda velocidade em minha direção, mas antes que eles pudessem me alcançar, um clarão azul os acertou e os torrou totalmente. Foi um raio mandado por Yancy.
- Vai na proteção feita por Ágata! – exclamou ele. – Aqui fora você só vai por sua vida em risco!
Neste momento as palavras de John me vieram na mente.
"Você não tem treino, só vai nos atrapalhar"
Isso é verdade, todo mundo está fazendo algo, suportando esse fedor e esses morcegos e eu estou aqui...totalmente desesperado sem saber como lutar e o que fazer!
A chuva começou cair em cima de todos nós, com certeza Yancy mudou seu foco para poder lutar! Quando a chama se apagou, Ágata jogou uma bola se luz no alto e a mesma começou a clarear todo o local que estamos. Rafaela que até então estava dentro da barreira, saiu e fez cactos enormes brotarem do chão, eles começaram a disparar espinhos em direção dos morcegos como se fossem balas de uma arma contínua.
-Apareça, desgraçado! – exclamou John. – Yancy! Ainda não sabe onde ele esta?!
- Não! – exclamou ele.
-"Desistam!" – berrou o Encourado. – Chicote Sangrento!"
Um chicote de sangue emergiu em meio ao escuro, acertando as pernas de Victor, que lutava distraído, o chicote o derrubou no chão, os morcegos avançaram por cima dele, mas foram impedidos por John que o protegeu lançando uma chama roxa, queimando as criaturas!
-Ali! – Yancy e Tainá voaram como um jato acima do rio na escuridão imersa da chuva.
-Kauê! Sai daí! Vai na proteção! – gritou John.
Todos ouviram um choque de espadas, uma explosão de ar atingiu o solo perto de Rafaela.
BARUUM!!!
Um raio desceu dos céus e um grito engasgado de horror fora ouvido por todos, uma forte corrente de vento atingiu todos nós, e um corpo caiu com toda a velocidade no solo perto de Rafaela. Era ele, o Encourado, seu corpo estava estático, como se a queda tivesse e com certeza doeu muito, ele é todo revestido com roupa de couro preta, suas asas enormes de morcego estavam abertas, ele tem enormes garras nas mãos, era difícil ver seu rosto, ele parecia escondido por uma sombra, mas seus olhos vermelhos eram enormes e hipnotizantes, o odor de sangue que vinha si estava tão forte que era possível ver uma névoa sangrenta no ar. Meus olhos até mesmo ardem e não era apenas comigo, Ágata e os outros pareciam sufocados com tal odor.
-Malditos! – ele gritou se levantando e abrindo suas asas, ele olhava para Yancy e Tainá que estavam voando tentando matar todos aqueles morcegos. Ele fechou suas enormes asas em torno de si como se fosse uma capa e depois as abriu com um grito. – Asa Espantosa!
Mais milhares de morcegos surgiram de dentro si e voaram rapidamente em direção a todos. São milhões! Um veio em minha direção, em uma altura burra, me defendi com o braço e ele o arranhou com suas garras, para afasta-lo, eu empunhei a espada e consegui cotar-lhe uma asa, ele caiu no chão se debatendo e se transformou em uma pilha de pó negra. O Encourado ergueu a mão e todos se uniram ao nosso redor.
-Agora! Som da morte, meus filhos! Não irá estourar tímpanos desses humanos, mas irá fazer eles desmaiarem em pouco tempo! – gritou o Encourado e todos os morcegos abriram suas bocas e delas saiu um som ardido e turbulento, um são mais insuportável do que qualquer coisa que já ouvi na minha vida. Eu levei minhas mãos aos meus ouvidos, não estava aguentando, minha visão está ficando turva, meus ouvidos estão doendo muito! Eu preciso fazer alguma coisa! Mas o quê?! Uma maldita dor no estômago começou, merda! Logo agora?! O Encourado virou sua face aterrorizante para mim, ele parecia fungar o ar.
-Interessante. – disse ele de forma animada e em um instante chegou até mim, me segurando pela camisa e me erguendo no ar, ele lambeu o sangue do ferimento que o norte do havia feito em meu braço, sua língua é carnuda e cheia de feridas. – Seu sangue tem um cheiro e gosto maravilhosos, me sinto até mais forte apenas com o pouco que lambi, nunca senti isso antes, você me chamou atenção desde quando pousou com aquela criatura híbrida no início do rio, uma energia sombria rondeia você, gosto disso.
Ele lambeu meu rosto, que nojo!
-Kauê! – gritou Ágata abaixada, sua mão esquerda estava tentando manter a proteção ativa enquanto a direita tampava seu nariz.
-Parece que sua magia não pode conter o meu odor sangrento. – disse ele rindo. – Isso é ótimo, logo irá desmaiar e essa linda sereia será da minha benfeitora e levarei este garoto peculiar comigo.
Não! Comecei a me debater, sinto que estou perdendo os sentidos por causa desse cheiro e esse barulho horrível, mas eu senti outra coisa. Um arrepio por todo o corpo, uma forte queimação por toda parte, eu não sei o que aconteceu, mas o Encourado me jogou no chão e começou a se afastar lentamente, levando as mãos a cabeça e começou a gritar.
