Hoseok

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Toda a disposição que eu tinha de levantar pela manhã já nem existia mais. Eu me arrastava pela casa e raramente tomava café da manhã antes de pegar o metrô para Gangnam. Pensar que em alguns minutos eu teria que fazer uma força descomunal fingindo que aquele vexame colossal nunca acontecera me dava até ânsia de vômito.

Era óbvio que Jiwoo perceberia. Ela se preocupava comigo assim como eu me preocupava com ela, e eu não estava nas minhas melhores condições. Minha irmã tentava, com todas suas forças, fazer algo que me alegrasse, mas nada parecia ter efeito.

No ambiente de trabalho eu estava sempre alternando entre dois humores: desiludido e hesitante. Naquele dia em especial, eu estava imensamente hesitante. Minhas mãos estavam trêmulas e o mais simples ruído me assustava.

Como eu estava evitando ao máximo manter qualquer diálogo com Yoongi, naqueles últimos dias eu já aquecia sua coqueteleira e a deixava ao lado de seu computador antes mesmo que ele entrasse em seu estúdio. Bati duas vezes na porta de seu quarto e fui embora para meu escritório, já que era assim que eu o acordava agora. Sem mais intromissões.

Enquanto eu contava os segundos para que o microondas aquecesse a refeição de Yoongi, meu celular vibrou dentro de meu bolso. Olhei no visor rapidamente e era Jiwoo. Hmm. Estranho. Ela não costumava me telefonar em seu horário de trabalho.

- Alô? Noona?

- Hoseok? Você está bem? Pode falar?

- Eu... sim, noona. Aconteceu algo com nossos pais? - Perguntei prontamente, já que esse era sempre o meu medo.

- Não, não! Fique tranquilo quanto a isso. Eu só queria lhe contar algo e achei que hoje fosse... o momento c-certo...

Ela falava de um jeito esquisito. Eu não sabia dizer se Jiwoo estava nervosa ou se estava com dor de barriga. O jeito que ela pronunciava as palavras tornava qualquer um dos dois possível.

- Sim? Continue? - Tudo que eu dizia se parecia com uma pergunta àquele ponto.

O microondas apitou três vezes, indicando que o almoço de Yoongi já estava devidamente aquecido. Apoiei meu celular em meu ombro, prendendo-o ali com minha orelha para que eu pudesse ter as duas mãos livres para tirar a coqueteleira escura do microondas.

- Bem, Hoseok. Já faz algum tempo que isso vem acontecendo e eu não tinha coragem de dizer isso pessoalmente a você. Eu e o Jimin estamos namorando.

Engoli em seco antes da minha primeira reação.

- Vocês O QUÊ? AI!

Minhas mãos calcularam mal o ponto exato da coqueteleira em que eu deveria segurar para que não me queimasse, e o pior aconteceu.

- Hoseok? Eu estava brincando! - Jiwoo ria do outro lado da linha - Hoje é 1º de abril! O que aconteceu? Você está bem?

- Eu ligo depois, Jiwoo. - Respondi antes de desligar o telefone para encarar o que seria, de fato, o maior choque do dia.

A pequena coqueteleira se partira ao meio. Talvez por ter sido derrubada enquanto ainda estava tão quente, nem o lacre foi capaz de segurar o seu conteúdo. A minha frente estava uma grande poça de um líquido vermelho escuro. Não era assim que eu esperava que um suplemento vitamínico seria.

Olhei por cima de meu ombro para checar se eu ainda estava sozinho ali e, em seguida, abaixei-me para ver melhor o que era aquilo. O fato de o líquido estar tão quente fez com que não fosse necessário chegar muito perto. O odor metálico já denunciava o que havia dentro daquela coqueteleira antes dela se quebrar. Sangue.

Meu estômago se embrulhou e pude ver mais de vinte cores a minha frente antes de me levantar rapidamente para vomitar na pia da cozinha. Como eu não havia comido nada ainda, não havia nem um farelo em meu organismo, então aquela foi uma experiência um tanto frustrante.

Mesmo lutando contra a minha náusea, fui forte o bastante para procurar, na lavanderia, vários panos de chão e um balde. Eu precisava me livrar daquilo tudo antes de Yoongi aparecer nessa parte do apartamento. Ele não poderia, em hipótese alguma, saber que eu já sabia no que ele estava metido. Quando as pessoas diziam que artistas ricos como ele estavam sempre envolvidos em algumas práticas ilícitas, eu imaginava drogas, e não isso!

As coisas já estavam ruins o bastante entre nós. Eu só esperava que ele levasse um certo tempo antes de perceber que havia um copo a menos em sua geladeira.

my typeOnde histórias criam vida. Descubra agora