Depois da minha conversa com Carolina, eu não conseguia mais dormir ou pensar em outra coisa. Durante todo o tempo, desde que eu descobri a fibromialgia, eu me coloquei no lugar de vítima, e nunca quis admitir isso.
Pelo contrário, reclamar e chorar era mais fácil. A verdade é que estar com problemas é difícil, sair dos problemas, também é difícil, cabe a cada um escolher qual dificuldade deseja enfrentar.
O primeiro passo é entender que eu não sou única. Que existem outras pessoas que passam pelos mesmos problemas que eu e outras que passam por problemas piores que os meus. Quando passamos por alguma dificuldade, alguma intempérie, sofrimento, ou qualquer coisa que nos desagrade, nos colocamos na posição de vítima, e automaticamente nos propagamos a querer ser o centro das atenções. Sim, é como se sentíssemos a necessidade de sermos bajulados, e que alguém sempre nos diga: "Caramba! Imagino o quanto deve ser difícil". É quase que um elogio quando alguém diz alguma palavra de espanto por algo que você está passando. Uma forma de você se sentir especial, mesmo com um problema que de especial não tem nada.
Como um acessório que você compra e faz questão de enaltecê-lo para que alguém elogie e seu ego seja preenchido.
É óbvio que ninguém entende a sua dor e nunca vai entender. Mesmo eu tendo a mesma doença de Carolina, a fibromialgia nos atinge de uma forma diferente. Ela consegue lidar com a doença de uma forma completamente distinta da minha então, eu não poderia ajudá-la completamente assim como ela não seria capaz de me ajudar completamente. Porém, sempre podemos fazer a nossa parte. Os poucos minutos de conversa com Carolina, me ajudou a pensar a vida de um jeito diferente, me trouxe ideias, e me confortou de uma maneira esplêndida.
O segundo passo é, após entender que você não é o "centro das atenções" e que só é vítima se se permitir ser vítima, é hora de mudar o jogo. E era isso o que eu queria. Mudar o jogo. Não me colocar mais em posição de vítima. Eu tinha uma doença sem cura, mas que havia tratamento. Eu é quem deveria controlá-la.
Miguel foi uma peça chave em todo o meu processo para tratar a fibromilagia. Sem ele eu não teria me arriscado, me aventurado, superado meus limites, conhecer novos gostos, novos hobbies e quebrar as regras. Eu me sentia bem com tudo isso e, sempre que eu estava em tais atividades eu esquecia que tinha uma doença. Ter uma doença não significa ser doente.
Eu amava Miguel. Eu amo Miguel. Mas então eu comecei a entender que queria mais agradá-lo do que agradar a mim. Eu precisava fazer as coisas por mim. Ser bom impar para ser um bom par. Eu não sei ele estará me esperando, ou se largará tudo para voltar a viver um grande amor comigo, mas, eu sei o que eu estava disposta a fazer por mim.
Entrei no meu quarto ansiosa andando de um lado para o outro pensando por onde começar. Eu sabia que precisava me controlar, mas a ansiedade para mim era maior. Comecei a vasculhar algumas gavetas tentando procurar qualquer coisa, um caderno que fosse, então na última gaveta ao lado da minha cabeceira, ali estava, meu caderninho de lamentações que Miguel havia me dado para anotar minhas reclamações.
Peguei-o indo até minha cama para poder olhá-lo com calma. A cada reclamação, uma vontade de mudar aquela situação tomava conta de mim.
As vezes eu me pegava rindo por lembrar dos momentos em que tive com Miguel em cada reclamação como essa.
Mordi os lábios. Se eu queria tomar uma atitude, aquilo não deveria fazer mais parte de mim.
- Salete! - gritei a enfermeira no corredor.
Ela veio mais que de pressa toda preocupada por conta do meu grito.
- O que foi senhorita? Sente alguma coisa? Está tendo alguma crise? Quer que eu chame o médico.
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Ensaios de borboletas
ChickLitClarissa é uma mulher delicada, sensível e muito afetuosa. Apaixonada por música clássica, não é a toa o seu talento pelo violino. Uma mulher que gosta da tranquilidade e dispensa grandes aventuras. Com uma carreira brilhante, um noivo dedicado e um...