Capítulo 27 - Meu pai me manda uma mensagem

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Me lembro de ser o último a dormir, mas quando abri meus olhos, não havia ninguém comigo. A van havia desaparecido, assim como todos. Tudo que podia ver era uma imensa escuridão. Corri, gritei, mas não havia nada, não havia ninguém. Tudo que eu sentia era frio, um frio tão cortante que meus ossos começaram a doer. Isso até surgir uma pálida luz ao longe, não era uma luz comum. Ela pareceria ter forma, parecia viva... Eu não sabia o porquê, mas comecei a persegui-la. Eu corria sem saber onde pisava, apenas olhava para frente e o único som que eu ouvia eram os meus passos. Isso até ouvir que pisei em algo líquido, não conseguia ver o que era, mas um forte e sufocante odor chegou as minhas narinas. Um cheiro de ferro... O que é isso? Levei minha mão até o chão e toquei no líquido, ele está quente e seu cheiro... é igual do Encourado. É sangue, estou pisando em uma poça de sangue. Sinto um arrepio assustador por todo meu corpo. Antes que eu pudesse correr para tentar sair dali, a luz que eu seguia se tornou mais forte, a ponto de conseguir enxergar o que está em minha frente, um caminho coberto por sangue. Mas de onde vem tudo isso?! Logo comecei a ouvir vozes, diversas vozes, eu não conseguia entender o que diziam, mas eu consegui identificar algumas delas, Raoni estava falando, Ágata, Yancy, John... Mas o que eles estão dizendo?! Tapei meus ouvidos com força, com certeza estou tendo um pesadelo! Acorda! Acorda! Mas não adiantou, as vozes continuavam a berrar.

- Você matou todos nós! – ouvi a voz de Yancy.

-A culpa é sua! – exclamou Ágata.

-Eu avisei! Mas ninguém me ouviu, ele é um monstro! Um demônio como o pai dele! – gritou Raoni.

A luz se aproximava mais e mais. Uma luz azulada com dois pontos laranjas no alto. Aos poucos ela foi tomando forma, seus cascos não pisavam na poça de sangue, é um veado. Um enorme veado branco luminoso com olhos alaranjados, seus cascos estavam presos com correntes, correntes douradas.

Ele fez um som com sua boca e as vozes pararam por um minuto. O veado se aproximou de mim, posso sentir um calor vindo de seu corpo brilhoso. Seus olhos, são tão alaranjados quanto os meus e por alguma razão, eles me são familiares. Assim como o animal, eu sinto que eu deveria conhecê-lo. Ele levou seu rosto ao meu e estragou seu nariz na minha bochecha, todo o medo que eu estava sentindo até agora se foi um pouco.

- Quem é você? – perguntei tentando levar a mão até sua cabeça para fazer um carinho. Será que é meu pai? Me lembrei que o veado é a forma favorita que ele assume, pelo menos é o que está no guia que recebi da escola. Curvei meu lábio, ele tremia, parece que não consigo dizer tal palavra sem sentir outra coisa a não ser medo, raiva ou ressentimento.

-Pai? – Sussurrei mais para mim do que para ele.

Ele se afastou de mim e urrou, um som aterrorizante. Ele abriu a boca, da mesma saiu uma névoa branca que aos poucos ia tomando forma de um enorme círculo, não conseguia entender até imagens começarem a surgir. Imagens de uma caixa, uma pequena caixa de madeira com um símbolo de caveira estampado na fechadura. Junto da caixa surgiu um livro com páginas amarelas, ele estava lacrado com algum tipo de cadeado e por último surgiu a imagem de um cajado, um cajado de madeira com a ponta com cabeça de caveira com chifres de veado.

O que são essas coisas?

Ele fez mais um som e a imagem tremulou, mostrando uma mulher, por um momento eu achei que fosse minha avó, mas rapidamente a imagem revelou uma velha horrível, totalmente desfigurada com uma enorme cauda de jacaré.

-A cuca? – questionei. – O que quer me dizer?

Desta vez ele não fez qualquer som, a névoa desapareceu. O veado começou a se contorcer, como se as correntes em sua apenas estivessem puxando ele. O som que ele produz é o pior possível.

-O que está havendo?! – exclamei. – Pai!

Eu tentei ajudá-lo de alguma forma, mas quando toquei nas correntes, minhas mãos atravessaram elas. Olhei para seu rosto, ele chorava, chorava lágrimas de sangue que caiam uma por uma na poça abaixo de nós. Ele se aproximou de mim rapidamente e lambeu meu rosto e depois desapareceu totalmente.

