V - Perseguição a alta velocidade

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O pé direito de John carregava no acelerador até esmagar o pedal, até atingir o fundo. Empurrava com tanta força que achava que iria abrir um buraco na base da carroçaria. Por mais que pressionasse, todavia, o carro parecia mover-se com lentidão, deslizando placidamente pelas ruas da cidade, num passeio agradável típico de um domingo primaveril. Ele rangia os dentes e calcava aquele pedal até ao fim do mecanismo, mas o maldito carro não queria decolar da estrada como o raio de um avião!

Ringo pediu-lhe histérico:

- Mais depressa! A polícia está a aproximar-se!

- Eu sei!

Olhou pela janela e os prédios pareciam que passavam devagar, cada vez mais lentos até se imobilizarem porque o carro parara, quando devia acontecer precisamente o contrário, os vários edifícios que ladeavam as ruas limpas e claras passarem depressa, mais rápidos, velozes, imparáveis até se tornarem em borrões indistintos. E aí sim, o carro tinha mesmo decolado da estrada e subiria no ar como o raio de um avião!

Era só impressão, claro, o medo de ser apanhado pela polícia com um bandido no carro, dois reféns e um saco de dinheiro roubado é que o fazia alucinar de que por mais que carregasse no acelerador o carro não andava mais depressa, como Ringo exigira. O que se passava era que estava a transportar mais peso e o velhinho Renault ferrugento demorava a reagir, o motor que pedia a reforma não estava habituado a tamanha exigência e tudo se petrificava numa grande aflição.

Devia estar a queimar combustível como um doido, mas nem quis pensar nisso. Ainda havia bastante gasolina no tanque, lembrava-se. Ou melhor, não tinha bem a certeza. Não quis certificar-se para não acrescentar mais problemas àquela situação complicada.

Voltou a cabeça para o lado direito e viu que Paul estava contraído e quieto, com a cara escondida nas mãos, os pés meio levantados para que não tocassem no chão onde estava o saco do dinheiro, os joelhos tremiam.

- Macca?...

O amigo reagiu. Puxou as pernas para o peito, de modo a assentar os pés no assento. Ficou parecido a um enorme gafanhoto encolhido. E gritou alucinado:

- Acabei de cometer um crime, Johnny!

Ele entreabriu os lábios, espantado com aquela declaração.

Estavam todos a cometer um crime. Que arrebate de consciência estranho seria aquele?

Paul explicou histérico:

- Estivemos a roubar um banco, em plena luz do dia, com a cara descoberta! Vamos ser apanhados! É só uma questão de tempo! As câmaras de vigilância vão mostrar as nossas caras que vão acabar escarrapachadas em tudo o que é noticiário de televisão, jornal e redes sociais. Não temos escapatória! A minha cara vai ser identificada como a do tipo que retirou o dinheiro da caixa.

- Isso é um grande problema.

Paul voltou-se para trás e olhou para o rapaz que fora feito refém durante o assalto e que tinha falado. Assumiu um ar menos desvairado e perguntou:

- E tu... quem és?

- George Harrison.

- É um prazer.

- Achas? Não estou a considerar nada agradável conhecermo-nos nestas circunstâncias.

- Chamo-me Paul McCartney e o meu amigo ao volante é o John Lennon – apresentou Paul. Completou desdenhoso: – E esse daí que não para de olhar para trás, a vigiar o aparecimento dos carros de polícia que nos vão prender, chama-se Ringo... Ringo qualquer coisa!

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