Capítulo 37

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Júlia caminhava para seu quarto depois de fazer a rotineira ronda pela Alcott Manor.

Era seu costume ir até a cozinha conversar com Eve, a governanta, para acertar as refeições do dia seguinte, ou tomar ciência do que faltava, e até mesmo tratar de alguma pendência com qualquer funcionário, como um pagamento ou alguma outra necessidade.

Depois ela passava pelo gabinete do pai, que invariavelmente estava lá, protelando em ir deitar-se...e ela sabia bem o porquê, mas mesmo assim ia até ele e dava-lhe um carinhoso beijo de boa noite e dizia que já era tarde e ele precisava ir descansar.

Então subia e devagarinho abria a porta do quarto da avó, para verificar se ela precisava de algo.
Algumas vezes, a pegava cochilando com um livro aberto sobre o peito, que ela delicadamente retirava...
Passava pelo quarto de Amy, mas não costumava abrir a porta, pois ela detestava qualquer demonstração de afeto vindo de sua parte, mas mesmo assim, ela fazia o possível para cuidar de Amy sem que ela percebece.

Com Jamie era diferente!
Ele quase nunca estava em casa no horário em que ela costumava se recolher, mas quando estava, ele gostava de conversar com ela, de contar as novidades, de comentar sobre algum livro que estava lendo...

Júlia sentia que precisava cuidar da família, que ela tinha que aliviar o fardo da avó que havia cuidado deles com tanto carinho e por tanto tempo!
A avó estava idosa e cansada. Foram anos difíceis depois que a mãe se fora...
Agora era a vez da avó ser cuidada!

Seu quarto era seu santuário! Ela gostava de pensar assim.

Ali, ela podia ficar a vontade consigo mesma!
Seu livros, suas partituras de piano, as bonecas que ele lhe dera...e claro seu maior tesouro, e seu mais bem guardado segredo...
As cartas que escrevera para ele, mas que nunca enviara!
Eram muitas, muitas cartas...cartas de amor!
Cartas que diziam com todas as letras o que ia no mais profundo do seu coração por ele.

Ela não lembrava de um dia em sua vida em que não estivera junto a ele.
Ele estava presente nas suas mais antigas lembranças!
E sempre perto dela...
Lembrava com carinho todos os momentos que passaram juntos, desde quando ele a carregava no colo, como em algumas vezes em que ele cantara para ela dormir.

Quando todos brincavam de esconder, nos verões que passavam juntos, ele a puxava pela mão para que corresse mais rápido, e a escondia para que ela pudesse ganhar!
E quando sua vida parecia não ter mais sentido, com a morte da mãe, foi ele quem a encontrou, encolhida e chorando, escondida debaixo da mesa da biblioteca...
Ela queria apenas desistir de tudo, fechar os olhos e abraçar o desespero que a sufocava, mas foi o carinho e a atenção que ele lhe deu que fizeram toda diferença em seu ânimo!

Ela sabia que para ele, ela não passava de uma menina...uma menina que ele via como uma irmã.

Mas para ela, ele sempre fora o amor da sua vida, desde que ela deu-se conta de que o que sentia por ele era algo muito maior que amizade, ou amor fraternal!

Contava ela então quatorze anos, quando despertou para este sentimento.
Passavam naquele ano o verão em Greenleaf, todos eles!
Uma tarde, estavam reunidos na sala de música, enquanto ele tocava piano junto com Agnes, e Sophie e Louisa cantavam...Era uma bela ária!

Ela o observava fascinada!
Não conseguia deixar de olhar para ele; ele tocava alegremente e sorria...Um sorriso lindo!
E neste momento foi como se um raio a atingisse!
Ele parecia brilhar! Brilhar com uma luz dourada, que o envolvia...
Então, de repente, como se percebesse que ela o encarava, ele devolveu o olhar e fixou-o nela por uns breves instantes; foram breves instantes que para ela pareceram uma eternidade!
Uma eternidade em que ela esteve imersa em seus belos olhos!

Seu coração disparou!
Sentiu seu estômago apertar como se ela tivesse levado um susto! Suas pernas ficaram bambas e seu rosto ia incendiar...

Desde então ela sabia. Sabia que o amava!
E que sempre o amaria!
Mesmo entendendo que ele nunca olharia para ela da mesma maneira, ainda assim, o amaria...

Por este motivo ela escrevia...
Escrevia as cartas para poder externar estes sentimentos! Porque não podia contar para ninguém, e esses sentimentos eram por vezes tão intensos, que a ela parecia que a fariam sufocar.
Saudade...Ah...ela sentia muita saudade! 
Ele viajava muito, e quando retornava para casa, ela não podia demonstrar, como gostaria, o quanto sentira sua falta!

Faziam dois anos e meio que ela não o via, pois passara dois anos com os parentes da mãe na Itália, e ao retornar, ele estava viajando à negócios para a América!
Agora, porém, ela o veria com certeza, pois ele estaria de volta para o casamento de Sophie, que se realizaria em duas semanas.

Já começava a se angustiar por isso!
Vê-lo depois de tanto tempo...
Como estaria? Lindo com certeza! O que acharia dela? A mesma coisa de sempre...

Provavelmente ele em breve se casaria, porque receberia do pai o título, e passaria a ser o Duque de Greenleaf!
Teria que parar de viajar tanto pelos negócios da sociedade, e assumir todos os cuidados do ducado, que não eram poucos.

Com certeza os próprios pais o incentivariam, com mais afinco, a escolher uma esposa...Uma bela esposa, para ser sua companheira e mãe de seus filhos...

E seria então que ela daria adeus em definitivo a Londres...a Inglaterra...e com tristeza, a sua família.
Porque não suportaria vê-lo casado com outra!
Desejaria sempre a felicidade para ele...Mas quando ele casasse, seria demais para ela!

Preferiria viver longe, e tentar refazer sua vida em outro lugar.
Já pensara nisso muitas vezes...
Podia ensinar piano...ou canto.
Morar com seus tios na Itália, e ajudar na administração da casa, pois não queria ser um peso para sua família!

Ela tinha uma soma de dinheiro guardado...tinha suas jóias...poderia comprar uma pequena casa, se estabelecer...
Ela daria um jeito!
Somente não poderia viver próxima a ele depois que ele casasse, não mais!

Infelizmente o destino não quisera uni-los...

E brincara com seus sentimentos por todos esse anos.

Permitindo que ela sempre estivesse perto dele, mas ao mesmo tempo, o fazendo inatingível para ela!

Eram como o sol e a lua, que apesar de compartilharem o mesmo céu, jamais seriam vistos lado a lado, brilhando no firmamento!

Assim seria também com ela e John!

Sou seu destinoOnde histórias criam vida. Descubra agora