- Pai! – gritei mais uma vez e nada. Tudo voltou a ser o silêncio que estava antes.

-Seu pai não pode ajudá-lo! Seu aborto da natureza!  – exclamou aquela voz de mulher, a mesma voz que ouvi em Eldorado no ataque dos bestas feras. – Seus amigos irão morrer por sua culpa!

O Sangue abaixo de mim começou a se mover, ele subiu pelas minhas pernas me prendendo e começou a me puxar para baixo! Eu nem pude gritar, pois ele subiu até minha boca, me afundando em seu calor sufocante...

- Kauê! Kauê! Acorda! Acorda, idiota! – ouvi a voz de Victor.

-AH! – gritei ao abrir meus olhos e ele estava parado olhando pra mim com o olhar assustado. Antes que qualquer um de nós pudesse dizer qualquer coisa, a van balançou, jogando Victor e eu para os lados.

Acabei parando em cima de George que batia suas asas em pânico, todos os papagaios, inclusive o meu voavam acima de nós, com certeza tentando evitar de serem lançados para os lados. Rafaela estava se segurando no assento. Mas o que está acontecendo?! Onde está Yancy? Ágata? John e Taina?

-Furacão desgraçado! – bufou Victor.
A van virou mais uma vez, rodopiou totalmente nos jogando de cima para baixo.

Um trovão explodiu do lado de fora, um raio acertou a parte de trás da van que começou a cair em alta velocidade!

-Inferno! – berrou Victor.

Estávamos quase chegando ao chão! Vamos morrer!

O teto da van explodiu e Ágata entrou com Yancy e John.

-Rápido! Todos fiquem juntos! Agora! – gritou Yancy. Nós o fizemos e no mesmo instante, antes a van atingisse o solo, um clarão de um raio nos iluminou e segundos depois senti meu corpo cair em cima de um gramado e um tanto distante de nós, pude ouvir o impacto da van caindo no chão e fazendo o solo abaixo de nós tremer e ela explodir. O vento estava forte, acima de nós um tornado enorme puxava as nuvens fazendo um buraco no céu, ao redor dele haviam diversas pessoas voando e posso ver Tainá junto deles. Ágata foi a primeira a se levantar.

-Rafaela, rápido, tem algum tipo de túnel abaixo de nós feito pela legião para nos protegermos, abra uma passagem no solo! – exclamou ela.
-Depressa, Rafaela! – gritou uma voz abafada com o vento. Era uma garota, eu já a vi antes em Eldorado. Ela está alguns metros distante de nós e raízes de árvore a seguravam. – Tem um túnel abaixo onde estamos todos nos protegendo!

Rafaela pareceu entender o que ela disse, em apenas alguns segundos, ela bateu o pé no chão e logo o solo começou a afundar junto conosco, logo não conseguia mais sentir o vento forte e tudo estava ficando escuro e abafado.

- Tem pessoas abaixo de nós. – bufou Ágata, sua voz saiu de forma abafada, como se estivesse exausta. – Diversos semideuses. Eles foram rápidos em se abrigarem.

- Está escuro, muito escuro! – reclamou Victor. – Não estou vendo nada!

-Oh! Pelas cuecas de meu pai, que terrível! – respondeu Yancy e ouvi John rir por alguns segundos.

- Tem medo de escuro, Victor? – questionou John.

- Não, claro que não. – respondeu o filho do deus do inverno, mas tenho quase certeza que isso é mentira.
Olhei para os lados, acabei de perceber que os papagaios não estão conosco e George... será que ele caiu junto com a van?!

- Yancy, pra onde você mandou os papagaios? – perguntou Ágata.
-Enviei para aquela floresta que você me mostrou, Tainá pediu para eles ficarem por lá até ela e seus irmãos controlarem a situação. – respondeu ele. Mas e George?!

-Finalmente! Luz! – Victor apontou para um local iluminado com algum tipo de luz. Eram tochas,  tochas de fogo presas na parede.

Nos aproximamos, a escuridão foi desaparecendo e podemos ver vários semideuses em alguns cantos, alguns feridos com sangue escorrendo de seus machucados.

-Rafa! Achei que não fossem sobreviver! – João, o garoto que me salvou do Capelobo junto de Tainá veio em nossa direção e deu um abraço em Rafaela, que demorou um pouco para retribuir.

-Estou bem, estamos bem, João. – respondeu ela.

-É um milagre, vocês poderiam ter morrido. – disse ele virando o olhar para mim. – Kauê? Já te deixaram vir em missões? Mesmo com seu histórico de problemático? Sem treino?