-Não! Não! – berrou ele, parecia apavorado. – Sai de perto de mim!
Eu não estou entendendo nada! Ele caiu no chão e de repente começou a rir como um pouco histérico, ele até mesmo arrancou as próprias asas com as mãos, rindo! Como se estivesse sobre o efeito do gás do Coringa.
-Saia! Saia! – berrou ele. Os morcegos que estavam em nossa volta foram desaparecendo. O Encourado urrou! Ele enfiou as próprias garras nos olhos! – SAI DA MINHA CABEÇA!
Em uma cena horrorosa, ele enfiou sua mão esquerda inteira na própria cabeça e com a direita, ele forçou a cabeça até ela sair por inteiro e cair ao seu lado... a última coisa que vi foi seu corpo sem vida desabar no chão e tudo ficou escuro...
...
Não sei quanto tempo fiquei desacordado, mas quando abri os olhos, me senti melhor. Yancy estava sentado ao meu lado, eu estava deitado em um monte de algas.
-Se sente melhor? – perguntou ele.
- Eu acho que sim, por acaso eu desmaiei de novo? – questionei.
- Só perdeu os sentidos por causa do cheiro e o barulho que o Encourado estava causando, foi demais para seu corpo e mente sem preparo e treino. – respondeu ele estendendo a mão. – Normal, no fim, eu acho que você salvou a gente.
- Eu?! – exclamei pegando sua mão, ela está bem gelada.
-Se alguma forma você fez algo, só pode ter sido você. – respondeu ele. – Seu corpo se desgastou da mesma forma que nós quando usamos nossas habilidades de semideus, você deve ter usado a loucura.
-Loucura? – questionei.
-Seu pai é o Deus da loucura, seu poder é tão intenso que ele pode fazer qualquer pessoa ou criatura perder a sanidade ou até morrer... como aconteceu com o Encourado.
As cenas do Encourado se suicidando, gritando e berrando de dor vieram a minha mente... Eu fiz aquilo? Eu fiz aquela coisa horrível? Eu me sinto um pouco mal por isso... mas ao mesmo tempo me sinto bem, forte.
-Esta tudo bem? – Yancy tocou meu ombro. – Talvez seja um pouco demais para você absorver... acredite, eu sei. Seus poderes estão começando a se desenvolver, isso é bom, vai precisar deles.
-Você não está com medo? – perguntei, pois eu estou um pouco apavorado.
- Não. – respondeu ele em um tão sério, endurecendo seu olhar. – Não tenho medo de seus poderes ou de você, mas medo de que você possa se machucar ou se prejudicar ao usá-los, por isso treino, paciência e foco são importantes. Você não pode usar seus poderes e desmaiar depois, se estivesse sozinho nem quero imaginar o que poderia ter acontecido, você está entendendo?
- Estou... minha boca amargou – Eu sei que só estou atrapalhando vocês.
Yancy demorou um pouco para responder, ele me encarou por um tempo. Como Ágata disse... É impossível saber ou imaginar o que ele pode estar pensando.
- Eu não diria dessa forma, eu Ágata e eu tínhamos um plano contra todos aqueles morcegos, iríamos usar uma energia absurda, mas graças a você, não precisamos fazer isso. – Ele suavizou seu olhar e levou seus dedos até minha testa em um toque. – Obrigado.
Eu assenti com a cabeça, sorrindo de canto. Reparei que só havia Yancy por aqui.
-E os outros? – perguntei.
- Rafaela terminou o antídoto, ela curou a garota. As menina está bem e nem sabe o que aconteceu, ela já está com sua família. Victor, John e Ágata foram ser livrar das partes do Encourado, Victor os congelou a cabeça usando o máximo de seus poderes e Ágata a prendeu em um lugar usando magia, John enterrou o resto do corpo em uma longa distância. Desta vez John achou melhor não usar feitiços de proteção, eles sempre acabam chamando a atenção de quem não se deve. Tainá está com seu papagaio, ele passou mal por sua causa. A Iariadéte conseguiu curar o Negro D'água, ele conseguiu se recuperar, mas precisará um longo tempo na água, ele agradeceu por sua ajuda e pediu desculpas pelo mal jeito que trouxe até aqui. Basicamente só estávamos esperando você acordar.
Um papagaio totalmente branco voou até o ombro de Yancy, ele fez um carinho nele. Atrás de si tinham outros, inclusive o Rajada.
-O Deus Pólo acabou de trazer eles. – Yancy sorriu. – Eles ganharam habilidades interessantes, ele disse que o seu será o próximo a ser levado em breve para sofrer um upgrade.
Upgrade?
-Rafael, nós temos que ir. – murmurou seu papagaio.
Rafael? Aé, esse é o nome real dele, me esqueço disso.
-Eu sei, Tornado, nós iremos logo. – suspirou ele. – Precisamos nos apressar, já perdemos um dia inteiro aqui e o tempo não está a nosso favor...
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Livro 1: Kauê e os filhos da Amazônia - O Herdeiro Do Submundo
FantasyTodas as divindades existem, cada uma em sua esfera de controle. No Brasil predominam os deuses brasileiros dos povos indígenas. E como todos os seres divinos ao redor do mundo, eles adoram abrir uma fábrica de filhos, essas crianças são semideuses...