Capítulo 48 Bônus

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Ano de 1998...
Lizandra desceu do ônibus, olhou o relógio no pulso esquerdo e apressou o passo entrando no bosque de pinheiros ao lado do estádio de futebol da universidade. Não era o lugar mais adequado para cortar caminho, era perigoso, mas a próxima aula seria praticamente do outro lado do campus e já estava atrasada. O final do semestre já se aproximava e não podia perder mais nenhuma aula da disciplina do professor Luis Felipe. Ele não admitia atrasos, mesmo sabendo que muitos trabalhavam e que às vezes, era quase impossível chegar no horário e este era o caso dela.
Assim que chegou à cidade de Pelotas, logo arranjou um emprego de vendedora numa loja de roupas, à tarde, para ajudar a mãe a custear as despesas de seus estudos. Por vezes, ela se atrasava para algumas aulas, devido ao movimento da loja.
Respirou fundo, ajeitou a mochila no ombro, segurou sua barriga de 5 meses e olhando para os lados, andou rápido pelo caminho forrado de folhagens que caíam das altas árvores. Já começava a escurecer e o frio do mês de junho, açoitava sua face e deixava as mãos, mesmo de luvas, encarangadas. Fez uma careta quando sentiu uma fisgada no baixo ventre. Sua bebê já começava a dar os primeiros sinais, exatamente no tempo, que a médica havia previsto. Sorriu de prazer por saber que tudo corria bem.
Para espantar o temor de atravessar o bosque sozinha, fixou seus pensamentos nas lembranças da Fazenda Pampas e em Augusto, o homem por quem tinha se apaixonado loucamente há cerca de um ano e meio.
Quanta decepção com seu primeiro amor! Descobrira da pior forma como os homens podem ser cafajestes quando querem enganar uma mulher e como as consequências de amar o homem errado podem ser devastadoras.
Por ser filha de Rute, Lizandra foi contratada para que fosse cuidadora da esposa de Augusto, que estava numa fase terminal de um câncer.
Com 18 anos e já formada no ensino médio, deixou a casa dos tios, na cidade vizinha, onde morava para estudar e passou a cuidar de Lúcia Primeiro, no hospital e depois, na fazenda.
De início, Lizandra admirava o amor, o cuidado e a devoção que o homem de porte viril, charmoso, de cabelos num tom de loiro escuro e olhos castanhos claros, tinha para com a mulher que amava. Por vezes, o encontrou chorando depois de ajudá-la com a esposa. Estava arrasado com a fatalidade daquela doença, a qual sabia que Lúcia não tinha chances de vencer. Com a convivência dentro da casa, a admiração de Lizandra foi tomando forma e se transformou em uma amizade íntima, onde ela era a ouvinte das preocupações, ansiedades e angústias de Augusto, e como não poderia deixar de ser, Lizandra, acabou se apaixonando. Augusto sequer desconfiava do amor que nutria por ele e assim foi até a morte de Lúcia.
Lizandra, sem ter para onde ir, continuou na fazenda, sob os cuidados de Rute e então, inevitavelmente, seis meses depois, numa noite de tempestade, sozinhos na casa, ela entregou o seu corpo pela primeira vez e seu amor a Augusto. Os dois viviam um romance escondido de todos, menos de Antônio, o primo, que os surpreendeu certa vez, num beijo apaixonado.
Lizandra esperava, com ilusão, que Augusto a assumiria e encarava aquela demora toda dele para contar a Rute, como um sinal de respeito para com a esposa falecida recentemente.
No entanto, Lizandra descobriu, depois de uma discussão acirrada de Augusto com o primo, que o motivo da briga havia sido por ciúmes. O desentendimento aconteceu porque Antônio descobriu que Augusto era um traidor, que enganava tanto a ele quanto Lizandra.
Augusto e Antônio disputavam o mesmo amor. Ambos eram amantes da mesma mulher na capital gaúcha. A partir dali, os dois cortaram relações para sempre. Lizandra então, entendeu o motivo das viagens constantes e a demora em assumi-la como namorada.
Arrasada, não aceitou a traição e acabou rompendo o relacionamento, mesmo contra a vontade de Augusto, que insistia em afirmar que a amante não significava nada, que a amava e que a queria para viverem uma vida juntos.