- Bom... – eu nem sabia o que dizer.

-João, o que aconteceu? – perguntou Ágata nos interrompendo e algo me diz que devo agradecer ela por isso.  – Lá em cima, os filhos de Polo disseram que o tornado surgiu do nada. Como isso é possível?

-Não sei, houve uma onda de energia antes dos ventos começarem, pelo menos foi isso que seus irmãos disseram. – respondeu ele. – Acreditamos que foi a Cuca, ela está aqui no Sudeste, estou rastreado os passos dela a dias. Ela estava em São Paulo e depois veio até aqui em Minas Gerais, a sigo desde então, mas perdi seu rastro.

- Não, não acho que tenha sido a Cuca. – respondeu Yancy, seu olhar estava sério e analítico. – O tornado estava muito forte, ela não tem este tipo de poder, mesmo usando sua magia.
-Então quem poderia ter sido? – questionou João. – Somente os deuses tem poderes astronômicos assim, com certeza não foram eles.

- Eu sei quem! – uma mulher indígena surgiu de um dos túneis, ela estava com o braço enfaixado. Ela é enorme, alta e forte. Ela se aproximou de nós com os olhos fixos em mim. – Você! Foi você!

Eu?! Como assim?!

Ela me pegou pela camisa, me levantando no alto.

-Solta ele, Bárbara! – exclamou Ágata.

-Quieta, irmã do traidor! Todos vocês deveriam ser presos por não terem mandado ele de volta quando o encontraram! – Ela cuspiu as palavras. - As notícias chegaram mais cedo! Ele fugiu de Eldorado sem permissão e roubou a espada Celestial.

Merda! Todos já descobriram! Com certeza a deusa Caipora deu com a língua nos dentes! E agora?! Será que Robert está bem?! Será que descobriram que ele me ajudou?! Espera! Eu roubei o quê?

-Ok, eu fugi, mas não roubei espada cereal nenhuma! – respondi, um tanto nervoso. 

-Você fugiu?! – exclamou João.

-CELESTIAL! Sua aberração da natureza!  Igual seu pai! – exclamou ela, seus olhos brilharam como uma chama, senti calor e sua mão começou a esquentar. – Pela lei, eu tenho total permissão para te transformar em cinzas aqui e agora!

-Barbara, pare. – Yancy pegou em seu pulso. – Não pode matar ele, ele está sob a justificação do Conselho. Ainda não foi dado um veredicto.

- Yancy, que tipo de Cacique você quer ser se não segue as regras?! – exclamou ela. – Ele cometeu erros, fugiu, roubou a nossa arma mais poderosa! Sem dizer de tudo que ele já fez antes. A existência dele é uma afronta aos deuses! Faz todo o sentido, o tornado somente apareceu quando vocês chegaram aqui, pergunte aos outros, isso é um castigo! Seu pai deveria estar tentando elimina-lo!

- Não fale por meu pai! – respondeu Yancy e um trovão explodiu acima do solo e todo local que estamos começou a tremer.

-Calma, Yancy. – pediu Rafaela se aproximando e encarando Barbara. – Vamos todos relaxar.

-Run, quieta, quando a conversa chegar no Natal, talvez eu peça a opinião da leitoa. – respondeu Barbara e em instante ela gritou de dor e me soltou.

- Você me deu um choque! – exclamou e apontando para Yancy.

-  Sabe que não gosto de violência, mas você pediu. – respondeu Yancy dando de ombros. – Não gosto de nenhum tipo de preconceito, da próxima vez que falar assim com ela, você não vai saber de onde virá o raio que irá torrar sua língua cumprida.

-Barbara, pare de ser idiota, se possível. – respondeu John. – Você não entende a vontade dos deuses, não pode especular dessa forma. Nosso Senhor Tupã pode te fulminar por dar falso testemunho dessa forma. Que atitude é essa? Parece que foi infectada pela burrice do Raoni.
Ela fuzilou ele com o olhar e ele não pareceu se intimidar, mostrando um olhar de desdém.

-Vamos nos acalmar, não é você que deve julgar isso, Bárbara. – Victor interviu e uma corrente gelada começou a exalar no local. Senti que Barbara parou de esquentar.
-Meus poderes, o que está fazendo?! – Ela olhou para Victor, rosnando.
-Te dando uma esfriada. – respondeu ele. – Sugiro que se acalme, somos todos amigos aqui.

