(一个) A Flor de Cerejeiras

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— Vale do Lótus Branco.

— Atualmente.

A chuva forte, assim como a mescla do cheiro de terra molhada e folhas, atrapalhavam o que a moça via sobre um dos galhos mais altos da árvore. Até então ela tinha um arco rudimentar e uma flecha apontada diretamente para ele, o inocente coelho que, distraído, não sabia que estava prestes a ser predado.

Seus olhos estreitaram quando o som das chuvas sobre as árvores alternou seu ritmo. O focinho da criatura se movia, assim como as orelhas pontiagudas e atentas. Ela não podia se mover um centímetro, ou qualquer próxima tentativa seria em vão.

Ela olhou para trás, onde um de seus amigos mais fiéis, um lobo branco de olhos cinzentos, observava com cautela a sua astúcia e o quão diferente aquela humana era entre sua alcateia. Ele olhou de volta e balançou a cabeça, mas bastou que um movimento entre as folhas numa das árvores se movesse para que ela perdesse tudo; perdeu o equilíbrio, caindo sentada entre um galho e o tronco central.

O coelho, que já suspeitava de algo errado, saiu saltando pelo mato alto quando três outros lobos saíram a persegui-lo, e perdeu a concentração do que estava fazendo, pois tudo a partir dali foi como o início da perseguição de um lobo por sua presa.

O que foi aquele barulho? Quem estava entre as folhas?

Izanami só descobriria se conseguisse agarrar aquele vulto negro que pulava de um galho para o outro e atravessava a distância com tamanha e surpreendente habilidade que até mesmo ela se espantou.

Pulou um galho que ficava entre dois, ela viu quando ele balançou. Depois ele pisou no chão, isso pois os arbustos vibraram insistentemente, isso lhe deu a trilha, assim como também uma pegada enlameada de um calçado. Ela olhou para frente, sabia que usar seus sentidos mais primitivos era uma arma melhor do que o arco e flechas, mas sabia também que se o usasse, teria uma chance de saber quem ou o que estava lá.

E foi quando ergueu uma das flechas que preparou para a sua caçada matinal. Ela fechou os olhos e limpou a mente de tal forma que a chuva, as gotas que caiam se espatifando no chão barrento lhe eram perceptíveis, pluc pluc, cada galho esmagado, pluc pluc, cada respiração ofegante, pluc pluc, até que soltou a flecha.

Logo depois saiu correndo, bem quando um dos seus companheiros lobo se aproximou com um som que ela reconheceu como reforços a caminho. Ela grunhiu para que eles a seguissem por dentro da relva e do mato alto, por entre árvores, pelo frio, pela neblina e pela terra barrenta até ouvir outro som.

Era um grunhido, um gemido de súplica alguns metros dali e entre as folhas. Ela acenou para que os lobos fossem na frente e saiu pulando os galhos derrubados pela chuva através das encostas, até que o encontrou, assim como os lobos o encontraram e o encurralaram com latidos primitivos.

Ela apontou seu arco.

— Espera! — numa voz maculada pela dor da flecha de madeira cravada nas costas, dos lobos brigando por sua carne tão suculenta, o ser esquisito falava.

Quando Izanami havia ouvido uma voz? Apenas soube o que era porque tentou reproduzir o som com a sua própria.

Ela se embrenhou entre os lobos, acariciando-lhes a cabeça e as orelhas, não queria que o homem fosse machucado.

Talvez um shōnen, um pouco mais velho do que ela.

Izanami nunca havia visto um ser semelhante a ela; cabelos, rosto com pelos, alto, com o dom de falar. Ela nunca tinha visto nada parecido até então.

— Izanami — o homem se arrastou para trás com tremenda dor causada pela flecha. Ela se aproximou, mas ele recuou um pouco. — Izanami.

— Iz...? Inm? Inmi? — ela procurou por suas roupas esfarrapadas e puxou de suas costas uma pequena bolsa em couro marrom que trazia desde sempre.

O Ultimo Eremita do Trovão (Vencedor #TheWattys2021)Onde histórias criam vida. Descubra agora