Implorando para que ficasse, ele viu, com o coração apertado, Lizandra, orgulhosa, partir para sempre da fazenda. O final do romance aconteceu sem brigas, apenas com uma conversa séria.
Embora fosse jovem, não deixou que a ilusão a dominasse. Augusto era um homem riquíssimo e jamais assumiria a filha de uma empregada. Tinha sido uma diversão e era preciso encarar a realidade dos fatos. Agora, o que lhe restava era estudar muito e vencer. Tinha sonhos, era jovem e pretendia realizá-los junto com a filha. Não foram raras às vezes, em que pensou em contar sobre sua gravidez a Augusto, mas numa dessas desistiu totalmente, quando por telefone, há alguns dias, a mãe comentou, alegre, que ele havia casado na capital e levado para a fazendo a esposa, muito bonita, a qual também tinha uma filha quase da mesma idade de Vítor.
Seu erro foi esse, ficou esperando uma atitude de Augusto que provasse seu amor por ela, para poder contar sobre a menina que esperava.
Lizandra agora, se recusava a fazer o papel da ex namorada vingativa, usando uma criança para atrapalhar a felicidade do casal. Também tinha uma certa mágoa por ele nunca ter lhe procurado em Pelotas e insistido para que ela voltasse. Tal atitude, mostrava claramente, que nunca tinha lhe amado de verdade.
Um vento gelado a fustigou e a trouxe de volta de seus pensamentos. O frio, o vento Minuano e o breu lhe avisavam que deveria pensar menos e caminhar mais, porque em minutos, a escuridão tomaria conta do lugar. Batia queixo de frio e com as mãos trêmulas, abotoou o casaco de lã, melhor.
Ouviu o barulho de passos quebrando as folhas secas no meio do pinheiral e se assustou. Em estado de alerta, apressou-se ainda mais. Sem coragem de olhar para trás, percebeu que alguém a seguia e ela correu desesperada, segurando a barriga. Os passos acompanharam sua corrida. Em pânico, tropeçou num galho e caiu e antes que pudesse reagir, uma mão a levantou pelos cabelos e Lizandra apavorada, vislumbrou um homem branco com o rosto coberto por uma meia de nylon, que tapou sua respiração com um pano de cheiro forte. Ela apagou de imediato.
Quando voltou a consciência, estava deitada num papelão e seus olhos ainda sonolentos, percorreram o local, que era uma espécie de pavilhão.
Estava gelada e mal conseguia se mexer. Ouviu uma voz grave avisar:
___ A princesinha acordou, chefe.
Em segundos, um homem que usava a meia de nylon como máscara, saiu de dentro de um carro preto, que estava estacionado dentro do local abandonado.
___ Ok. Vamos dar um trato na moça. - disse se aproximando e a segurando pelo braço fez com que levantasse.
Atordoada, Lizandra começou a chorar.
___ O que querem? Eu não sou rica! Sequestraram a pessoa errada!
O estalo da bofetada que levou ecoou no pavilhão.
__ Cala a boca, vadia! Acha que somos amadores?
Indagou, se dirigindo ao outro homem.
__ A chefe não está atrasada? Se não aparecer vamos concluir o serviço sem ela.
O homem, também com o rosto coberto, avisou:
___O combinado foi dela estar aqui às 21 horas. Deve estar chegando.
__ Então, vamos esperar mais uns quinze minutos.
Lizandra implorou, limpando o sangue que escorria do canto da boca.
___ Por favor, não tenho nada! Sou uma vendedora. O que querem comigo?! Por favor, eu estou grávida!
O sujeito riu diabolicamente.
___ Eu e meu amigo, não queremos nada. Mas tem uma pessoa, a qual nos contratou que quer. - ele agarrou com firmeza seus cabelos e a jogou com força sobre o papelão. Lizandra caiu, o pavor fazendo seu corpo trepidar inteiro, sentindo um chute com força nos rins. Ela gemeu com a dor lancinante que se espalhou pelo seu baixo ventre e se encolheu para proteger sua barriga. Outros vários chutes, que sucederam o primeiro, foram desferidos em muitas partes do corpo e do rosto, mas o último e o mais forte, foi dado sem piedade na barriga. Lizandra quase perdendo a consciência, sentiu o sangue descer por suas pernas e em minutos, sujar boa parte do papelão. Estava perdendo sua bebê. As cólicas lhe retorciam o útero. Ela mordeu com força os lábios, gemendo, ouvindo o barulho de salto alto, ecoar no recinto. Uma mulher, alta, bem vestida se aproximou usando o mesmo tipo de cobertura na cabeça que os capangas usavam. Aquela voz ficou gravada na memória de Lizandra para sempre.