-Seu picolé inútil! Por que não vai chorar pelos cantos por sua vovozinha zumbi! – exclamou ela.
Victor semicerrou os punhos, seu olhar se encheu de fúria e ele parecia a ponto de dar uns tapas nela.
-Eu vou congelar a sua língua e sua cabeça toda! Sua cobra venenosa! – exclamou ele, mas Ágata o impediu.
- Não! É isso que ela quer. – exclamou Ágata. – Bárbara! Qual seu problema? Se acalme e pare!

-Eu vou me acalmar quando ele fizer onde está a espada! – exclamou ela. – Equipes de busca estão caçando ele por todo o Brasil! E ele estava lá com vocês?! Por acaso algum de vocês ajudou ele a fugir?! Não me surpreenderia, do jeito que o defendem. Bem que Raoni suspeitava.

Raoni... agora está explicado o porquê dela ser tão miss simpatia.
-Barbara, pare com isso. Você não sabe se o que está dizendo é verdade. – disse João. – Você só está nervosa por causa da adrenalina do momento.

- Eu devia... – ela não terminou de dizer, pois fora interrompida por uma garota.

-João! Os filhos de Polo conseguiram neutralizar o tornado!  – Já podemos sair.

-Ótimo! Vamos sair e você será preso! – exclamou ela olhando para mim. – É uma ordem da 2° comandante da legião do Sudeste. Conhece as regras, Yancy, sabe que ele está errado. A atitude só prova o que pensamos dele. Nem o Pajécique pode negar isso.
-É o que veremos. – respondeu Ágata, a desafiando. – Rafaela, por favor.
Ágata nos envolveu com um escudo de luz e Rafaela nos levou de volta a superfície com apenas uma batida com seu pé. Ao sair, pude ver o enrole estrago e a destruição que o tornado causou. Árvores arrancadas, o solo destruído, uma visão de fim de mundo.

-Venham! Vamos sair antes que peguem o Kauê! – exclamou Ágata.
-Não. – disse Yancy. – Se fugirmos, só estaremos piorando as coisas. Kauê errou, ele não deveria ter saído. Lá ele estava seguro sob a proteção de meu irmão, mas ao fugir, ele colocou essa proteção em risco.

- Como é? – questionou Ágata, furiosa. – De que lado você está?
-Ágata, sabe que as coisa não são simples. Admito que erramos em deixar ele vir conosco, além de sabermos que ele fugiu, colocamos em risco a nossa sorte. A lei universal é somente: 6 semideuses, três garotos e três garotas, ele virou um 4° membro masculino, um sétimo semideus. Isso com certeza cedo ou tarde resultaria em alguma tragédia. – respondeu ele. – Tenho dúvidas sobre esse furacão, mas pode muito bem ter sido uma punição dos deuses.

Não nego que ver Yancy falar assim me deixou mal, talvez por causa de minha estupidez, eu causei essa destruição. Eu sou o culpado por essa cena horrível?!

- Foi um risco que assumimos. – respondeu John. – Não podíamos simplesmente deixar ele voltar. E essa história da espada roubada? Não foi ele, nós pagamos a bolsa dele, não tinha nada lá além de sanduíches e algumas armas normais para proteção.

-Sei disso. – Yancy suspirou. – Seria divertido, mas se levarmos ele, toda a legião comandada por Barbara irá atrás de nós e não temos tempo para brigas assim. Ela não quer escutar a gente, mas sei de alguém que ela precisa escutar.

Yancy assobiou.

-Ali! – ouvi a voz de Barbara, ela estava junto de outros semideuses. Praticamente toda a legião que estava embaixo da terra saiu. Um grupo de pelo menos 50 pessoas.

Um deles lançou um cipó que alcançou meus pulsos e me prendeu no mesmo instante.

Mas antes que pudessem me puxar, alguma coisa cortou o cipó e Tainá desceu voando ao meu lado.

-O que está acontecendo?! – exclamou ela bufando e respirando lentamente, ela está muito pálida. Com certeza o esforço físico foi enorme.

Outros também chegaram voando e se colocaram ao lado de Barbara.
- Só faltava você, a outra traidora! – exclamou Barbara.

-Chega, Bárbara! – exclamou João saindo do subsolo.

- Yancy! Me chamou! – O papagaio dele passou voando por nós, até seu braço  como se fosse um raio.

-Sim, é hora de estrear a bênção que Polo deu a você. – respondeu ele. – Preciso que grave uma mensagem para nosso senhor Pajécique e o Conselho.

-Vai enviar justo o seu?! – exclamou Barbara. – O meu também vai! Por precaução.

Ela assobiou e um papagaio amarelo veio voando.

- Vamos começar então. – respondeu ela.

Yancy e ela começaram a falar, sobre tudo, ou quase tudo, pelo menos Yancy ocultou a parte do George... E falando nele... Eu preciso chegar até a van... Eu preciso saber se está vivo ou se escapou.

Eu me afastei um pouco de todos, minha cabeça está maluca... meus sentidos estão... Eu não fiz nada! Eu não...  o jeito que aquela Barbara me olhou e me ameaçou, ela quer mesmo me matar. Sei que errei, mas não sei... Não acho que esse desastre seja culpa minha... Será meus poderes de mau agouro?! Será que posso exalar azar dessa forma?!

“Seus amigos irão morrer por sua causa"

As palavras daquela mulher do pesadelo ainda ecoam na minha mente... sem dizer tudo aquilo... O que o veado queria me dizer? O que meu pai queria me dizer?! Será que era mesmo ele?! O que eu devo fazer?! Por favor meu Deus!!! Me ajuda! Me ajuda!!! Que ódio! Que raiva! Sinto meu corpo formigar novamente, exatamente aquela mesma sensação quando usei meus poderes contra o Encourado... Estou com tanta raiva de tudo ser minha culpa e eu não ter feito nada!

Barbara começou a berrar, ela apontou para mim e disse pra toda legião que estava ali que com certeza eu sou o culpado pelo desastre. Não sei dizer o que eles pensam sobre isso, mas só seus olhares já me bastam.
Eles enviaram os papagaios. Os nossos que está escondidos nas árvores vieram voando, posso dizer que é um alívio ver que o meu está bem.
-Purê! Você está vivo! – exclamou ele pousando em minha cabeça. – O que foi?

Eu me afastei um pouco com ele.

-E o George?! Ele está bem?! – perguntei desesperado. Nem quero imaginar o que Robert iria me dizer se George morrer!

-Sim, o filho do Raiko ali mandou ele de volta para o Acre. – respondeu meu papagaio olhando para Yancy. – Eu também fiquei preocupado, mas o papagaio dele me contou que no último instante na van, ele conseguiu transporta-lo de volta.

Yancy salvou ele... que alívio.

-O que está havendo? Por que aquela vaca ali está falando essas coisas de você?! Só eu posso falar mal de você por aqui. – reclamou ele. – Eu vou cara e na cabeça dela!

- Não! – exclamei.

-Realmente eu adoraria ver isso. – disse Yancy se aproximando. – Mas é melhor evitar mais encrenca.
Yancy está com o olhar cansado, como se não aguentasse ficar em pé.

- Você está bem? – questionei.
-Estou, só me esforcei muito tentando parar o furacão e depois teleportar todo mundo para fora da van no último minuto. – suspirou ele. – E discutir com quem perdeu a capacidade de ouvir também ajuda a esgotar.

-Me desculpe. – respondi. – Tudo isso é por minha causa.

- Não, não tem culpa de nada. – respondeu ele. – Ninguém tem culpa se algumas pessoas preferem se apegar a ignorância e ao medo ao invés da razão. Sei que você não é o culpado, os deuses jamais mandaram um furacão pra te matar, ainda mais pra causar toda essa destruição. Eles prezam muito a natureza e a vida pra isso. Esse furacão surgiu por outro motivo e posso dizer que quase sei qual, mas não tenho certeza.
-Qual motivo? Do que você suspeita? – questionei.

- Não posso falar nada sem ter certeza, Kauê, você poderia trazer a sua mochila até aqui? – questionou ele. 
-A mochila que eu trouxe comigo? Mas ela foi destruída com a van. – respondi.

- Não, elas são protegidas com magia. Todas as nossas armas estão lá, intactas nos destroços. – respondeu ele. – Vá, Victor irá com você.
-Tudo bem. – respondi. – E obrigado por, aquilo com o falconça, ajudou muito.

Ele sorriu.

-De nada. – tinha quase certeza que ele iria tocar minha testa com os dedos como sempre faz, mas a mão dele foi até seu nariz, que começou a sangrar.

- Yancy! O que foi?! – exclamei.

- Nada, vá. – respondeu ele levantando voo. – É importante, pegue a mochila.

-Vamos, novato! Temos 15 minutos pra voltar antes que a desgraçada ali de chilique de novo. – respondeu Victor andando rápido, passando por mim.

...

Livro 1: Kauê e os filhos da Amazônia - O Herdeiro Do SubmundoOnde histórias criam vida. Descubra agora