__ Enfim, conheci você, Lizandra!
Pra mim está sendo um prazer saber que essa criança vai morrer!
___ Por favor...- ela suplicou chorando, já sem forças. __ Porque estão fazendo isso comigo?!
___ Não se preocupe, não vou mandar te matar. A não ser que morra de hemorragia e de frio.- riu sarcástica e olhando para os dois homens ordenou:
__Batam um pouco mais e a deixem por um tempo aqui dentro. Ela precisa sangrar mais. Não quero que esta criança sobreviva. A noite está fria e escura. Simulem um atropelamento e a deixem na beira de uma estrada qualquer. Não vamos matá-la, a natureza se encarregará desse serviço.
A mulher abriu a bolsa e entregou um maço de dinheiro a um deles.
__ Aqui está a metade da grana. O restante do pagamento será feito com o serviço concluído.
___ Pode deixar, madame, faremos o nosso melhor!
__ Tomem cuidado para que ninguém os veja ou anote a placa do carro.
___ A senhora pode confiar. Somos profissionais!
___ É o que espero! - disse e saiu.
Duas horas mais tarde, depois de ter apanhado muito, Lizandra perdeu a consciência. Então, eles a arrastaram para dentro do carro e a levaram para uma estradinha asfaltada. Um deles, abriu uma garrafa de água gelada e jogou sobre sua cabeça para que acordasse, lhe arrastando em seguida, nos pedregulhos fininhos, ralando a pele dos joelhos. Lizandra já nem sentia dor. Chegou a pedir a Deus que eles acabassem logo o serviço e a matassem. O homem a segurou à beira do acostamento, enquanto o outro mascarado tomava distância com o carro para simular o atropelamento.
Lizandra, com os olhos embaçados, pelo sangue, viu o carro se aproximando em alta velocidade e sentiu seu corpo ser empurrado para o meio da estrada. Fechou os olhos para esperar a batida em seu corpo debilitado, mas uma buzina e uma luz forte surgiram vindo em direção contrária e então, os dois homens mascarados a abandonaram, caída no meio do asfalto e fugiram em alta velocidade.
A camionete parou quase em cima dela. Um casal desceu e Lizandra teve sua vida salva, mas sua bebê não teve a mesma sorte. Estava morta dentro de seu ventre.
O casal chamou uma ambulância e a polícia fez buscas pelos arredores, encontrando apenas o pavilhão abandonado.
Já no hospital, ela passou por vários procedimentos médicos, ficando internada numa UTI por cerca de duas semanas.
Rute foi avisada do que havia acontecido e Augusto lhe acompanhou até Pelotas. Lá ficou sabendo, que ela esperava um filho dele, mas que não havia sobrevivido a tamanha barbárie. Rute arrasada, se culpou por ter sido ela, a primeira a querer que Lizandra viesse para a fazenda, aceitando o emprego que Augusto oferecia. Sua filha havia pago um preço muito alto por ter se apaixonado pelo patrão.
Quando Lizandra saiu do leito da UTI e foi para o quarto, a polícia a interrogou para saber se ela se recordava de algum detalhe que pudesse chegar até aos marginais. Mas Lizandra negou, dizendo que a maioria do tempo, tinha ficado sem consciência. Omitiu a presença da mulher no pavilhão, como sendo a mandante, temendo o que ela poderia fazer novamente. Temeu por ela e por sua mãe, caso a dona da voz, resolvesse se vingar. Não sabia de quem se tratava, mas o fato é que a mulher mandou matar sua bebê. Em conversa com Rute, esta lhe aconselhou a não falar nada. Obviamente que eram muito perigosos e as duas temeram uma represália.
A dona da voz? Sim, Lizandra, descobriu alguns anos mais tarde, ser de Celeste e então soube, que a esposa de Augusto era extremamente perigosa!

Tive que fazer uma mudança na idade de Priscila, lá nos primeiros capítulos. A cronologia não fechava, mas agora tá ok.
Espero que gostem do bônus!
Quinta tem capítulo novo.
Beijos!

Para Sempre No Meu Coração🔞‼️Onde histórias criam vida. Descubra agora